terça-feira, 30 de junho de 2015

Senador Humberto Costa sobre o projeto PLS 131/2015 (que tira da Petrobrás a exclusividade de operação no pré-sal)

https://fbcdn-video-g-a.akamaihd.net/hvideo-ak-xtf1/v/t43.1792-2/11401712_469114383258106_1081783027_n.mp4?efg=eyJxZSI6InZpZGVvX3ByZWZlcnJlZF90YWdzXzIwMTUwMTIxLDIwMTUwMTAxIiwicmxyIjoxNTAwLCJybGEiOjExNzV9&rl=1500&vabr=285&oh=3e76c3aa7547b18b39ae2482a739a4d9&oe=55934D82&__gda__=1435717160_cd577854115410e1fca6fd63f139d58e

Haroldo Lima e Ricardo Ferraço debatem abrangência do PLS 131/2015

https://youtu.be/fSoGDD4U8Gk

Vale - o paradoxo da destruição

  Najar Tubino na Carta Maior.

A empresa está entre as maiores mineradoras do mundo, é a número um na extração de ferro, nas manufaturas chamadas pelotas e em níquel. Em 2014, teve receita líquida de US$37,5 bilhões, pagou US$4,2 bilhões em dividendos, contabilizou oito mortes por acidentes de trabalho e recebeu 3.096 reclamações e demandas das comunidades, a maioria em Minas Gerais e Pará, embora atue em 30 países. No Relatório de Sustentabilidade 2014 da empresa também constam 44 casos de conflitos pelo uso da terra, com 33 ocupações “indevidas” e remoções de 8.406 famílias em Moçambique e Malauí, para construção do Corredor de Nacala, cujo objetivo é transportar carvão mineral da mina de Moatize para o porto via ferroviária. Com 73 anos de operação, 18 deles como empresa privada, negociada por US$3,4 bilhões em 1997, certamente a maior barbada que o mercado mundial conheceu no século XX – uma das grandes obras do tucanato brasileiro – criou uma ouvidoria há um ano.

É uma multinacional brasileira, e uma das quatro maiores mineradoras do mundo, juntamente com a Rio Tinto, a BH Billiton e a Anglo American. Todas destroem o ambiente onde atuam, provocando alterações no ar, no solo e na água, extinguindo espécies animais, vegetais e vidas humanas. O que fazem atualmente, nesta fase histórica do capitalismo esclerosado, são compensações pelo estrago. A linguagem poética, lúdica e apaixonante destes relatórios de sustentabilidade cheira a ovo podre, é uma mistura de hipocrisia com demagogia barata. O relatório da Vale tem 119 páginas, bem ilustradas. Este ano também foi divulgado o Relatório Insustentabilidade 2015, do Movimento dos Atingidos pela Vale, com 32 páginas.

Hipocrisia – paixão pelas pessoas e pelo planeta

O texto é baseado nos dois, além de incluir informações do livro do Centro de Tecnologia Mineral sobre Recursos Minerais e Comunidade.

“- Acreditamos que o relacionamento pautado pela ética e transparência com as comunidades é fundamental para a sustentabilidade dos negócios. Procuramos gerenciar e mitigar os riscos e os impactos sociais”, diz um trecho do relatório da Vale, que traz a frase “para um mundo com novos valores”, como eixo. A Vale pretende “ser a empresa de recursos naturais global número um em criação de valor a longo prazo, com excelência, paixão pelas pessoas e pelo planeta”.

A área operacional da empresa no mundo é de 2,6 mil quilômetros quadrados e para isso diz proteger 15 mil quilômetros quadrados, junto com governos locais. O negócio da extração mineral, como qualquer outra atividade do capitalismo esclerosado, é obter lucros aos seus acionistas. A Vale é controlada pela Valepar, que por sua vez é controlada pelos fundos de pensão, a maior fatia é da Previ, na empresa Lintel/Litela, outros 17,4% são da Bradespar, empresa do Bradesco, 15% da Mitsui, multinacional dos EUA e 9,5% do BNDES. Outros 39,1% estão pulverizados em ações do mercado financeiro espalhados pelas bolsas do Brasil, Nova York, Hong Kong, Paris e Madri. O Bradesco participou da comissão que analisou os ativos da Vale do Rio Doce, a estatal, junto com a insuspeita Merril Lynch, que posteriormente quebrou em 2008 e foi incorporada pelo Bank of America.

 
Leia Mais: Tragédia e sofrimento na riqueza mineral brasileira

Importante não é a água, mas o ferro

Correm muitas ações na justiça pedindo a anulação da privatização não somente pela subavaliação das riquezas já conhecidas pela estatal – entre elas a principal que é a Província Mineral de Carajás-, mas pela própria participação do Bradesco, como avaliador e depois concorrente no leilão. Porém, as ações no STF caíram nas mãos do ministro Gilmar Mendes, que é o relator. O caso é que mineradora quer minério barato e precisa colocar no porto mais próximo, também de maneira barata. Se, por acaso, o morro onde está o ferro, fica na última reserva de transição da mata atlântica para o cerrado, considerada como patrimônio da biosfera pela UNESCO, como é o caso da Serra do Espinhaço, onde fica a Serra do Gandarela (MG), não tem importância alguma. O fundamental não são as nascentes dos mananciais que inclusive abastecem Belo Horizonte e a região metropolitana, mas sim o ferro que a China, a Índia, os EUA, seja lá quem for, precisam para produzir aço.

O governo federal criou um parque para proteger a Serra do Gandarela, mas com 31,2 mil ha, quando o próprio Instituto Chico Mendes recomendara 38 mil hectares. Sete mil ficaram para a Vale operacionalizar seu projeto Apolo, vai ocupar quase dois mil hectares. E na Floresta Nacional Tapirapé-Aquiri, área de conservação na Amazônia, o Projeto Salobo, de extração de cobre – a maior mina descoberta no Brasil- ocupa uma área de 190 mil hectares. Neste caso, a Vale está associada a Anglo American, e no ano passado já extraiu 98 mil toneladas, das 379,9 mil do total das minas. O preço do ferro caiu 47% em 2014, mas a quantidade continua aumentando – 379,7 milhões de toneladas. A Vale também bateu recorde na produção de ouro – 321 mil onças – e na exploração do níquel – 275 mil toneladas.

