terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Perspectiva da Economia Brasileira para 2014


Escrito por Guilherme C. Delgado   
Segunda, 06 de Janeiro de 2014



Uma análise em perspectiva projeta-se normalmente além do futuro imediato, mesmo quando focaliza o que está mais próximo. Neste sentido, pretendo aqui tratar o ano de 2014 sob dois enfoques que, simultaneamente, o alcançam: a) as peculiaridades conjunturais do ano eleitoral e esportivo que deverá ser, por um lado; e b) a continuidade de um período de ‘ajuste’ estrutural da economia brasileira às situações críticas dela própria e de sua relação com a economia mundial, também em crise.

A conjuntura imediata é de festa, propaganda e eventos que, para serem produzidos e frequentados, têm repercussões econômicas sobre produção e emprego. Houve muito investimento urbano, não apenas em estádios, mas também em infraestrutura de mobilidade urbana, que certamente não se faria agora, ou na magnitude do que está ou deverá ser concluído até a Copa do Mundo.

O mesmo argumento é válido para a conclusão das obras de significado eleitoral, que a União, os estados e municípios realizarão, pretensamente para concluí-las antes do mês de outubro. Esse casamento operoso – esportivo e eleitoral – tem impacto conjuntural sobre o emprego, principalmente no setor de Serviços, que certamente ajudará a manter o crescimento da economia próximo da meta de 3,8%, que é o dado oficial aprovado referencialmente pelo Orçamento Fiscal e da Seguridade Social para 2014.

Por outro lado, se pensarmos que esses mesmos eventos esportivos e eleitorais colocam as massas nas ruas e nas urnas, e que há expectativas e inquietações no ar sobre os rumos da política, da sociedade e da economia, certamente precisaríamos dar muito mais atenção aos fatores estruturais, que ora constrangem o desenvolvimento brasileiro.

O binômio crescimento com distribuição de renda, ancorado externamente na especialização primário-exportadora dos setores produtores de ‘commodities’, e internamente nos mecanismos institucionais de distribuição da política social, revela-se em processo de exaustão nos dois pilares principais: 1) pela reversão cíclica do ‘boom’ de preços das commodities agrícolas e minerais, que garantiram por algum tempo folgada solvência externa; 2) pela exaustão do efeito virtuoso de distribuição de renda e crescimento econômico, impactado pela elevação do consumo de bens-salário que a política social promove.

Essa exaustão, diga-se de passagem, não é do argumento distributivo, que precisaria ser aprofundado. Mas manifesta os vícios do modelo macroeconômico geral, que induz crescentes vazamentos de gastos de consumo básico para as importações, elevando a dependência externa.

Em tais condições de distorção das relações internacionais, tanto o crescimento econômico quanto a distribuição de renda provocam vazamentos importantes para o exterior, porque ambos estão colados numa forma de especialização no comércio externo ultradependente de vantagens comparativas naturais. Tal inserção prescinde e expulsa a indústria manufatureira das exportações, mas não das importações.

Poder-se-ia esperar em 2014 uma politização do debate sobre desenvolvimento, com o que politicamente poderíamos tratar das reformas necessárias ao equacionamento do trinômio – crescimento, distribuição e dependência externa. Essa equação nunca se dá  espontaneamente pela dinâmica dos mercados, muito ao contrário. Ela não está assegurada sem ser politizada e, para tal, requer sujeitos históricos com capacidade de vocalizá-la. Mas, infelizmente, no debate político econômico atual, temos muita vocalização conservadora augurando a estagnação econômica e o final do experimento distributivo como mecanismos de “ajuste” à dependência externa. E do lado oficial, uma tentativa de “fazer mais do mesmo”, sem capacidade para fazer uma crítica da situação do subdesenvolvimento, relançada no último decênio.

Algo novo precisa acontecer em 2014 para superarmos essa dialética perversa, que interdita uma perspectiva de futuro, diferente da mera repetição do passado recente.


Guilherme Costa Delgado é doutor em Economia pela UNICAMP e consultor da Comissão Brasileira de Justiça e Paz.

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