sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

O Déficit nos Bens da Indústria de Transformação (Carta Iedi)


O comércio internacional dos bens típicos da indústria de transformação registrou o expressivo déficit de US$ 48,7 bilhões em 2011. Conseguiu, assim, suplantar em 40,2% o já expressivo déficit presenciado em 2010 quando o saldo ficou negativo em US$ 34,8 bilhões. Acresça-se que os bens típicos da indústria de transformação participaram com menos de 60% da pauta. Desde 2005, a participação destes produtos tem sido cada vez menor atestando a commoditização da pauta exportadora brasileira.
O déficit comercial dos bens típicos da indústria de transformação por si só não é ruim. Mas, a persistir o descompasso entre vendas do varejo e produção física interna da indústria, como aconteceu em boa parte de 2011, o quadro é distinto. Os obstáculos relativos a tanto são bem sabidos. Há capacidade ociosa na indústria asiática, concorrendo para agressivos preços baixos. A taxa de câmbio continua como óbice às vendas externas do Brasil, assim como os conhecidos problemas de infraestrutura, complexo sistema tributário, cara intermediação financeira e a carência de recursos humanos qualificados e mesmo de serviços especializados.
A ironia é que a favor do Brasil está sua baixa exposição a desastres naturais, diferentemente do que tem ocorrido recentemente, a exemplo do Japão com a tsunami e da Tailândia, cujas enchentes comprometeram a produção de discos rígidos usados em computadores, notebooks etc. Tais fenômenos têm levado as transnacionais a reverem suas estratégias de cadeias produtivas enxutas. As corporações querem mais opções para não ficar refém de fornecedores e serviços. Logo, é um momento propício para a inserção brasileira. A questão é suplantar os obstáculos expostos acima e aproveitar a janela de oportunidades, que pode não se abrir desta forma futuramente.
Atendo-se ao intercâmbio de bens da indústria de transformação e enfocando a classificação por intensidade tecnológica, segundo o critério da OCDE, há informações úteis a serem consideradas:
  • Os bens produzidos por atividades de alta intensidade tecnológica observaram déficit sem igual para o período do ano em questão, de US$ 30,0 bilhões. Em 2010, o saldo negativo fora já muito expressivo, de US$ 26,2 bilhões. Em paralelo, as exportações cresceram muito discretamente, atingindo US$ 9,6 bilhões. Somente os equipamentos de transporte aéreo lograram superávit, de US$ 179 milhões. Pouco para fazer frente aos déficits característicos do conjunto de bens eletrônicos e dos produtos farmacêuticos.
  • Na faixa dos bens de média-alta tecnologia, o déficit ultrapassou a casa dos US$ 50 bilhões, chegando a US$ 52,4 bilhões. Tanto as vendas externas de bens da indústria automobilística, quanto as de equipamentos elétricos e equipamentos mecânicos e outros cresceram, apesar da deterioração nos saldos. Até as exportações de produtos químicos aumentaram. Ocorre quas as importações evoluíram em muito maior escala. Mencione-se que o déficit em automóveis chegou a US$ 7,4 bilhões e o de produtos químicos a US$ 22,4 bilhões.
  • Já o segmento de média-baixa intensidade tecnológica, ficou deficitário em US$ 9,3 bilhões em 2011. Foi a segunda vez e consecutiva que os bens típicos deste conjunto de atividades registrou déficit. Sua magnitude inclusive ultrapassou a de 2010. O fato é que o saldo dos produtos metálicos – superávit de US$ 8,7 bilhões acompanhado de exportação recorde – não foi o suficiente para se contrapor ao déficit de produtos de petróleo refinado e afins, déficit de US$ 15,9 bilhões. E desta vez mesmo os produtos de minerais não-metálicos experimentaram saldo negativo. Os produtos plásticos e de borracha também registraram déficit. Já o intercâmbio de embarcações, navios etc. obteve superávit, mas de apenas US$ 850 milhões.
  • A faixa de baixa intensidade tecnológica em mais uma oportunidade mitigou os efeitos dos déficits das demais faixas. O superávit sem igual na série, de US$ 42,9 bilhões foi puxado por exportações de US$ 61,4 bilhões. Os bens das indústrias de alimento, bebidas e fumo foram decisivos, com superávit de US$ 38,8 bilhões e exportações de US$ 46,1 bilhões. Os produtos madeireiros e de papel e celulose também contribuiu positivamente. Por outro lado, o conjunto das indústrias têxtil, de vestuário, couro e calçados experimentou seu segundo e seguido déficit, de US$ 1,5 bilhão, na série iniciada em 1989.
Com o cenário internacional desfavorável por conta dos desdobramentos da crise internacional, as poucas oportunidades que surgem devem ser buscadas com afinco. O fato da estratégia de cadeias enxutas estar em xeque é uma delas, o que casa com o intento do governo federal em atrair fornecedores de componentes eletrônicos, um dos focos do déficit comercial, bem como de buscar defender e fomentar segmentos intensivos em recursos humanos, como a indústria têxtil, do vestuário e calçadista. A adição de valor também deve continuar a ser perseguida, menos sob o prisma de nacionalizar pura e simplesmente e mais na perspectiva de que elos produtivos podem ser difusores de um “aprender a fazer” essencial para ganhos de produtividade.

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