Leia Mais: Novo Código da Mineração: o neoliberalismo explícito do Congresso Nacional

 
Especulação imobiliária tomou conta

A verdade é que as mineradoras não estão interessadas na vida de quem está no caminho de suas explorações. A Estrada de Ferro Carajás, com 892 km, é um exemplo disso, desde 1985, quando foi inaugurada. Ela corta 22 municípios, 19 deles no Maranhão e três no Pará. O corredor aberto pela ferrovia foi totalmente desmatado, ocupado por grileiros, pecuaristas de ocasião e guseiros, que montaram fornos de carvão terceirizados e suas siderúrgicas, para limpar o ferro de Carajás, propriedade da Vale. A especulação imobiliária tomou conta da região, os conflitos se acirraram, as populações se multiplicaram e a compensação ambiental ou social atende uma ínfima parcela desse cenário conturbado. A Vale também tem “interface” – faz parte da linguagem do capitalismo esclerosado – com 34 comunidades tradicionais e 12 povos indígenas. Trata-se de um número oficial. Mesmo assim com o “Método de Gestão Integrada”, processo de diálogo social por meio de metodologias participativas, a ferrovia foi interditada por protestos de índios e quilombolas.

Encrencas judiciais e administrativas

Também estão anotadas no Relatório de Sustentabilidade 2014 no tema chamado “Conformidades Ambientais”, algumas encrencas judiciais ou administrativas da Vale:

“- Auto de infração do Instituto Chico Mendes (ICMBIO) contra a Salobo Metais S.A em consequência de um incêndio ocorrido na Floresta Nacional de Carajás.

-Autuação do IBAMA por insumos utilizados na ampliação da Estrada de Ferro Carajás que geraram impactos ambientais.

-Ação civil pública no Espírito Santo em razão da poluição do Complexo de Tubarão, afetou os moradores da Baía de Camburi – são oito usinas de pelotização no Complexo de Tubarão.

-Em Omã, em função da poluição de particulados – usina de pelotização – aberto um processo contra a empresa.

-Pescadores de Ubu e Parati – Espírito Santo – aguardam decisão judicial sobre indenização causada por poluição, que causou danos à pesca.

- Em Itabira (MG), onde algumas minas já encerraram atividade, duas ações de indenização por danos sociais e ambientais.

- Quatro ações contra o licenciamento da mina Capão Xavier.

- No Maranhão, processo em fase inicial, cobra indenização pela interferência na atividade pesqueira.

- Ação de anulação do licenciamento do Ministério Público Federal da expansão da ferrovia de Carajás.”

A Vale pagou uma das multas do IBAMA de US$6,47 milhões.

Leia Mais: Mineração na caatinga: o pesadelo das comunidades rurais 
 

Custos de operação transformados em preservação

A empresa divulga e faz marketing dos gastos em preservação ambiental e ações sociais totalizando US$1,1 bilhão. Os dados são discriminados no relatório, para quem encara a leitura. Do total citado, US$864,8 milhões foram destinados à proteção e conservação, sendo 37% voluntários e 63% referentes a requisitos legais – ou seja, cumpriram a legislação da área. Dos US$270,4 milhões para projetos sociais 58% foram voluntários e 42% obrigatórios, certamente compensações pelos impactos. Vamos detalhar ainda mais: dos dispêndios ambientais US$314,8 milhões foram para construção de barragens de rejeitos, diques e pilhas de estéril, justamente o estrago causado pela extração mineral e que fazem parte dos custos da empresa. Outros US$87 milhões para tratamento de resíduos. Isso engloba quase a metade dos dispêndios ambientais, na verdade deveriam ser enquadrados como custos de operação. No caso dos dispêndios sociais, o maior volume de verba está no item Desenvolvimento Humano e Econômico – de acordo com o PNUD, da ONU, “situa as pessoas no centro do desenvolvimento, trata da promoção do potencial das pessoas...do desfrute da liberdade de viver que valorizam” e recebeu US$102,6 milhões. O segundo maior item a receber verba foi “gestão de impacto” com US$62,4 milhões.

Cabe registrar um tópico do relatório de sustentabilidade 2014 da Vale – “potenciais impactos biofísicos”. São 28 tipos de estragos que a mineração causa no ambiente onde atua, desde desmatamento, perda de solo, contaminação e redução da disponibilidade hídrica, perda de hábitat de espécies redução de biomassa, alteração na vida das comunidades, entre outros. Para finalizar: dos 206,4 mil empregados da Vale, a maioria no Brasil, 129,9 mil são terceirizados e 76,5 mil são próprios, e nos últimos três anos, quase 10 mil postos fecharam – em 2012 eram 85,3 mil funcionários.






PT deu quase R$ 10 bilhões pra Globo

Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho. Transcrito do Blog do Miro:
Esse post é para sentarmos à margem do rio Tietê e chorarmos copiosamente.

Só a TV Globo recebeu mais de R$ 6 bilhões de publicidade federal durante a era PT.

Se contássemos as afiliadas da Globo em outros estados, essa conta subiria quase 2 bilhões.

Se acrescentarmos rádios, jornais, portais pertencentes à Globo, mais uns 2 bilhões.

No total, veremos que o governo federal petista deu quase R$ 10 bilhões para a família Marinho.

Depois o PT quer fazer “pesquisa” para entender porque é tão odiado.

Depois os petistas querem entender porque o fascismo se expande na sociedade, e ministros petistas são xingados em restaurantes.

São xingados, com todo o respeito, porque o PT é burro.

Burro e masoquista.

Os tucanos quebraram, de verdade, o país; aprovaram a emenda mais “chavista” de toda a América Latina: reeleição para si mesmo, sem direito a opinião do povo sobre isso; multiplicaram a nossa dívida pública; acorrentaram-nos aos pés do FMI…

E seus economistas são aplaudidos em restaurantes.

Enquanto isso, Mantega, que salvou a economia brasileira durante uma das piores crises da história recente do capitalismo, é xingado por retardados em São Paulo, que lhe acusam de “destruir tudo”.

O PT alimentou o próprio inimigo com dinheiro público.

Quer dizer, não apenas o próprio inimigo. O inimigo da classe trabalhadora em geral.

