Thomaz
Ferreira Jensen
O Centro de Estudos da
Economia Cubana da Universidade de Havana realizou entre 26 e 28 de junho, em
Havana, seu seminário anual para debater as recentes transformações por que
passa a economia da ilha.
No seminário foram
apresentados 14 estudos sobre a evolução recente da economia em Cuba,
elaborados pelos professores que integram o Centro de Estudos. Todas as
apresentações estão disponíveis em: www.ceec.uh.cu
Os temas abordaram
desde a evolução industrial até o desempenho do setor agropecuário, passando
por análises do sistema tributário do País e das políticas de inovação que
estão sendo implementadas pelo Governo no âmbito das Orientações da Política
Econômica e Social do Partido Comunista de Cuba e da Revolução, aprovadas em
abril de 2011 no VI Congresso do Partido.
Este conjunto de “lineamientos” apresenta 313 resoluções
para “atualizar o modelo econômico cubano, com o objetivo de garantir a
continuidade e irreversibilidade do Socialismo, o desenvolvimento econômico do
País e a elevação do nível de vida da população, conjugados com a necessária
formação de valores éticos e políticos de nossos cidadãos”.
Cuba segue em seu longo
processo de construção de uma sociedade socialista, com economia planificada e
acesso universal aos direitos da cidadania. Desde o triunfo da Revolução, em
1959, o País se manteve nesta trajetória e enfrentou profundas transformações
mundiais. Seus pouco mais de 11 milhões de habitantes enfrentam desde 1962 as
conseqüências do bloqueio econômico imposto pelo governo dos EUA em represália
ao fim dos privilégios que os governos títeres concediam aos interesses
econômicos das empresas estadunidenses até a década de 1950.
Neste meio século de
construção do socialismo, Cuba logrou imensos êxitos, como a erradicação do
analfabetismo, ainda na década de 1960, e a universalização da educação
universitária; a realização de massiva reforma agrária, ainda nos primeiros
anos após a tomada do poder pelos rebeldes liderados por Fidel Castro; a implantação
de um sistema de saúde – da atenção básica e dos programas de saúde da família
a uma complexa indústria de biotecnologia e medicamentos que lidera o
desenvolvimento de vacinas e tratamentos contra o câncer – que é modelo para o
mundo e mantém os indicadores sociais de Cuba, há décadas, em patamares só
comparáveis aos de países como Suécia, Dinamarca ou Canadá.
Durante os longos anos
de “guerra fria”, Cuba esteve profundamente vinculada à estratégia de
cooperação econômica internacional liderada pela União Soviética entre fins da
década de 1960 até o colapso do bloco de países socialistas, no início da
década de 1990. Neste longo período, especializou-se ainda mais na plantação de
cana e produção e exportação de açúcar, traço de sua economia primário-exportadora
desde os tempos em que era colônia da Espanha, no século XIX. A partir do
comércio de açúcar, inseria-se no mercado comum dos países socialistas e
importava máquinas, petróleo para geração de energia elétrica e outros produtos
industrializados, abdicando de substituir importações por produção industrial
interna e, consequentemente, deixando de desenvolver indústria nacional.
Traço estruturante da
economia cubana, legado da estratégia emergencial adotada diante dos efeitos
sobre a economia nacional do colapso da União Soviética, é a dualidade
monetária: em Cuba, circulam duas moedas, o Peso Cubano e o Peso Conversível, e
existem praticamente duas economias no país. Os salários e os alimentos
básicos, em quantidades racionadas, os transportes e serviços essenciais, como
energia elétrica e telefonia, são comercializados em Pesos Cubanos. Mas se
generalizaram, na última década, as lojas que vendem alimentos, produtos de
higiene, roupas e eletrodomésticos em Pesos Conversíveis, moeda que até alguns
anos era de circulação restrita aos turistas estrangeiros.
A economia cubana
cresceu a uma média de 2,6% ao ano entre 2008 e 2011, último dado disponível,
depois de verificar taxas de expansão do PIB de 8% ao ano entre 2004 e 2007.
Trata-se de uma economia que depende basicamente das exportações de níquel, minério
utilizado na fabricação de aço inoxidável e baterias recarregáveis, e cujos
preços internacionais declinaram de 24 mil dólares a tonelada em 2011 para 15
mil dólares em março deste ano; dos recursos do turismo, que se mantém apesar
da crise que afeta os países europeus; e das remessas enviadas por cubanos que
vivem fora da ilha, basicamente nos EUA, e que somaram 2,6 bilhões de dólares
em 2012, 13% a mais que no ano anterior.
Em 2012 e nos primeiros
meses de 2013, verificam-se quedas na produção agropecuária, agravando a
dependência de importações de alimentos. No plano da inserção comercial
internacional, Cuba vivencia, desde meados da década passada, relação
privilegiada com a Venezuela, no âmbito da Alternativa Bolivariana para os
Povos de Nossa América (ALBA). De lá, recebe petróleo em troca do envio de
milhares de médicos e professores cubanos que atuam por toda Venezuela.
Em Cuba, é generalizada
na população, no Governo e entre os economistas, a necessidade de atualização
do sistema econômico. Cuba segue criando seu caminho socialista. E a inspiração
do revolucionário José Martí, referência intelectual principal para o processo
revolucionário cubano, segue intensa, como neste famoso texto de 1884: “Ser bom
é o único modo de ser feliz. Ser culto é o único modo de ser livre. Mas, no
usual da natureza humana, se necessita ser próspero para ser bom”.
Thomaz
Ferreira Jensen é economista, assessor sindical e membro do conselho consultivo
da Rede Social de Justiça e Direitos Humanos.
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