terça-feira, 9 de abril de 2013

Alemanha ensina a agregar valor ao café


Autor(es): Por Assis Moreira | De Genebra
Valor Econômico - 09/04/2013
 

A Alemanha importa cada vez mais café verde do Brasil e do Vietnã para sustentar sua posição de grande torrefador e maior país reexportador do produto do mundo, com ganhos de centenas de milhões de dólares nessas transações.
Empresas alemães têm obtido 74% a mais do que pagam pelas importações, em média, com o valor que agregam ao café (processamento, torrefação, distribuição, marketing), de acordo com estimativa da Organização Internacional do Café (OIC).
O café que movimenta a industria do segmento na Alemanha vem sobretudo dos dois maiores produtores globais: Brasil e Vietnã. O café brasileiro representou 34% do total importado pela Alemanha em 2011, e continua em alta. Basta ver que as importações de café originário do Brasil representaram 12,9% do total entre 1990 e 1999, percentual que subiu para 27,6% entre 2000 e 2011, na média.
Nesse período, o Vietnã se consolidou como segundo maior fornecedor de café para a Alemanha, pulando de 3,7% (média anual de 1990 a 1999) para 18% do total importado pelo país europeu em 2011, enquanto a fatia da Colômbia recuou de 25,1% (média anual de 1990 a 1999) para 2%. Conforme a Associação Alemã de Café, "a oferta da Colômbia não atende à demanda alemã tão bem quanto a de outros países".
No total, a Alemanha importou 17,7 milhões de sacas de 60 quilos de café por ano, em média, entre 2000 e 2011 - em 2012, comprou 21, 8 milhões de sacas.
Essas compras alimentaram um volume anual médio de reexportações de 8,6 milhões de sacas, destinadas a 150 países e responsáveis por uma receita de US$ 1,8 bilhão. A Alemanha tem 28% desse nicho de mercado. Responde por 46,2% das reexportações globais de café verde, 21,9% de café torrado e 18,8% de café solúvel.
Para a OIC, a venda alemã, inclusive de café verde, confirma a importância das redes de transportes do país, já que tornam viáveis as compras do produto de países exportadores e as exportações para outros destinos.
O restante importado representa o consumo anual alemão, de 9 milhões de sacas de café. Esse volume se transforma em 453.782 toneladas de café torrado, gerando renda próxima de US$ 4 bilhões - levando-se em conta o valor agregado bruto obtido no atacado, de acordo com o economista-chefe da OIC, Denis Seudieu.
Assim, com US$ 2,5 bilhões em importações por ano, a Alemanha faturou US$ 5,8 bilhões, ou seja, mais do dobro por meio de reexportação e de vendas pelos torrefadores para o varejo alemão. Em comparação, o Brasil obteve receita cambial de US$ 6,3 bilhões no ano passado com as exportações de 28,2 milhões de sacas, que em parte tomaram o rumo do mercado alemão.
Na Alemanha, um dos maiores ganhadores no negócio do café é a rede de supermercados Aldi, com 9,8 mil pontos de venda no mundo e que na Europa compete com a Tesco e com o Carrefour.
Outros ganhadores são o grupo torrefador Alois Dallmayr Kaffee, no qual a Nestlé tem participação de 25%; a Mondelez International, que se separou da Kraft Foods, passou a operar como companhia independente e pagou US$ 28,8 milhões à sua presidente Irene Rosenfeld, um aumento de 40% em relação a 2011, o grupo J.J.Darboven, que oferece uma seleção de 50 misturas de café; e o grupo Tchibo, que começou no ramo do café, expandiu-se para o varejo e faturou € 3,5 bilhões no ano passado.
Em fevereiro de 2011, o conselho diretor da OIC examinou um estudo de seus economistas sobre a cadeia de valor do café em nove países - Alemanha, Espanha, Estados Unidos, França, Itália, Japão, Holanda, Reino Unido e Suécia -, que representam 70% do consumo de todos os importadores.
O estudo concluiu que esses países ganharam US$ 28,8 bilhões com o valor agregado para um consumo de 56,3 milhões de sacas de café em 2009. O ganho deles é muito maior do que as receitas de exportação de todos os países produtores no mesmo período, estimadas em US$ 13,3 bilhões.
O valor agregado baixa para US$ 22,4 bilhões com a aplicação de um índice deflator das Nações Unidas, mas ainda assim esse montante representa 68,4% mais do que a receita total dos exportadores do café verde. O valor agregado no café chega a 86% no Japão e na Holanda e a 67% nos Estados Unidos, de acordo com os dados da OIC.
Essa situação espelha parcialmente a política comercial de países industrializados, que impõem tarifas de importação elevadas para o produto com valor agregado mas baixam ou zeram a alíquota incidente sobre a matéria-prima. Um dos itens da negociação da Rodada Doha, que está bloqueada na Organização Mundial do Comércio (OMC), era a tentativa de países em desenvolvimento de desmantelar a chamada "escalada tarifária" imposta por mercados desenvolvidos.

