quinta-feira, 1 de novembro de 2012

O Brasil e suas possibilidades


*José Álvaro de Lima Cardoso
     A política macroeconômica do país tem apresentado uma série de avanços importantes nos últimos anos:
a) milhões de pessoas saíram da miséria;
b) o Governo Federal vem implementando um plano para tentar enfrentar o processo de desindustrialização (Plano Brasil Maior);
c) o Governo Federal vem colocando em prática uma série de ações para erradicar a miséria no país (Plano Brasil sem Miséria);
d) foram elevadas substancialmente as transferências governamentais para os pobres (especialmente através do Bolsa Família);
e) o governo lançou um programa para combater o déficit habitacional no país, o Minha Casa Minha Vida, que desde o seu lançamento já contratou 1,8 milhão de casas e apartamentos, tendo construído já quase um milhão de moradias, até julho último;
f) a taxa de juros real atingiu um dos menores (senão o menor) patamares da história, 2%.
     Todas essas ações e processos são muito relevantes e, em alguns casos, são históricos. A questão a ser analisada, no entanto, é: podemos continuar avançando sem romper efetivamente com as políticas macroeconômicas adotadas até então, especialmente o chamado tripé de política econômica[1]. É verdade que, nos últimos tempos, houve mudança real no tripé, ou seja, foi um pouco modificada a ênfase de cada política. É bastante provável, por exemplo, que neste ano a equipe econômica lance mão do instrumento legal que lhe permite descontar os investimentos feitos pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do conjunto das despesas realizadas, para atingir a meta de superávit primário, mecanismo já utilizado em 2010. Com isso diminuiu o arrocho fiscal necessário para obter a meta cheia de superávit prevista para este ano de 3,1% do PIB.
    A política de câmbio flutuante também vem sofrendo mudanças há alguns anos. Dentro dos marcos de um sistema de livre flutuação cambial, o governo vem forçando para evitar uma maior valorização do real. Recentemente, por exemplo, adotou um piso implícito para a taxa de câmbio e o dólar vem se mantendo na faixa de R$ 2,00, sinalizada como patamar mínimo, à custa das insistentes intervenções do Banco Central do Brasil (BCB), que vem comprando a moeda mesmo quando o fluxo está negativo. Quanto à meta de inflação, da mesma forma, o atual governo parece não estar fazendo disso uma obsessão, como ocorria na Gestão Meirelles. O Banco Central na Gestão Dilma, parece estar mais preocupado com a retomada do crescimento e não com a consecução do centro da meta a qualquer custo.
     Todas essas mudanças, do ponto de vista do desenvolvimento, parecem ser positivas. Especialmente porque, apesar de não descuidar da inflação, desloca a ênfase da política econômica para a retomada do crescimento. No entanto, é possível que, no cenário conjuntural mundial previsto para os próximos anos, se façam necessárias algumas medidas mais ousadas, para enfrentar alguns problemas estruturais do Brasil. Exemplo recente de coragem foi demonstrado no processo de redução da taxa de juros, que vem contrariando diretamente interesses muito poderosos do capital financeiro no país.
     Devemos atravessar nas próximas décadas um longo período de transição com o declínio dos Estados Unidos e Europa e ascensão da China e dos demais emergentes. Tanto os EUA como a Europa terão que concentrar suas energias para recuperar suas economias, num contexto de crescente oposição e polarização política doméstica, abrindo espaço para a emergência de novos Estados nacionais como atores políticos. Uma transição com essas características abre oportunidades históricas para projetos mais independentes de desenvolvimento econômico. Nesse período a autonomia com que países podem perseguir objetivos nacionais de política econômica tende a mudar substancialmente. Neste sentido, a grande crise mundial pode ser uma oportunidade ímpar para o Brasil encaminhar um projeto nacional de desenvolvimento, que combine crescimento com distribuição da riqueza.
*Economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.



[1] A partir do segundo mandato do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e até hoje, a gestão macroeconômica está apoiada na tríade constituída pelo câmbio flutuante (sujo, ou seja, com intervenções do Banco Central para conter variações exacerbadas da taxa Real-Dólar, dentro de “bandas” de valor não divulgados), as metas de superávit fiscal primário (recursos do Orçamento da União reservados ao pagamento da dívida pública) e o regime de metas de inflação.  

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