Pior: nos últimos dois anos, em 2013 e 2014, a publicidade federal para os órgãos do golpe aumentou fortemente.

Há uma equação certeira: quanto mais a publicidade federal se concentra nas mesmas famílias de barões midiáticos, mais despenca a aprovação do governo.

Enquanto isso, revistas progressistas, rádios comunitárias, iniciativas populares de comunicação, tudo ficou à míngua, abandonado.

A TV Brasil foi sucateada, abandonada politicamente, depois de todo o esforço feito para criá-la e subsidiá-la. Não tem audiência e ninguém parece se preocupar com isso.

Dessa vez, Fernando Rodrigues ficou até com pena da blogosfera. Em outras ocasiões, dava destaque aos caraminguás miseráveis que meia dúzia de sites ou blogs ganhavam de publicidade federal. Juntava o que, por exemplo, o blog Nassif ganhou durante uns dez anos e tascava um número sensacionalista:

“Nassif ganhou 1 milhão do governo federal”. Aí quando você dividia aquilo por dez ou doze anos, não dava nada.

Ao constatar o desprezo oficial do governo para com iniciativas de fomento à pluralidade política, Fernando Rodrigues nem tocou no assunto.

O que me lembra a canção de Bezerra da Silva, sobre o ladrão que invade a casa do pobre e quase morre do coração, “ao ver tanta miséria em cima de um cristão”.

A grande mídia, esta sim, continuou ganhando na era Lula/Dilma o que sempre ganhou anteriormente. Em alguns casos, até mais.

Além de não fazer nada de concreto em prol da democratização da mídia, o governo petista ajudou a piorar o quadro de oligopólio dos meios de comunicação, através da concentração de verba publicitária federal em mãos de poucos.

E pelo mutismo covarde atual, não há nenhuma mudança substancial à vista.

O governo precisa entender que, em matéria de comunicação, não adianta agir em silêncio, discretamente. Isso é contraproducente. O ministro Edinho Silva, da Secom, tem de vir a público e falar abertamente à imprensa: “vamos democratizar profundamente as verbas públicas federais, porque é um imperativo da nossa Constituição, estimular o pluralismo político”.

E se preparar para a briga!

É tão difícil assim?

O PT quer continuar sendo linchado em restaurantes, aeroportos, etc?

O PT vai morrer beijando os pés de seus verdugos?

Quem se ferra, ao cabo, não é só o PT.

Todos os movimentos sociais, toda uma corrente de ideias, todo um sistema ideológico que dá sustentação às leis trabalhistas, ao monopólio da Petrobrás, tudo isso será tragado e destruído se o PT prosseguir financiando uma imprensa ultraconservadora, mentirosa e golpista.

Olha que nem falei do mais importante: as conspirações judiciais, quase todas alimentadas, desde seu início, pela mídia.

*****

TV Globo recebeu R$ 6,2 bilhões de publicidade federal com PT no Planalto

Por Fernando Rodrigues, em seu blog no UOL
29/06/2015 06:59

Já a Record teve R$ 2 bi de verbas nos 12 anos de Lula e Dilma

De 2003 a 2014, SBT recebeu R$ 1,6 bi; Band ficou com R$ 1 bi

UOL obteve dados inéditos e exclusivos sobre publicidade federal

Globo ainda lidera em verbas estatais, mas tem queda em anos recentes

Rede TV!, com menos de 1 ponto de audiência, recebeu R$ 408 mi nos anos petistas

A Rede Globo e as 5 emissoras de propriedade do Grupo Globo (em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Brasília e Recife) receberam um total de R$ 6,2 bilhões em publicidade estatal federal durante os 12 anos dos governos Lula (2003 a 2010) e Dilma (2011 a 2014).

Como a cifra só considera TVs de propriedade do Grupo Globo, o montante ficaria maior se fossem agregados os valores pagos a emissoras afiliadas. Por exemplo, a RBS (afiliada da Globo no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina) recebeu R$ 63,7 milhões de publicidade estatal federal de 2003 a 2014.

Outro exemplo: a Rede Bahia, afiliada da TV Globo em Salvador, que pertence aos herdeiros de Antonio Carlos Magalhães (1927-2007), teve um faturamento de R$ 50,9 milhões de publicidade federal durante os 12 anos do PT no comando do Palácio do Planalto.

A TV Tem, que abrange uma parte do rico mercado do interior do Estado de São Paulo, em 4 regiões (com sedes nas cidades de São José do Rio Preto, Bauru, Itapetininga e Sorocaba), faturou R$ 8,5 milhões de publicidade estatal federal em 2014. Essa emissora é de propriedade do empresário José Hawilla, conhecido como J. Hawilla (pronuncia-se “Jota Ávila”), que está envolvido no escândalo de corrupção da Fifa.

Os dados deste post são inéditos. Nunca foram publicados com esse nível de detalhes até hoje. Os valores até 2013 estão corrigidos pelo IGP-M, o índice usado no mercado publicitário e também pelo governo quando se trata de informações dessa área. Os números de 2014 são correntes (sem atualização monetária).

A série histórica sobre publicidade do governo federal começou a ser construída de maneira mais consistente a partir do ano 2000. Não há dados confiáveis antes dessa data.

O volume total de publicidade federal destinado para emissoras próprias do Grupo Globo é quase a metade do que foi gasto pelas administrações de Lula e Dilma para fazer propaganda em todas as TVs do país. Ao todo, foram consumidos R$ 13,9 bilhões para veicular comerciais estatais em TVs abertas no período do PT na Presidência da República. As TVs da Globo tiveram R$ 6,2 bilhões nesse período.

Apesar do valor expressivo destinado à Globo, há uma nítida trajetória de queda quando se considera a proporção que cabe à emissora no bolo total dessas verbas.

As emissoras globais terminaram o governo do tucano Fernando Henrique Cardoso, em 2002, com 49% das verbas estatais comandadas pelo Palácio do Planalto e investidas em propaganda em TVs abertas.

No ano seguinte, em 2003, já com o petista Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência, a fatia da Globo pulou para 59% de tudo o que a administração pública federal gastava em publicidade nas TVs abertas. Esse salto não se sustentou.

