Por Ricardo Ferraço, senador pelo PMDB-ES, presidente da "Comissão de Relações Exteriores e Defesa"
“Faz
sentido reforçar os investimentos em defesa num país que não é
assombrado pelo fantasma da guerra e no qual falta dinheiro para saúde,
educação, saneamento e infraestrutura? Faz, e muito. O senso comum
associa as Forças Armadas apenas ao combate e à defesa do país em tempos
de conflito, ignorando o impacto do trabalho dessas mesmas forças em
tempos de paz, na proteção de interesses nacionais e no dia a dia do
brasileiro.
A defesa do
nosso patrimônio genético, por exemplo, é fundamental. O Brasil abriga
22% da biodiversidade do planeta e 35% das 25 mil espécies de plantas
usadas na produção de remédios. Mas perde mais de R$ 33 bilhões por ano (dados da CPI da Biopirataria) com o comércio ilegal de plantas e animais, numa guerra camuflada com o tráfico internacional.
A segurança
cibernética é outra área crucial, diante da multiplicação dos crimes
eletrônicos e do avanço das invasões on-line. O “Centro de Defesa
Cibernética”, criado pelo Exército em 2012, já esteve ativo na
“Conferência Rio+20” e estará em operação nos grandes eventos que marcam
a agenda brasileira da Copa das Confederações, este mês, às Olimpíadas
de 2016.
A atuação
das Forças Armadas no caso de catástrofes naturais também é da maior
relevância. Na ocasião das enchentes e deslizamentos que deixaram mais
de 900 mortos na região serrana fluminense, em 2011, coube ao Exército e
à Força Aérea Brasileira boa parte da responsabilidade na distribuição
de suprimentos e água em locais de difícil acesso, no transporte de
desabrigados, resgate de vítimas e remoção de carros inundados. Os
hospitais de campanha das Forças Armadas têm sido a solução mais
imediata no atendimento a vítimas de desastres no Brasil.
O “Programa
Nuclear da Marinha”, por sua vez, não prevê apenas a propulsão nuclear
do submarino. A capacidade desenvolvida e já alcançada de enriquecimento
de urânio — o Brasil é um dos poucos países no mundo com essa capacidade — também tem interesse para a produção de eletricidade e para usos medicinais.
Mas é a
vigilância das fronteiras brasileiras que garante às Forças Armadas um
protagonismo sem paralelo na área de segurança pública. E isso se
reflete no dia a dia de cada cidadão, no país inteiro. É pelas nossas
fronteiras que entra a maior parte das drogas e armas que alimentam o
crime organizado e a escalada de violência. Apostar numa política de
segurança que não tenha por base o combate ao narcotráfico é insistir em
enxugar gelo.
Um dos
projetos estratégicos do Exército é exatamente o “Sistema de
Monitoramento de Fronteiras” (SISFRON), que tem prazo de 10 anos para
ser implantado. Radares e sensores instalados em trechos-chave da
fronteira nacional vão ser capazes de captar e transmitir informações em
tempo real sobre ações de criminosos na fronteira brasileira, com a
participação da Polícia Federal, do Instituto Brasileiro do Meio
Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), da Receita Federal e
de vários outros órgãos federais, estaduais e municipais.
Na primeira
etapa, serão monitorados cerca de 600 km na faixa de fronteira do Mato
Grosso do Sul com o Paraguai e a Bolívia. Vale lembrar que o Brasil tem
mais de 16 mil km de fronteira, ao longo de 10 estados. Dados oficiais
do Exército calculam em 5,09% do PIB o custo da violência no Brasil em
2010. Algo da ordem de R$ 184 bilhões. Cerca, de R$ 40 bilhões desse
valor estariam ligados diretamente ao narcotráfico e sua infraestrutura
criminosa nas grandes cidades.
O SISFRON,
hoje em fase inicial, está orçado em torno de R$ 12 bilhões. É só fazer
as contas para ver que a relação custo-benefício é mais que favorável ao
reforço no sistema de vigilância das fronteiras. Além do papel decisivo
em termos de segurança, o sistema fortalece a indústria nacional e é um
estímulo significativo à pesquisa e ao desenvolvimento
científico-tecnológico.
O problema é
que os recursos vêm sendo liberados e executados a conta-gotas. Em
2012, foram executados apenas R$ 172 milhões, enquanto em 2013, do total
previsto de R$ 876,1 milhões, foram efetivamente disponibilizados na
Lei Orçamentária Anual apenas R$ 240 milhões. Nesse ritmo, a conclusão
do projeto — que deveria por bem ser incluído no PAC — vai levar mais de 50 anos!
Aumentar de 1,5% para 2% do PIB os gastos na área militar, num prazo de 10 anos — como quer o Ministério da Defesa — é mais que razoável. Seria ingenuidade — ou ignorância
— associar o aparelhamento das Forças Armadas a conflitos
internacionais. Apostar em defesa é, sim, assunto estratégico em tempos
de paz.”
FONTE: escrito por Ricardo Ferraço, senador pelo PMDB-ES, presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa. Publicado no jornal “Correio Braziliense” e transcrito no site “DefesaNet” (http://www.defesanet.com.br/pensamento/noticia/11127/Defesa-em-tempos-de-paz).
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