quarta-feira, 26 de junho de 2013
DIRETOR DO FMI ANALISA A ONDA DE PROTESTOS E DIZ QUE DINHEIRO DOMINA A MÍDIA E A POLÍTICA
Paulo Nogueira Batista Jr.
Por Cassiano Viana e Octávio Costa, do “Brasil Econômico”
Diretor-executivo do Brasil e de
mais dez países no FMI, Paulo Nogueira Batista Jr. tem uma visão privilegiada
da cena mundial.
Diretor-executivo do Brasil e de
mais dez países no Fundo Monetário Internacional (FMI), o economista Paulo Nogueira Batista Jr. vive em
Washington desde 2007 e, de seu posto, tem uma visão privilegiada da cena
mundial.
Na semana passada, ao desembarcar no
país, mostrou-se surpreso com a dimensão da onda de protestos. Em entrevista
ao “Brasil Econômico”,
além de destacar o poder de mobilização das redes sociais, atribuiu a
insatisfação dos jovens a uma combinação de fatores, como o desencanto com a
política, as deficiências crônicas no transporte urbano, na educação e na
saúde, e o momento desfavorável pelo qual passa a economia.
Quanto ao último ponto, é otimista. "Se o PIB crescer 3%, o mercado de
trabalho se mantiver forte e o governo conseguir estabilizar a inflação, creio
que o quadro de ânimo em relação à economia vai melhorar gradualmente".
O que mais o preocupa é a extrema
volatilidade dos mercados financeiros.
A especulação, adverte ele, está
desenfreada e os países podem sofrer com a livre movimentação de capitais.
"É preciso cautela. O mundo continua
à mercê da turma da bufunfa, que tem poder de fogo extraordinário".
A
pergunta é inevitável: como o senhor avalia a onda recente de protestos no
Brasil?
A escala das manifestações foi surpreendente e agora começa uma temporada de busca de justificações, explicações. Provavelmente, isso é uma combinação de fatores, alguns conjunturais - como o desempenho menos favorável da economia, o crescimento baixo, a inflação alta - e outros mais estruturais - como problemas sociais ainda não resolvidos no Brasil, deficiências crônicas no sistema de transporte público (nas grandes cidades principalmente), as deficiências na saúde e na educação. Essas coisas foram se combinando e avolumando.
A escala das manifestações foi surpreendente e agora começa uma temporada de busca de justificações, explicações. Provavelmente, isso é uma combinação de fatores, alguns conjunturais - como o desempenho menos favorável da economia, o crescimento baixo, a inflação alta - e outros mais estruturais - como problemas sociais ainda não resolvidos no Brasil, deficiências crônicas no sistema de transporte público (nas grandes cidades principalmente), as deficiências na saúde e na educação. Essas coisas foram se combinando e avolumando.
A
Internet também ajuda na mobilização, não?
Sem dúvida. Temos um fenômeno
tecnológico e de comunicação que é a capacidade de mobilização das redes
sociais que já se fez sentir em outras situações, em outros países, como na “Primavera
Árabe”, mas também recentemente na Turquia, nos Estados Unidos, com o movimento
“Occupy Wall Street” e antes disso em Seattle, na famosa “Batalha de Seattle”,
contra a OMC (Organização Mundial do
Comércio). Esse movimento tem revelado capacidade convocatória das redes
sociais gigantesca, que é muito maior do que se poderia pensar há cinco, dez
anos atrás.
Há outra explicação para a adesão tão rápida e surpreendente dos jovens?
Há outra explicação para a adesão tão rápida e surpreendente dos jovens?
Além desses fatores, no campo
político, não podemos perder de vista, no meu entender, um desencanto cada vez
mais profundo com a política e com a democracia, que está meio perdida hoje no
mundo. Os jovens, a população em geral, não se sentem representados pelas
classes políticas. Essa é uma realidade que tem a ver com várias coisas, dentre
elas, a percepção, que em grande parte é justa, de que o dinheiro dominou a
política. Mesmo nos países que têm tradição democrática, como os Estados Unidos
e os países europeus, a colonização da política pelo dinheiro se tornou um
fenômeno que deformou a democracia e que leva a população e os jovens a
entender que devem buscar canais de ação direta, como essas manifestações que
estamos vendo hoje e que se expressam como a rejeição de todos partidos
políticos e da mídia tradicional.
A
que o senhor atribui este comportamento?
Tanto a mídia quanto a política estão dominadas pelo dinheiro de maneira avassaladora. A percepção de que a conjuntura atual tende a transformar democracias em plutocracias gera um movimento de rejeição, pois as pessoas já não se sentem representadas nem pela política, nem pelos partidos e nem pela mídia. Então, buscam a expressão nas redes sociais, onde a população sente que tem mais voz e na rua.
Os protestos aumentam o Risco-Brasil e a desconfiança internacional no país?
Tanto a mídia quanto a política estão dominadas pelo dinheiro de maneira avassaladora. A percepção de que a conjuntura atual tende a transformar democracias em plutocracias gera um movimento de rejeição, pois as pessoas já não se sentem representadas nem pela política, nem pelos partidos e nem pela mídia. Então, buscam a expressão nas redes sociais, onde a população sente que tem mais voz e na rua.
Os protestos aumentam o Risco-Brasil e a desconfiança internacional no país?