Nos anos seguintes, com algumas oscilações, a curva global foi decrescente. No ano passado, 2014, a Globo ainda liderava (recebeu R$ 453,5 milhões), mas chegou ao seu nível baixo de participação no bolo estatal federal entre TVs abertas: 36% do total da publicidade.

Todos esses dados podem ser observados em detalhes no quadro a seguir (clique na imagem para ampliar):



Como se observa, a queda de participação das TVs é também sentida na audiência da maior emissora brasileira. Segundo a aferição realizada pelo Ibope Media Workstation (Painel Nacional de Televisão, com base 15 mercados, durante 24 horas, todos os dias), a TV Globo teve 12 pontos de audiência domiciliar média em 2014.

Todas as 4 maiores emissoras de TV aberta enfrentaram quedas de audiência ao longo dos últimos anos. Essa menor presença nas casas das pessoas, entretanto, nem sempre está refletida em menos verbas publicitárias federais.

A Record, por exemplo, recebeu um verba de R$ 264 milhões em 2014 contra R$ 244 milhões em 2013 (aumento de 8,4%), apesar da queda da audiência da emissora de um ano para o outro (de 4,5 para 4,2 pontos no Ibope, das 6h à 0h).

Já o SBT, terceira TV aberta no Brasil (cuja audiência ficou quase estável, variando de 4,5 para 4,4 pontos no Ibope, de 2013 para 2014), registrou uma queda no faturamento de publicidade estatal federal: saiu de R$ 182 milhões para R$ 162 milhões.

Nota-se, portanto, uma assimetria no tratamento dado pelo governo para as 2 maiores TVs que ficam abaixo da Globo quando se considera audiência e valores de publicidade recebida.

Record e SBT tiveram audiências muito semelhantes em 2014, na casa de 4 pontos no Ibope. Só que a Record, emissora do Bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, recebeu cerca de R$ 100 milhões a mais de verbas publicitárias federais no ano passado na comparação com o SBT, do empresário e apresentador Silvio Santos.

Já a Band (com apenas 1,7 ponto de audiência média no Ibope em 2014) teve R$ 102,4 milhões de propaganda dilmista no ano passado. A Rede TV! (0,6 ponto de audiência) ficou com R$ 37,8 milhões.

JORNAIS IMPRESSOS

Nos governos Lula e Dilma (2003-2014), os jornais impressos arrecadaram R$ 2,1 bilhões com a publicação de propagandas da administração petista. Desse total, R$ 730,3 milhões (35%) foram destinados a apenas 4 publicações: “O Globo”, “Folha de S.Paulo”, “O Estado de S.Paulo” e “Valor Econômico”.

Alguns aspectos chamam a atenção a respeito da publicidade estatal federal para jornais diários impressos.

Um deles é que durante os anos de 2000, 2001 e 2002 (no governo do tucano Fernando Henrique Cardoso) essas 4 publicações tiveram um volume de receita de publicidade estatal proporcionalmente igual ao do período subsequente, com o PT no poder.

Como está registrado acima neste post, não existem dados disponíveis e confiáveis sobre gastos em propaganda antes do ano 2000.

Dessa forma, só é possível somar os valores dos 3 últimos anos do segundo mandato de FHC, quando todos os jornais diários brasileiros receberam R$ 701,4 milhões de verbas de propaganda do governo federal. Desse total, a quadra “Globo-Folha-Estado-Valor” ficou com R$ 243,1 milhões –ou seja, 35% do bolo completo do meio jornal.

A conclusão é simples: embora o discurso do PT no poder tenha sido crítico em relação à cobertura jornalística feita pelos grandes jornais impressos diários, os petistas no Palácio do Planalto continuaram a conceder proporcionalmente a esses veículos o mesmo que o governo do PSDB concedia.

Eis os dados sobre publicidade estatal nos principais jornais impressos do país (clique na imagem para ampliar):









JORNAIS DIGITAIS

Há um dado que merece ser visto com mais atenção quando se observa o valor recebido pelos mais tradicionais jornais impressos do país para veicular publicidade estatal federal: quanto vai para as suas operações na internet.

O quadro acima neste post mostra o valor total recebido por “O Globo”, “Folha de S.Paulo”, “O Estado de S.Paulo” e “Valor Econômico”. Mas é possível saber exatamente quanto essas empresas faturaram desses anúncios para veiculá-los apenas em suas edições online. E também existem dados sobre quantas edições desses 4 jornais são de fato impressas, em papel, e quantas são apenas assinaturas digitais.

Eis os dados (clique na imagem para ampliar):



Como se observa, há uma curva de crescimento para todos os 4 veículos ao longo dos últimos anos, com algumas oscilações. Em 2014, o líder das verbas estatais federais em suas edições digitais foi o jornal “O Estado de S.Paulo”, que recebeu R$ 2,743 milhões. Outro dado interessante: a queda continua das edições impressas. E no mês de maio de 2015, o jornal “O Globo” se tornando o de maior tiragem impressa entre os veículos de qualidade do país, à frente da “Folha de S.Paulo” –que há décadas liderava esse ranking.



REVISTAS
O meio revista tem experimentado também uma grande queda no faturamento com verbas publicitárias federais. A semanal “Veja”, líder do mercado, já chegou a ter R$ 43,7 milhões dessas verbas em 2009 (o seu recorde). Em 2014, desceu para R$ 19,9 milhões.

Eis os dados detalhados sobre as 4 principais revistas do país (clique na imagem para ampliar):











PORTAIS DE INTERNET
O meio internet já é o segundo que mais recebe publicidade estatal do governo federal. Esse dado fica bem visível quando se observam os valores destinados a 4 grandes portais brasileiros.

O UOL, maior portal do país com 39,8 milhões de visitantes únicos em dezembro de 2014, teve R$ 14,7 milhões de faturamento para veicular propaganda estatal federal nesse ano. O UOL pertence ao Grupo Folha.

O G1 e o portal Globo.com, somados, tiveram uma audiência de 34,1 milhões de visitantes únicos em dezembro de 2014. Receberam R$ 13,5 milhões de verbas federais de publicidade nesse ano.

Eis os dados detalhados de 4 grandes portais de internet (clique na imagem para ampliar):





(Colaborou nesta reportagem Bruno Lupion, do UOL, em Brasília).

