quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Cresce saldo comercial com Venezuela


Por Sergio Leo
A Venezuela de Hugo Chávez tornou-se, em 2012, o país responsável pelo terceiro maior saldo comercial do Brasil com seus parceiros no mundo, só atrás da Holanda e da China. A Holanda, como se sabe, é porto de entrada de mercadorias para a Europa. Se descontado, do superávit desse país, o resultado do comércio do Brasil com outros países da União Europeia, os venezuelanos ficaram atrás só da China na lista de saldos positivos do comércio brasileiro com o exterior. Os especialistas se dividem ao analisar os efeitos da crise política no país sobre as crescentes relações comerciais entre o Brasil e o vizinho caribenho.
A lista de principais produtos de exportação do Brasil à Venezuela deixa clara a importância das relações entre os governos na aproximação comercial: dos pouco mais de US$ 5 bilhões de vendas brasileiras ao mercado venezuelano, quase US$ 1,1 bilhão foi em bovinos vivos, para corte ou reprodução, carnes desossadas de bovino e carne de frango. Açúcar, bebidas e outros alimentos também estão entre os primeiros itens do comércio bilateral, e, assim como as carnes, são comprados majoritariamente pelo governo e distribuídos a preços subsidiados em armazéns estatais.
Os exportadores de carne, principal produto de exportação do Brasil ao vizinho, estão otimistas, mesmo com as incertezas provocadas pela doença de Chávez, que o impediu de tomar posse normalmente na semana passada e alimenta dúvidas sobre o futuro político do país. “Nossas vendas cresceram 19% no ano passado e a expectativa é de continuidade no crescimento”, disse ao Valor o presidente da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), Antônio Camardelli. Com a recente autorização do governo para importações pelo setor privado, deve aumentar a demanda pelo produto, acredita.
O resultado nas vendas de carnes à Venezuela poderia ser ainda maior se o setor privado não tivesse conseguido do governo, no primeiro semestre, uma redução nas importações de carne de frango, sob alegação de que os produtores nacionais seriam suficientes para abastecer o mercado. O anúncio oficioso da interrupção das importações, em junho, levou os exportadores brasileiros e o Itamaraty a pedirem informações ao governo Chávez, que chegou a assegurar a manutenção das compras estatais. Mas, ao fim do ano, as vendas brasileiras haviam caído 42% em relação a 2011. As perspectivas para 2013 são melhores, porém.
Com o controle de preços de alimentos, em um período de alta de custos, e falhas logísticas na distribuição estatal, o país mergulhou em uma crise de desabastecimento, e o ministro de Alimentação da Venezuela, Carlos Osorio, em dezembro, anunciou que o governo local retomará a importação de carne de frango, que tem o Brasil como principal fornecedor.
O aumento das vendas à Venezuela se deu também em manufaturados. Só as exportações de máquinas de papel, para projetos de industrialização promovidos por Chávez, aumentou 840%, para acima de US$ 143 milhões, quase 3% do total das importações venezuelanas provenientes do Brasil. A grande diversificação da pauta exportadora ao país vizinho, ainda que fortemente dependente do governo, leva o presidente da Câmara de Comércio Venezuela-Brasil (Camven), José Francisco Marcondes, a prever uma tendência crescente para o comércio bilateral. “Nossa projeção, já a partir 2011 era de que o fluxo de comércio dobrará até 2014, e essa perspectiva continua”, afirmou ao Valor. A previsão implica em uma corrente de comércio acima de US$ 9 bilhoes até o ano que vem.
“Sem trocadilho, o relacionamento comercial entre os dois países já é maduro, e a entrada da Venezuela no Mercosul deve aumentar as oportunidades para as empresas”, comentou o executivo, brincando com o nome do vice-presidente venezuelano, Nicolás Maduro. A forte presença de empresas brasileiras com obras ou serviços de consultoria na Venezuela – como a Odebrecht, que constrói a linha 5 do metrô da capital, Caracas – é outro fator de demanda por mercadorias brasileiras, diz Marcondes.
Ele aponta, porém, um incômodo na relação bilateral: o baixo patamar de compras de produtos venezuelanos pelo Brasil, hoje, em torno de US$ 1 bilhão, com uma queda pouco acima de 20% registrada em 2012. São, majoritariamente, produtos básicos, como petróleo e derivados (entre eles ureia, um fertilizante) e minerais em bruto ou semimanufaturados. A Câmara de Comércio identifica oportunidades para os venezuelanos, de abastecer os mercados de Norte e Nordeste, para onde há maior facilidade de transporte. A venda de energia elétrica, por meio de linhas de transmissão que ligam os dois países, é o terceiro maior item na pauta de exportações venezuelanas ao Brasil.
A concentração das compras venezuelanas de produtos brasileiros nas mãos do governo, de estatais ou de empresas ligadas ao governo é um risco para o Brasil, especialmente em caso de transição política, na opinião do diretor-executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Ele crê que poderia haver uma substituição do Brasil por concorrentes poderosos como a China, no caso de um esforço maior para o controle da inflação ou alteração na estrutura de poder do chavismo, hoje favorito para o governo da Venezuela mesmo em caso de morte de Chávez. O fato de a Venezuela ter ingressado no Mercosul, estreitando os laços econômicos com o Brasil, e a melhor qualidade e preço dos produtos brasileiros impede, porém, qualquer mudança brusca nos fluxos de comércio, disse Castro. “Em curto prazo, num primeiro momento, não vejo mudanças.”
Publicado por Valor Econômico, em 14/01/13

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