Suíça exporta mais café torrado do que chocolate ou queijo

A paisagem da Suíça é famosa por suas montanhas cobertas de neve a maior parte do ano. Desnecessário dizer que aqui não dá para plantar um só pé de café. No entanto, o país está se tornando um dos maiores exportadores de café do mundo, com mais de US$ 1,7 bilhão em vendas entre janeiro e novembro de 2011. Para efeito de comparação, o Brasil exportou US$ 8,7 bilhões no ano passado, principalmente de café verde.
O ganho da Suíça com o produto é bem maior do que com as exportações de chocolate e queijo, dois de suas produções mais famosas mundialmente.
Os suíços exportam café até para o Brasil, maior produtor e exportador do mundo, e precisamente o seu principal fornecedor do grão verde.
O que a Suíça está fazendo é o que países como a Alemanha praticam há muito tempo, e ilustra uma das situações mais distorcivas do comércio mundial: importa a matéria-prima do Brasil, Colômbia e Vietnã, principalmente, agrega valor e reexporta ganhando várias vezes mais.
  
Para isso, os europeus, de maneira geral, não taxam a importação do grão, mas elevam a tarifa para a entrada do produto torrado, a fim de barrar a importação. É a chamada ‘escalada tarifária’, no jargão do comércio internacional.
A Suíça vai importar cada vez mais o café, transformá-lo em suas indústrias e reexportar. Isso em razão do sucesso internacional do Nespresso, o café em cápsula da Nestlé, hoje um dos principais produtos da companhia.
Produzido unicamente na Suíça, em duas fábricas, o Nespresso faturou mais de US$ 3 bilhões em 2010, e as vendas aumentam 20% em média por ano, graças à variedade de sabor e a um marketing pesado.
O maior grupo agroalimentar mundial não revela quanto importa de café. As estatísticas do governo suíço tampouco detalham o que é exportado como torrado ou em cápsulas do Nespresso.
Franz Schmit, da Associação para Promoção do Café (Procafé), com 100 membros, dá uma indicação: a Suíça reexporta um terço do café que importa. A aduana suíça confirma que entre janeiro e novembro, o país importou o equivalente a US$ 806 milhões e reexportou um terço por mais do que o dobro: cerca de US$ 1,7 bilhão.
A aduana suíça registra a cada mês aumento de exportação de café. Em novembro, a alta foi de 18% em relação ao mês anterior, enquanto as vendas de chocolate aumentaram 15% (60% da produção do país é exportada).
Não está claro se foi apenas o café torrado suíço ou também as cápsulas da Nestlé que tomaram o rumo de volta ao Brasil. Certo mesmo é que os brasileiros importaram mais de US$ 27 milhões do produto "made in Switzerland".
Ou seja, o país do café gasta mais na importação do produto melhorado na Suíça do que com as delícias de queijos Gruyere ou Emmental ou com os melhores chocolates do mundo. É verdade que a Suíça também não produz cacau e no entanto produz chocolate. Mas, nesse caso, pelo menos contribui com leite produzido no país.
O gosto dos suíços pelo café é ilustrado de diversas maneiras. É o segundo maior consumidor na Europa, com 9 quilos per capita anualmente, mais do que os 6 quilos consumidos pelos italianos e só perdendo para os 12 quilos bebidos pelos finlandeses.
Além disso, Genebra é o centro da comercialização de commodities. As estimativas são de que até 70% do comércio internacional de café é negociado pelas tradings sediadas na cidade suíça.
Estima-se que no total o setor do café na Suíça movimente anualmente quase US$ 5 bilhões, incluindo também a fabricação de máquinas modernas para o ‘expresso’ italiano.

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