Seis motivos que justificam a importância de manter a Petrobrás como operadora única na área do pré-sal


1- Para avançar com soberania energética e ambiental: controlando a produção, garantido o abastecimento nacional,evitando a extração predatória, os riscos de acidentes e maiores custos econômicos no futuro. A operação única pela Petrobrás no pré-sal brasileiro garante ao Estado nacional, que detém a maioria do capital votante da empresa, o planejamento da produção, escapando da armadilha da produção rápida e predatória, que compromete os reservatórios e trás inúmeros riscos ambientais como o ocorrido no acidente no campo de frade no litoral do Rio de Janeiro em novembro 2011 operado pela estadunidense Chevron.
O Petróleo por muitos anos será estratégico como energético (responsável por mais de 50% da matriz mundial) e como matéria prima (presente em mais de 3.000 produtos). Garantir, sua exploração e uso adequado na atualidade, e que não faltará este recurso para as futuras gerações de brasileiros é obrigação de todos.
São inúmeros os exemplos de nações que submeteram a produção a multinacionais que operam sobre a lógica meramente econômica e hoje se encontram em maus lençóis. As situações vividas por nossos vizinhos argentinos onde após a privatização exportaram petróleo a 04 dólares o barril e mais tarde tiveram que importar a mais de 100 dólares, ou da Indonésia, que exportou petróleo a 01 dólar o barril e hoje drena seus recursos pagando pelo mesmo barril de petróleo 60 dólares,
são procedimentos que não devemos repetir em nosso país.
2- Para preservar e ampliar o conhecimento, bem que vale mais do que o dinheiro. Ter a Petrobras como operadora única é essencial para garantir o domínio e a continuação do desenvolvimento tecnológico. O nível tecnológico atingido pelos trabalhadores da Petrobrás é fruto de muito trabalho e desenvolvimento científico. Ceder a condição de operadora única dificulta esta vantagem estratégica, expõe nossa capacidade de vanguarda a potenciais competidores e desperdiça oportunidades de aprendizado. A Petrobras recebeu em maio de 2015 o prêmio da OTC (Offshore Technology Conference) considerado o Nobel da indústria petroleira. Este prêmio foi graças a nossa produção no pré-sal. Chegar a essa condição custou sangue, suor e lágrimas a gerações de brasileiros. As três coisas mais importantes para uma empresa de energia são: mercado, reservas e conhecimento tecnológico. O Brasil através da Petrobras detém os três sendo o conhecimento o mais difícil de ser alcançado. Não temos nenhuma dúvida que a história vitoriosa da Petrobrás, e seu extraordinário potencial indica plena capacidade de ser a operadora única no pré-sal. Mesmo vivenciando dificuldades momentâneas em relação a sua capacidade financeira, fato que já esta sendo superado com uma política adequada de preços, a Petrobrás conseguiu em apenas 8 anos após a descoberta do pré-sal, uma produção de cerca de 800 mil barris por dia, fato inédito na indústria do petróleo.
3- Para garantir que o petróleo produzido e os royalties recolhidos sirvam aos interesses do povo brasileiro. A operadora é responsável por medir o petróleo produzido e submeter a informação às instituições de controle e regulação. A produção sobre as condições do pré-sal, a quilômetros de distancia da costa dificulta e muito a
fiscalização. Seguramente a melhor forma de acompanhamento pelo povo, e por nossas instituições nacionais dessa importante questão é estar sob controle da Petrobrás. Ter a Petrobrás como operadora única, com o adequado controle público, é maior garantia na destinação dos Royalties para educação e para a saúde. Além do mais, a propriedade do petróleo da às nações vantagens geopolíticas, na medida em que, o Estado pode administrar uma base natural rara, não renovável, desigualmente distribuído]no planeta e sobretudo essencial para a sobrevivência a segurança e o bem estar de todos os Estados.
4- Para alavancar o desenvolvimento, com o conteúdo local, gerando mais e melhores empregos. A Petrobrás, como operadora única, tem plenas condições de dirigir os empreendimentos. Incentivando de forma organizada o desenvolvimento da indústria de bens e serviços. Essa condição é essencial para a política industrial brasileira, maximizando o conteúdo local, em bases competitivas, e garantindo o desenvolvimento integrado a nível nacional. Segundo dados do SINAVAL (Sindicato da Construção Naval) apesar da existência de inúmeras operadoras privadas e estrangeiras no Brasil apenas a Petrobras tem encomendas de navios e
plataformas aos nossos estaleiros, portanto, a prática nos conduz a convicção, que sem a Petrobrás, a política do conteúdo local tão importante para impulsionar o desenvolvimento nacional ficará só no papel. A operação e a condução dos empreendimentos pela Petrobrás possibilitam que mais e melhores empregos sejam criados no Brasil. Este fator estimula o estudo, a pesquisa e o conhecimento, potencializando a inteligência local, garantindo as condições para o intercambio de experiência
com o conhecimento produzido a nível mundial.
5- Para manter a integralidade da lei da Partilha. A lei da Partilha 12.351/2010 aprovada pelo congresso Nacional representou um salto de qualidade para a produção de Petróleo no Brasil. Esta lei possibilita a estruturação de uma grande nação alavancando o desenvolvimento nacional, garantindo soberania energética e dando destino
social ao retorno econômico, resolvendo assim nossos ainda graves problemas sociais. A Petrobras, como operadora única do Pré-Sal, é parte fundamental do modelo formulado na partilha para garantir esse tripé: soberania energética, desenvolvimento econômico e destinação social. Mudar esse ponto irá "desfigurar a Lei da Partilha" comprometendo a utilização adequada de um recurso que a natureza levou 150 milhões de anos para produzir.
6- Porque acreditamos no Brasil, na nossa potencialidade e na nossa capacidade. A História da indústria do petróleo em nossa Pátria é cheia de desafios, que foram sendo superados um a um com perseverança, determinação e muito trabalho. Superamos o desafio de encontrar o sonhado petróleo no Brasil. Superamos o desafio de
desenvolver uma empresa e uma indústria potente e exemplar. Superamos o desafio de sermos autossuficientes em petróleo. Superamos o desafio histórico, ao descobrir o pré-sal, que para o consumo nacional, temos petróleo para mais de 100 anos. Confiamos plenamente no povo brasileiro, na capacidade de superarmos problemas que possam surgir. A Petrobrás operadora única no pré-sal é mais uma conquista histórica. Manter esta conquista é um desafio de todos que lutam por um país justo, democrático e fraterno.
Rio de Janeiro, 15 de junho de 2015.
FUP Federação Única dos Petroleiros.
CUT
Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)
Plataforma Operária e Camponesa para Energia