Essa notícia (dos protestos) se
junta às notícias que já vinham tendo destaque na imprensa internacional, de
uma desaceleração da economia brasileira. A visão economicista mais simples é
fazer uma ligação direta entre as manifestações e o desempenho econômico, que é
uma parte da verdade. Por outro lado, dependendo da reação das autoridades
brasileiras, isso pode mostrar um ponto forte da democracia brasileira. Que é
mostrar que os brasileiros têm o direito de se manifestar. Temos que evitar a
armadilha em que caiu, por exemplo, o governo turco, que é a de ser percebido
como intolerante, autoritário e fechado ao diálogo. Cabe ao governo brasileiro
demonstrar sua capacidade de diálogo.
O senhor diria que é o que está acontecendo agora?
O senhor diria que é o que está acontecendo agora?
Acho que o governo já está
caminhando nessa direção. Mas essa é uma pergunta difícil. Ainda é cedo para dizer
qual vai ser o desdobramento desse processo e disso vai depender a repercussão
internacional para o país e para a economia brasileira.
Até
que ponto a situação atual da economia brasileira contribuiu para acirrar os
ânimos?
A conjuntura dos últimos dois, três
anos, contribuiu para gerar mais insatisfação, porque não é só o desempenho
mais fraco, o crescimento muito baixo, a inflação mais alta do que a esperada.
É um desempenho que frustra as expectativas, porque nós vínhamos de uma fase de
crescimento forte, até 2011, onde o Brasil era considerado um pólo dinâmico da
economia mundial, uma economia bem-sucedida, e essa reversão da conjuntura,que
foi bastante inesperada, acabou alimentando também essa insatisfação que se
traduz de várias maneiras, dentre outras, nessas manifestações.
Agora, há uma ressalva a se fazer,
que é conhecida, mas que convém sublinhar: é
que essa deterioração da economia brasileira não atingiu o mercado de trabalho
ainda. Temos hoje altas taxas de geração de emprego, inclusive do emprego
formal, e acima do que poderíamos esperar. O Brasil tem hoje taxas de
desemprego próximas do que poderíamos considerar pleno emprego. Apesar da
inflação recente crescendo em termos reais nos últimos anos, essa combinação de
emprego forte e salário real evoluindo ainda mantém a popularidade alta do
governo. Esse apoio ao governo, pelo menos nas camadas de renda mais baixa, é
bastante visível. Ao mesmo tempo, essa grande insatisfação da classe média é um
quadro preocupante. Não adianta tapar o sol com a peneira.
O senhor acha que o caminho de aumento da taxa de juros pode levar a economia de volta ao eixo?
As indicações e a maior parte das projeções ainda apontam para uma recuperação da economia, embora as projeções tenham sido revistas para baixo. Ainda se espera que a economia cresça em torno de 3% neste ano, um pouco menos talvez. E se esse quadro se confirmar, com a economia voltando a crescer um pouco mais e com os investimentos mais fortes, como foi no primeiro trimestre, e o mercado de trabalho se mantiver forte, como esteve nesses últimos anos, e o governo conseguir estabilizar a inflação, eu creio que o quadro de ânimo em relação à economia vai melhorar gradualmente.
O senhor acha que o caminho de aumento da taxa de juros pode levar a economia de volta ao eixo?
As indicações e a maior parte das projeções ainda apontam para uma recuperação da economia, embora as projeções tenham sido revistas para baixo. Ainda se espera que a economia cresça em torno de 3% neste ano, um pouco menos talvez. E se esse quadro se confirmar, com a economia voltando a crescer um pouco mais e com os investimentos mais fortes, como foi no primeiro trimestre, e o mercado de trabalho se mantiver forte, como esteve nesses últimos anos, e o governo conseguir estabilizar a inflação, eu creio que o quadro de ânimo em relação à economia vai melhorar gradualmente.
A
política adotada até agora pelo governo pode ter êxito? Não haveria necessidade
de cortes de gastos públicos e ajuste fiscal forte? Essa seria uma alternativa?
A situação fiscal brasileira não é
assim muito preocupante. Ela sofreu certa deterioração até como reflexo do
próprio enfraquecimento do crescimento, mas a trajetória da dívida como
proporção do PIB continua declinante. A redução da taxa de juros ao longo dos
últimos anos reduziu substancialmente o custo da dívida pública. O déficit
brasileiro nominal não é alto para os padrões internacionais. O superávit
primário caiu, mas continua positivo. Então, não vejo a situação fiscal do país
como alarmante. Você sugerir um forte reajuste fiscal com a economia
enfraquecida, já submetida a dificuldades, parece discutível, para dizer o
mínimo. De qualquer maneira, essa é uma recomendação de laboratório porque,
mesmo as pessoas que fazem essas recomendações, sabem que em ambiente de ciclo
político eleitoral é muito difícil que o governo faça um reajuste fiscal forte.
Eu, pessoalmente, acredito que a conjuntura econômica fraca, combinada com as
circunstâncias políticas eleitorais, dificilmente permitirão ou estimularão o
governo a fazer um ajuste fiscal forte. O que não quer dizer, evidentemente,
que o governo não tenha que manter a disciplina fiscal e o rigor em nas contas
públicas. Isso é fundamental para a confiança da economia e até para garantir o
crescimento no longo prazo. A dificuldade é saber qual a dosagem, qual a
combinação de política fiscal que você usa em uma situação econômica que se
complicou.
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