quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Fantasma da deflação já assusta países da zona do euro


Carta Maior
postado em: 12/11/2013

Londres - Ninguém gosta que os preços subam, mas hoje os 18 países que compõem a zona do euro temem exatamente o contrário: a deflação. Em outubro, a inflação interanual caiu para 0,7%, o nível mais baixo desde 2009, muito longe da meta de 2%, fixada pelo Banco Central Europeu.

Na semana passada, o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, surpreendeu os mercados baixando a taxa de juros de 0,5% para 0,25%. A conseguinte queda do valor do euro, que deu um respiro ao setor exportador, poderia ajudar a “importar” inflação por meio do encarecimento das compras no exterior dada a queda do valor da moeda própria.

Em entrevista à Carta Maior, Simon Tilford, sub-diretor do Centre for European Reform em Londres, considerou que esta medida não será suficiente para espantar o fantasma da deflação e o temor de que a zona do euro siga os passos do Japão.

No ano passado, Mario Draghi conseguiu neutralizar o ataque especulativo contra a Espanha, a Itália e o euro dizendo que o BCE faria tudo o que estivesse ao seu alcance para evitar uma desintegração da zona do euro. Por que considera que agora sua decisão de baixar os juros não é suficiente?

Por muito tempo, o BCE considerou que o problema era a inflação, não a deflação.
Neste sentido é um passo positivo que tenham se dado contra da gravidade do problema, mas ainda não é uma solução. O corte das taxas de juro vai favorecer um pouco os exportadores porque fez o euro cair um pouco, vai ajudar os devedores porque barateia um pouco o custo dos empréstimos, mas vai até aí. Há muitos problemas estruturais. A taxa de juro é a mesma na Espanha, Itália e Alemanha, mas o custo de endividamento é três vezes maior na Espanha e Itália porque há muita preocupação a respeito do pagamento da dívida.

Qual é o problema com a deflação? A queda dos preços é algo que agrada os cidadãos. Por que isso pode ser um problema?

Em toda economia há momentos de deflação ou inflação. Por exemplo, o preço dos computadores baixou durante muito tempo. Mas quando o preço geral dos projetos sofre uma baixa isso pode ter efeitos devastadores porque a dívida pública e privada tem que ser paga com um produto interno nacional que está baixando. Para dar um exemplo, quanto mais baixo o nível de inflação, maior o superávit fiscal que se necessita para pagar a dívida.

O problema é que a taxa de juro, agora em 0,25%, não pode cair muito mais: não pode baixar de 0%. De modo que não há muita margem de manobra. Não se vê sinais que teremos mais inflação no próximo ano porque a recuperação econômica é muito débil, a política fiscal é restritiva e não é possível desvalorizar o euro que está muito forte.

A inflação de 0,7% é uma média. Na Grécia, os preços caíram 2%, na Alemanha subiram 1%. O desemprego na Alemanha é de 5,2%; na Espanha é de 26,6% e na Grécia de 27,7%. Como é possível agir entre tantas necessidades divergentes?

A zona do euro necessita de uma maior inflação na Alemanha. Isso permitiria a Itália e a Espanha, os dois países-chave neste momento da crise do euro, ganhar competitividade frente aos alemães. Nos primeiros oito anos do euro, a Alemanha teve uma inflação de 1,% enquanto que, em outros países, era de 3%. Precisamos agora que ocorra exatamente o contrário. Se isso não ocorre, não há como a dívida dos países do sul europeu ser sustentável.

Sempre se fala dos problemas estruturais dos países do sul, mas não se fala dos problemas estruturais da Alemanha. A demanda doméstica alemã cresce apenas 0,5%, algo que não é suficiente para gerar inflação. Tampouco estamos vendo um incremento forte de salários ou do consumo e o investimento empresarial está começando a cair. A Alemanha tem que resolver esses problemas para que haja uma saída para a zona do euro.

Há um perigo de deflação como ocorreu no Japão no início dos anos 90?

Muitas vezes se fala do perigo de que a Europa sofra uma década perdida como ocorreu com o Japão. Mas em muitos sentidos as coisas parecem pior na Europa, sobretudo em termos de crescimento econômico porque a zona do euro tem menos ferramentas para combater a deflação que o Japão. Os japoneses têm sua própria moeda, seu banco central. Na Espanha ou na Itália se os preços caem não há muito o quê fazer. O que é preciso nestes casos são ferramentas heterodoxas para baixar o valor da moeda e combater a deflação.

Ainda é possível uma desintegração do euro?

Do jeito que as coisas estão creio que veremos um aumento dos níveis da dívida e maiores tensões políticas e sociais. Os prognósticos do FMI e da Comissão Europeia são preocupantes porque ambos coincidem em que haverá baixo crescimento e baixa inflação, o que tornará muito difícil baixar os atuais níveis da dívida. Esse é o melhor cenário à vista. O pior é que a dívida aumente muito mais e que as pessoas comecem a perder a paciência que demonstraram até agora. O perigo aí é que os governos não podem compatibilizar a democracia com os requisitos de seu programa político e os riscos de manejar o euro.

Fala-se muito sobre se a América Latina está preparada para um choque externo. A mesma pergunta poderia ser feita em relação a Europa. O próprio Draghi advertiu que poderia haver choques externos.

Muitos políticos pensaram sinceramente que os problemas do euro seriam solucionados e que voltaria o crescimento econômico. Isso não ocorreu. Não resta dúvida que a crise continuará por bastante tempo. Em princípio, com as tendências atuais creio que o euro vai sobreviver. Mas isso pode mudar se há um choque externo, por exemplo, uma forte desaceleração da economia mundial porque a economia europeia depende cada vez mais de suas exportações. Se os Estados Unidos abandonarem seu programa de flexibilização quantitativa (emissão eletrônica de dinheiro), algo que parece bastante factível, também representaria um grande impacto. Não sabemos como a Europa pode reagir a isso.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer






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