O governo dos banqueiros. Artigo de Jürgen Habermas

Publicado no IHU

"São os cidadãos, não os banqueiros, que têm de dizer a última palavra sobre as questões que afetam o destino europeu". O comentário é de Jürgen Habermas, filósofo e escritor alemão em artigo publicado no jornal no El País, 28-06-2015. Habermas lembra que "a Alemanha deve o impulso inicial para sua decolagem econômica, do qual ainda se alimenta hoje, à generosidade dos países credores que no Tratado de Londres, de 1954, perdoaram mais ou menos a metade de suas dívidas".
Segundo ele, "o acordo não está fracassando por causa de alguns bilhões a mais ou a menos, nem por causa de um ou outro imposto, mas unicamente porque os gregos exigem que a economia e a população explorada pelas elites corruptas tenham a possibilidade de voltar a funcionar através da quitação da dívida ou uma medida equivalente, como, por exemplo, uma moratória dos pagamentos vinculada ao crescimento".
Eis o artigo.

A última sentença do Tribunal de Justiça Europeu [que permite ao Banco Central Europeu (BCE) comprar dívida soberana para combater a crise do euro] lança uma luz prejudicial sobre a falida construção de uma união monetária sem união política. No verão de 2012, todos os cidadãos tiveram que agradecer a Mario Draghi, presidente do BCE, que com uma só frase [“farei o necessário para sustentar o euro”] salvou a moeda das desastrosas consequências de um colapso que parecia iminente. Ele tirou do sufoco o Eurogrupo ao anunciar que, caso fosse preciso, compraria dívida pública em quantidade ilimitada. Draghi teve que dar um passo à frente porque os chefes de Governo eram incapazes de agir pelo interesse comum da Europa; todos estavam hipnotizados, prisioneiros de seus respectivos interesses nacionais.
Naquele momento, os mercados financeiros reagiram – diminuindo a tensão – diante de uma única frase, a frase com a qual o presidente do BCE simulou uma soberania fiscal que absolutamente não possuía. Porque agora, assim como antes, são os bancos centrais dos países-membros os que aprovam os créditos, em última instância. O Tribunal Europeu não pode referendar essa competição contrária ao texto literal dos tratados europeus; mas as consequências de sua sentença deixam implícito que o BCE, com escassas limitações, pode cumprir o papel de credor de última instância.
O tribunal abençoou um ato salvador que não obedece em nada à Constituição, e o Tribunal Constitucional alemão apoiará essa sentença acrescentando as sutilezas às quais estamos acostumados. Alguém poderia estar tentado a afirmar que os guardiões do direito dos tratados europeus se veem obrigados a aplicá-lo, ainda que indiretamente, para mitigar, caso a caso, as consequências indesejadas das falhas de construção da união monetária. Defeitos que só podem ser corrigidos mediante uma reforma das instituições, conforme juristas, cientistas políticos e economistas vêm demonstrando há anos. A união monetária continuará sendo instável enquanto não for complementada pela união bancária, fiscal e econômica. Mas isso significa – se não quisermos declarar abertamente que a democracia é um mero objeto decorativo – que a união monetária deve se desenvolver para se transformar em uma união política. Aqueles acontecimentos dramáticos de 2012 explicam por que Draghi nada contra a corrente de uma política míope – até mesmo insensata, eu diria.
Estamos outra vez em crise com Atenas porque, já em maio de 2010, a chanceler alemã se importava mais com os interesses dos investidores do que com quitar a dívida para sanar a economia grega. Neste momento, evidencia-se outro déficit institucional. O resultado das eleições gregas representa o voto de uma nação que se defende com uma maioria clara contra a tão humilhante e deprimente miséria social da política de austeridade imposta ao país. O próprio sentido do voto não se presta a especulações: a população rejeita a continuação de uma política cujo fracasso as pessoas já sentiram de forma drástica em suas próprias peles. De posse dessa legitimação democrática, o Governo grego tentou induzir uma mudança de políticas na zona do euro. E tropeçou em Bruxelas com os representantes de outros 18 Governos, que justificam sua recusa remetendo friamente a seu próprio mandato democrático.
Recordemos os primeiros encontros, quando os novatos – que se apresentavam de maneira prepotente motivados por sua vitória arrebatadora – ofereciam um grotesco espetáculo de troca de golpes com os residentes, que reagiam em parte de forma paternalista, em parte de forma desdenhosa e rotineira. Ambas as partes insistiam como papagaios que tinham sido autorizadas cada uma por seu respectivo “povo”. A comicidade involuntária desse estreito pensamento nacional-estatal expôs com grande eloquência, diante da opinião pública europeia, aquilo que realmente é necessário: formar uma vontade política comum entre os cidadãos em relação com as transcendentais fraquezas políticas no núcleo europeu.
As negociações para se chegar a um acordo em Bruxelas travam porque ambas as partes culpam a esterilidade de suas conversas não às falhas de construção de procedimentos e instituições, mas sim à má conduta de seus membros. O acordo não está fracassando por causa de alguns bilhões a mais ou a menos, nem por causa de um ou outro imposto, mas unicamente porque os gregos exigem que a economia e a população explorada pelas elites corruptas tenham a possibilidade de voltar a funcionar através da quitação da dívida ou uma medida equivalente, como, por exemplo, uma moratória dos pagamentos vinculada ao crescimento.
Os credores, por outro lado, não cedem no empenho para que se reconheça uma montanha de dívidas que a economia grega jamais poderá saldar. É indiscutível que a quitação da dívida será irremediável, a curto ou a longo prazo. No entanto, os credores insistem no reconhecimento formal de uma carga que, de fato, é impossível de ser paga. Até pouco tempo atrás, eles mantinham inclusive a exigência, literalmente fantástica, de um superávit primário superior a 4%. É verdade que essa demanda foi baixada para 1%, que tampouco é realista. Mas, até o momento, a tentativa de se chegar a um acordo, do qual depende o destino da União Europeia, fracassou por causa da exigência dos credores de sustentar uma ficção.
Naturalmente, os países doadores têm razões políticas para sustentá-la, já que no curto prazo isso permite adiar uma decisão desagradável. Temem, por exemplo, um efeito dominó em outros países devedores. E Angela Merkel também não está segura de sua própria maioria no Bundestag. Mas não há nenhuma dúvida quanto à necessidade de rever uma política equivocada à luz de suas consequências contraproducentes. Por outro lado, também não se pode culpar apenas uma das partes pelo desastre. Não posso julgar se há uma estratégia meditada por trás das manobras táticas do Governo grego, nem o que deve ser atribuído a imposições políticas, à inexperiência ou à incompetência dos negociadores. Essas circunstâncias difíceis não permitem explicar por que o Governo grego faz com que seja difícil até mesmo para seus simpatizantes discernir um rumo em seu comportamento errático.
Não se vê nenhuma tentativa razoável de construir coalizões; não se sabe se os nacionalistas de esquerda têm uma ideia um tanto etnocêntrica da solidariedade e impulsionam a permanência na zona do euro apenas por razões de astúcia, ou se sua perspectiva vai além do Estado-nação. A exigência de quitação da dívida não basta para despertar na parte contrária a confiança de que o novo Governo vá ser diferente, de que atuará com mais energia e responsabilidade do que os Executivos clientelistas aos quais substituiu. Tsipras e o Syriza poderiam ter desenvolvido o programa reformista de um Governo de esquerda e apresentá-lo a seus parceiros de negociação em Bruxelas e Berlim.
A discutível atuação do Governo grego não ameniza nem um pouco o escândalo de que os políticos de Bruxelas e Berlim se negam a tratar seus colegas de Atenas como políticos. Embora tenham a aparência de políticos, eles só falam em sua condição econômica de credores. Essa transformação em zumbis visa a apresentar a prolongada situação de insolvência de um Estado como um caso apolítico próprio do direito civil, algo que poderia levar à apresentação de ações ante um tribunal. Dessa forma, é muito mais fácil negar uma corresponsabilidade política.
Merkel fez o Fundo Monetário Internacional (FMI) embarcar desde o início em suas duvidosas manobras de resgate. O FMI não tem competência sobre as disfunções do sistema financeiro internacional; como terapeuta, vela por sua estabilidade e, portanto, atua no interesse conjunto dos investidores, principalmente dos investidores institucionais. Como integrantes da troika, as instituições europeias também se fundem com esse ator, de tal forma que os políticos, na medida em que atuem nessa função, podem se restringir ao papel de agentes que se regem estritamente por normas e dos quais não se podem exigir responsabilidades.
Essa dissolução da política na conformidade com os mercados pode explicar a falta de vergonha com a qual os representantes do Governo federal alemão, todos eles pessoas sem mácula moral, negam sua corresponsabilidade política nas devastadoras consequências sociais que aceitaram, como líderes de opinião no Conselho Europeu, por causa da imposição de um programa neoliberal de austeridade. O escândalo dentro do escândalo é a cegueira com que o Governo alemão percebe seu papel de liderança. A Alemanha deve o impulso inicial para sua decolagem econômica, do qual ainda se alimenta hoje, à generosidade dos países credores que no Tratado de Londres, de 1954, perdoaram mais ou menos a metade de suas dívidas.
Mas não se trata de um escrúpulo moral, e sim do núcleo político: as elites políticas da Europa não podem continuar se escondendo de seus eleitores, ocultando até mesmo as alternativas ante as quais nos coloca uma união monetária politicamente incompleta. São os cidadãos, não os banqueiros, que têm de dizer a última palavra sobre as questões que afetam o destino europeu.

