sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O petróleo brasileiro e a desestabilização da Bolívia

19.11.13 - América do Sul

Raúl Zibechi
Adital
No dia 12 de novembro, a Agência Internacional de Energia (IEA, siglas em inglês) publicou, em Londres, o relatório ‘Perspectivas para a Energia Mundial’, no qual prevê que a demanda de energia crescerá um terço até 2035, devido à expansão do consumo da China, da Índia e do oriente Médio. Entre muitos temas, o relatório aborda as diferenças regionais nos preços da energia e como esse fator pode frustrar o crescimento das economias.
Tradução: ADITAL

Foto: Reprodução
O país estrela do relatório é o Brasil, ao qual dedicam um capítulo, assegurando que o país está na vanguarda na exploração em águas profundas e em energias que não provêm de hidrocarbonetos, por seus vastos recursos hidrelétricos. Adianta que para 2035, o Brasil se converterá em um importante exportador de petróleo e um produtor mundial de energia, sendo responsável por um terço do crescimento da oferta mundial de petróleo.
A agência internacional estima que os recursos do Brasil são abundantes e diversificados, onde convivem as energias renováveis e os maiores descobrimentos de petróleo no mundo, na última década. Segundo estimativas da IEA, coincidentes com os projetos anunciados pela Petrobras, a produção de petróleo do Brasil crescerá dos 2,2 milhões de barris diários atuais para 4,1 milhões, em 2020; e para 6,5 milhões em 2035, atingindo a 6ª posição no ranking de produtores mundiais.
Mas, não fica por aí a potencialidade da energia brasileira. A IEA assegura que em 2035, o Brasil será responsável por 40% do comércio global de biocombustíveis, já que conta com terras suficientes para expandir seus cultivos de cana de açúcar para fabricar etanol, que cobrirão um terço da demanda interna de combustíveis para o transporte. Segundo o relatório, o Brasil já é líder mundial em energias renováveis e está trabalhando para que, em 2035, possa duplicar sua produção de combustíveis renováveis até o equivalente a um milhão de barris diários de petróleo.
Tornar realidade essas projeções impõe gigantescos investimentos para a extração em águas profundas, de aproximadamente 60 bilhões de dólares anuais. Este ano, a Petrobras instalou nove plataformas marítimas e investiu cerca de 50 bilhões de dólares. A Agência de Energia calcula que em 2035 a Petrobras será líder global, com 60% da extração mundial de petróleo em águas profundas. Desse modo, o Brasil é o único membro do Brics que combina uma potente indústria um enorme setor agroalimentar e elevada produção de energia, o que o tornam menos vulnerável do que a China, por exemplo.
Que pensam fazer o Pentágono, o Comando Sul e o setor financeiro dos Estados Unidos ante esta situação que, de fato, desafia a hegemonia da superpotência na região? Não sabemos com exatidão; porém, tudo aponta para uma crescente desestabilização da Venezuela e de outros países que são chave para rodear o Brasil de conflitos, tal como está sendo feito para tentar frear a China e a Rússia.
Um recente editorial de The Wall Street Journal revela alguns objetivos não declarados, porém, plausíveis. Em sua coluna semanal, a editorialista Mary Anastasia O’Grady se pergunta: "A Bolívia é o novo Afeganistão? (The Wall Street Journal, 27/1-/13). O editorial é alucinante e seria hilário se não fosse, pois foi publicado em um dos diários mais influentes do mundo, que reflete a visão das elites do setor financeiro e do setor mais belicista das forças armadas.
O país andino converteu-se em um centro do crime organizado e em um porto seguro para os terroristas, reza o subtítulo. Recorda que após a ocupação soviética, o Afeganistão converteu-se em uma incubadora do crime organizado, sendo um lugar propício para pessoas como Osama Bin Laden. Algo parecido pode estar acontecendo na Bolívia. O governo é um defensor dos produtores de cocaína. A presença iraniana está crescendo. Agrega que Evo Morales e Álvaro García Linera "começaram a construir um narcoestado quando chegaram ao poder, em 2006”.
O editorial coloca supostas informações ao lado de afirmações dignas de uma agência de espionagem: o Irã pode ter financiado total ou parcialmente a construção de uma nova base de treinamento militar da Alba na região de Santa Cruz. Não há nada que avalize esse ‘pode’, além do fato de que a embaixada iraniana em La Paz teria muitos funcionários.
A coluna da semana seguinte foi contra o Brasil e seu puro teatro ao denunciar a espionagem estadunidense. "O apoio a Cuba –sustenta O’Grady- coloca o Brasil no lado equivocado da geopolítica” (The Wall Street Journal, 3/11/13). Sempre se pode pensar que se trata de afirmações de uma pessoa pouco séria e, talvez, como sugere a revista Nacla, quase delirante. Porém, O’Grady não é qualquer pessoa que escreve em um pequeno diário de província. Trabalhou durante uma década na financeira Merrill Lynch e integra o seleto conselho de redação do diário de maior circulação dos Estados Unidos.
Será um delírio pensar que certos setores de poder estão preparando operações muito mais ambiciosas do que as que derrubaram Manuel Zelaya e Fernando Lugo, ex-presidentes de Honduras e do Paraguai? Impossível saber com precisão; porém, vale recordar que um dos pontos cruciais da estratégia dos Estados Unidos para manter-se como superpotência consiste em impedir o nascimento de potências regionais que possam disputar seu lugar dominante.
Analistas brasileiros admitem que a estratégia do Pentágono consiste em exercer pressão sobre as fronteiras do Brasil, convertendo seus vizinhos em Estados falidos, categoria na qual, futuramente, podem ser colocados países como a Bolívia, talvez a Argentina, o Paraguai e até o Uruguai, com a desculpa do trânsito de drogas (Defesanet, primeiro de novembro). Estamos transitando um período de mudanças que inclui convulsões de todo tipo. É necessário preparar-nos para enfrentá-las.
[Fonte: Original em espanhol publicado em La Jornada, México, 15/11/13].

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