(JB) - No novo marco da internet brasileira e no quadro do
enfrentamento da espionagem cibernética norte-americana e de outros países
anglo-saxônicos, como se descobriu, agora, no caso do Canadá, é preciso tomar
cuidado com o que se está falando, fazendo e propondo.
Se pretende ter papel ativo no estabelecimento de um marco
internacional para a internet, o Brasil não pode - por açodamento ou desinformação
- adotar ou apresentar propostas inócuas, como a de tornar obrigatória a
hospedagem, por empresas internacionais, de dados de cidadãos brasileiros em
servidores situados em território nacional.
Estejam onde estiverem, os servidores continuarão a ser operados
pelas próprias empresas - a não ser que o governo passe a co-administrar o
Google, o Facebook ou a Microsoft no Brasil, o que é tão improvável como
ilegal. Se a empresa quiser (ou um diretor seu, ou um simples funcionário)
bastará repassar os dados requeridos para governo norte-americano, após
recolhê-los em seus servidores instalados em território brasileiro.
Depois, porque esteja dentro ou fora do Brasil, teoricamente
qualquer servidor pode ser invadido. Prova disso é que até mesmo servidores do Pentágono
e do governo dos EUA já foram “derrubados”, inclusive por hackers brasileiros, que atacaram servidores da NASA (por ter sido
– pasmem! - confundida com a NSA) há alguns dias.
Além disso, surgem (e morrem), todos os dias, milhares de
empresas na internet, entre elas redes sociais, que, de um jeito ou outro,
terão acesso a informações de brasileiros, pessoais ou não, já a partir do
cadastro. Como saber se elas têm ou não contato com o governo-norte-americano? Ou
se não foram criadas pelas agências de segurança norte-americanas? Como monitorar
seu surgimento, e obriga-las a transferir seus servidores para o Brasil?
Construir uma rede de internet, seja ela de âmbito
doméstico, corporativo, nacional ou planetário, é, teoricamente, simples.
Com determinação e dinheiro, qualquer nação, ou uma aliança
de países, como o BRICS – abordamos a hipótese de uma BRICSNET há alguns dias –
pode comprar, ou desenvolver, se tiver tempo, os servidores, backbones, roteadores, cabos de fibra
ótica, satélites, antenas, computadores, tablets,
iphones, etc, necessários para isso.
Embora o controle físico de uma rede, ou de parte dela
– estamos encomendando satélites,
instalando os cabos óticos da UNASUL e discutindo o projeto BRICS Cable – seja
importante, ele de nada vai adiantar se não dispusermos de softwares, que sejam
também relativamente seguros, para que essa rede, ou sub-rede, venha a funcionar.
Esses softwares, “open
source”, existem. Como possuem código aberto e são aperfeiçoados
rotineiramente, de forma voluntária e colaborativa, por gente do mundo inteiro,
é mais difícil dotá-los de “armadilhas” e “portas” clandestinas - como ocorre
com softwares das grandes empresas de internet, - para espionar os usuários.
O governo brasileiro já utiliza software livre em programas
ligados ao estado. E também softwares desenvolvidos pelo próprio governo. Tem que
passar a usá-los, exclusiva e obrigatoriamente, dotando-os de criptografia, nas
comunicações oficiais, além de instalar sistemas que bloqueiem a utilização de
e-mails, redes sociais e sites particulares a partir de computadores da
administração pública.
Mas nada disso vai adiantar se esses softwares não puderem
ser multiplicados, disseminados e utilizados, por meio de aplicativos, no dia a
dia do cidadão comum, o que nos leva a um fator decisivo - o marketing - que
não tem sido tratado, até agora, com a devida importância, nessa discussão.
Cidadãos de todo o mundo não tem seus dados devassados,
apenas porque os EUA sejam manipuladores e “malvados”. Eles são espionados
porque preferem continuar a sê-lo, a deixar de usar sites como o Google, o
Youtube, o Skype, o Instagram ou o
Facebook.
Se essas empresas forem proibidas de atuar no Brasil, os
cidadãos brasileiros continuariam a ter – voluntariamente - acesso a elas e aos
seus serviços, bastando para isso conectar-se aos seus computadores, situados
nos EUA ou em outros países. Isso, a não ser que cidadãos brasileiros fossem
censurados e proibidos de fazê-lo, e mesmo assim – nessa hipótese absurda – eles
poderiam burlar o governo através de proxys, VPNs, e muito mais.
Como já fizeram antes com o cinema e a televisão, quando se
sentam para decidir que roteiro escrever e produzir, na internet - na hora de
escolher que startup apoiar, que tipo
de aplicação desenvolver, onde instalar um vírus ou um malware - os norte-americanos agem, também, como o personagem do
conto de fadas do Flautista de Hamelin.
Desde a mais tenra idade, nossas crianças são fascinadas
pelos seus jogos, se comunicam por meio de seus serviços de mensagem, interagem
em suas redes sociais, conversam por meio de seus bate-papos e video-chats.
Se – sozinhos ou com o BRICS - não soubermos apostar na
educação e inovação, no marketing e no entretenimento, para conquistar a
atenção de nossos jovens, a sociedade brasileira continuará a ser espionada -
mesmo que a presidente passe a usar o novo email
dos Correios, ou um dia venha a deixar de "tuitar".
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