Investimentos da Petrobras caem em linha com preço do petróleo, mas atrasam produção

do Tijolaço , texto de Fernando Brito:


Ideal é que não ocorressem mas, com ou sem Lava-Jato, teria de haver corte no plano de investimentos da Petrobras.

Com o dinheiro mais caro no mundo – e vai ficar mais – e o agravamento da redução de seu rating pelas tais agências de classificação de risco,o crédito necessário à manutenção do ritmo seria pesadíssimo.

Mas há outras razões a ponderar, tanto para não considerar tão grande o corte como, em sentido contrário, ver que ele carrega em si notícias ruins e uma notícia tranquilizadora.

A razão de relativizar o tamanho do corte  é simples e pode ser alcançada por qualquer pessoa, sem grande esforço: uma companhia que tem petróleo e seus derivados como produto ( e lógico, receita) tem de investir em função do preço que espera receber, tal como seria com bananas ou laranjas.

Embora não represente um cálculo exato, há nisso uma proporção que nos ajuda a raciocinar.

Ano passado, quando se lançou o plano de investimentos, mesmo considerando com valor os 15 milhões em projetos não confirmados – que elevou de 206 para pouco mais de 220 bilhões de dólares o valor total, o preço do petróleo Brent era de 110 dólares por barril.

Logo, os investimentos “valiam” o mesmo que 2 bilhões de barris em cinco anos, o equivalente investir, a cada dia,  1,09 milhão de barris de petróleo.

Agora, com barril do Brent a 62 dólares, os US$ 130 bilhões previstos para investimento até 2020 equivalem a 2,1 bilhões de barris. Ou que a empresa investirá, a cada dia,  1,14 milhão de barris do óleo que produzir.

Claro que este não é o exato retrato, porque não foram considerado, nos dois cálculos, o incremento de produção, o que favoreceria mais o plano anterior do que o atual. Nem o fato de que  se espera uma alta nos preços do óleo, enquanto, no ano passado, ao contrário, estimava-se uma pequena queda de valor, que aconteceu antes e em maior escala que qualquer previsão. E, ainda, porque a receita não reproduz, com exatidão, o volume de produção.

Mas ajuda a raciocinar.

E há algo muito grave, que dá ideia do impacto criado pela paralisação do setor produtivo criada pela caça às bruxas da Operação Lava Jato.

