terça-feira, 12 de novembro de 2013

Cuba, com apoio do Brasil, abre uma janela para fora


postado em: 08/11/2013 Carta Maior
Havana - O ano de 2014 deve começar, para a economia cubana, com a abertura das primeiras instalações da chamada Zona Especial de Desenvolvimento Econômico localizada no modernizado Puerto del Mariel, uma baía situada há cerca de 70 quilômetros a oeste de La Habana.

Um porto para contêineres, grandes armazéns, uma zona franca, indústrias criadas com capitais externos e condições avançadas de infraestrutura, entre outros, serão os benefícios deste polo comercial e industrial, o mais importante do país e, desde já, considerado a principal janela cubana ao mundo das importações e exportações.

A partir do momento em que o Puerto del Mariel estiver operando, começarão a tornar-se definitivas a desmontagem e a renovação da histórica baía de Habana, que espera transformar-se em uma marina para iates e cruzeiros, sobretudo quando as restrições do bloqueio/embargo estadunidense, sustentado por mais de meio século, permitirem aos viajantes e navios do país vizinho atracar nas costas cubanas.

A modernização e montagem das instalações do El Mariel está financiada, no essencial (640 dos 900 milhões de dólares investidos), por um empréstimo obtido graças a um convênio intergovernamental firmado entre Brasília e La Habana.

O fato de que o Brasil e suas empresas tenham decidido realizar a obra e o investimento de alguma forma mostra seu interesse por ter um espaço comercial e produtivo nesse ponto privilegiado da geografia caribenha, na entrada do Golfo do México, em frente às praias estadunidenses e em vésperas de tornar-se efetiva a ampliação do calado do também próximo Canal de Panamá (2015), que desde então poderá receber navios de maior tonelagem.

A grande interrogação com respeito ao destino do El Mariel radica em saber quem e sob que condições colocarão seus investimentos nessa zona de desenvolvimento, na qual se espera que existam instalações não só portuárias ou de armazenagem, mas também industriais.

Muito se tem falado a respeito da necessidade de que o governo cubano finalmente declare se modifica suas relações legais com o capital estrangeiro. Já em julho de 2012 foi feito o anúncio oficial de que para fins daquele ano entraria em vigor uma nova lei de investimentos, que viria a substituir o instrumento legal aprovado em 1995 (Lei 77).

Mas a expectativa criada ainda não teve resposta definitiva enquanto, na verdade, o que foi acontecendo é que em meados de 2013 operavam na ilha 190 negócios de capital misto entre o governo cubano e entidades privadas estrangeiras, o que equivale à metade dos que existiram em 2000.

Segundo uma reportagem recentemente lida, da que tomo as cifras anteriores, um vice-ministro cubano de Comércio Exterior afirmou que “está em processo a avaliação de uma política geral e setorial que acompanhe o fomento desse investimento estrangeiro e, ainda que não esteja prevista a modificação da lei, poderão atualizar-se determinadas normativas”.

Ou seja, por enquanto não haverá nova lei e a Zona Especial de Desenvolvimento Econômico do El Mariel moverá seu destino e possibilidades sob uma regulamentação que nos últimos anos espantou a mais investidores do que atraiu, segundo a mais simples das operações aritméticas.

Não obstante, por suas características especiais, Mariel poderia ser regido por mecanismos legais diferentes, que talvez figurem entre as normativas que serão atualizadas.

As transformações econômicas empreendidas pelo governo de Raúl Castro, programadas nos Lineamentos da Política Econômica e Social aprovados no VI Congresso do Partido Comunista (2011), foram modificando certas estruturas e fundamentos da economia cubana.

Foi revitalizado o trabalho por conta própria, a criação de cooperativas agropecuárias e de serviços, a abertura de pequenos negócios privados, os quais melhoraram alguns serviços, a gastronomia, algo do transporte de passageiros, um pouco da produção de alimentos…

Mas por seu minguado nível de incidência na macroeconomia, essas mudanças não conseguiram, nem conseguirão, transformar-se em um motor para acelerar o desenvolvimento de um país urgido de eficiência, produtividade, modernização de toda sua infraestrutura, liquidez e acesso a finanças, ou seja, os elementos capazes de gerar riqueza palpável e, com ela, uma melhoria nos níveis de vida de uma população que vive há quase um quarto de século com salários apertados que não lhe permitem satisfazer todas suas necessidades básicas, incluída a alimentação.

Em várias ocasiões, altos cargos do governo e do Estado cubano advertiram que as mais importantes modificações econômicas estão por vir. Mas a promessa tem um conteúdo desconhecido e uma data de execução incerta.

Se a anunciada nova lei de investimento estrangeiro finalmente não for aprovada de um modo que seja capaz de atrair o capital externo, fica difícil imaginar quem estará interessado em investir em Cuba, inclusive na zona do El Mariel.

Além das empresas brasileiras, chinesas e russas, que previsivelmente estão próximas desse investimento, só o fator geográfico e a esperança de mudanças futuras não parecem ser suficientes atrativos para empresários que, ao chegarem a Cuba, teriam problemas inclusive para comprar um veículo rápido para o transporte de executivos e empregados.

E como pendência restaria saber que espaço terão em toda essa estrutura que se abre às pessoas naturais de Cuba – ou seja, os cubanos de Cuba -, para quem, outra vez segundo o lido, a Zona Especial de Desenvolvimento do El Mariel poderia ser fonte de emprego… mas não de investimento.

*Leonardo Padura, escritor e jornalista cubano, galardoado com o Prêmio Nacional de Literatura 2012. Suas novelas foram traduzidas para mais de 15 idiomas e sua recente obra, “El hombre que amaba a los perros”, tem como personagens centrais León Trotski e a seu assassino, Ramón Mercader.

Tradução: Liborio Júnior








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