Esperava-se um corte nas metas de produção de curto prazo, em razão do rebaixamento dos preços do petróleo, que implicariam ganhos menores com sua exportação em bruto, que se justificaria, por sua vez, como fonte de financiamento da ampliação de nosso parque de refino e da indústria petroquímica em geral.

Mas não na escala que ocorreu.

Pretendia-se dobrar a produção de petróleo no Brasil até 2020 (de 2,1 mil barris/dia para 4,2 mil).

Agora,  era certo que este número iria cair, mas menos do que  se prevê-se agora: um aumento de 40%, para 2,8  mil barris diários.

E parte expressiva desta queda deve-se à dificuldade dos fornecedores da Petrobras de entregar a tempo instalações e equipamentos.

Grosso modo, é possível dizer que a Lava Jato atrasou em mais de dois anos a exploração de petróleo no Brasil. Um prejuízo centenas ou milhares de vezes maior do que tudo o que, porventura, os ladrões da empresa possam ter desviado.

Não por falta de petróleo, e nem tanto por falta de recursos para investir, mas pela dificuldade de completar a tempo os projetos em curso e a prudente postergação de outros. Todas as áreas que deveriam entrar em produção, entrarão, mas com volume menor do que o previsto.



Esta é a boa notícia:  embora se vá adiar a operação ou mesmo vender áreas menos promissoras ou de menor rendimento da extração, a essência do potencial petrolífero brasileiro, o pré-sal, está preservada.

Do investimento da Petrobras, 83% ( US$ 108 milhões) ficarão da área de Exploração e Produção, aquela que o inesquecível Severino Cavalcanti chamava “diretoria que fura poço”. Destes, US$ 64,4 bilhões, 60%, em novos sistemas de produção no Brasil, dos quais 91% no pré-sal.

Segundo o comunicado da empresa à Comissão de Valores Mobiliários, o foco será cumprir os programas exploratórios mínimos. Ou seja, não devolver áreas.

A redução dos investimentos da Petrobras seria um argumento muito forte para os defensores de que a brasileira não tem fôlego para investir na exploração de nosso petróleo. Balela. Exijam que se divulgue o que as petroleiras estrangeiras investiram no Brasil, exceto para comprar blocos ou para pagar a parte que possuem em blocos explorados pela Petrobras – e não vão divulgar – e veremos que não dá para “tapar o buraco da cárie”.

Neste momento de baixa do petróleo, então, até obriga-las a cumprir os compromissos já assumidos será uma luta.

O negócio, agora e quase sempre, é comprar, fazer o fato consumado e garantir que o petróleo será deles.


Grécia põe na mesa a carta da democracia

Por Antonio Martins, no site Outras Palavras:
Transcrito do Blog do Miro

“A revolução não será televisionada”, lembra um documentário de enorme repercussão na década passada. Em certas ocasiões, os grandes impasses históricos desenvolvem-se diante dos nossos olhos – e o velho jornalismo tornou-se incapaz de narrá-los. Um deles começou a se desenrolar na manhã deste sábado (27/6) e vai se estender até 5 de Julho. Tem como protagonista o primeiro-ministro da Grécia, Alexis Tsipras, eleito no início do ano por um partido-movimento organizado em rede e partidário de uma nova ordem internacional.
Pressionado pelos credores do país, que querem impor redução de direitos sociais para rolar uma dívida financeira, o primeiro-ministro da Grécia, Alexis Tsipras, convocou, em pronunciamento pela TV, um plebiscito sobre a proposta. Considerou que ela equivale a um “ultimato”, uma “tentativa de humilhar o povo grego”. Disse esperar dos eleitores “um grande não”. Lembrou que passava a palavra a eles por considerar a democracia “um valor supremo da sociedade grega”.

A consulta popular, um recurso essencial da política, foi considerada um tapa na cara pelos demais governantes dos países da zona do euro – todos implicados em políticas de “austeridade”. “Estou muito desapontado”, afirmou Jeroen Dijsselbloem, o membro do Partido Trabalhista Holandês (supostamente de centro-esquerda) que preside o chamado “eurogrupo”. Ainda no sábado, reunido em Bruxelas, o órgão respondeu à convocação democrática com uma demonstração de força bruta. A proposta de Atenas, que pedia adiar a decisão sobre a rolagem da dívida por apenas sete dias – até que se conhecesse a opinião popular –, foi rechaçada.

O Banco Central Europeu (BCE) decidiu não manter as linhas de crédito automáticas que normalmente oferece aos bancos de todo o continente. A consequência imediata, todos sabiam, seria o início de uma crise bancária na Grécia – cidadãos correndo aos caixas para retirar seus depósitos, sem poder fazê-lo. Tsipras não se intimidou. Em novo pronunciamento aos gregos, anunciou um feriado bancário de sete dias (até a apuração dos votos do plebiscito). A medida tem conteúdo igualitário. No período, as retiradas de dinheiro ficarão limitadas a 60 euros por dia, seja qual for o volume depositado em cada conta bancária. Estão suspensas, além disso, as transferências de recursos ao exterior.

A ousadia de Tsipras provocou uma reviravolta. O poder econômico dos gregos é ínfimo, diante dos tecnocratas da União Europeia (UE) – mas a convocação do plebiscito é um tapa democrático sobre um tabuleiro viciado. Nesta segunda-feira, os mercados financeiros europeus abriram em meio a uma incerteza próxima do pânico. As ações estão caindo fortemente, nas bolsas de valores de Londres, Frankfurt, Paris e Amsterdam, as mais importantes do continente. As ações mais desvalorizadas são as dos maiores bancos europeus. O secretário de Finanças dos EUA, Jacob Lew, achou prudente intervir, erecomendar cautela aos governantes do “Velho Continente” empenhados em pressionar Atenas. Há semanas, ele havia advertido: ninguém sabe se o sistema financeiro internacional, ainda envolto em crise, suportará o impacto de um trauma como o de uma eventual expulsão da Grécia do euro.
Nos próximos sete dias, estará em jogo muito mais que uma disputa entre Atenas e Bruxelas. As sociedades têm o direito de construir coletivamente seu futuro? Ou devem curvar-se ao que Marx chamou, de modo sarcástico, de “as águas gélidas do cálculo econômico”? Num tempo em que a “aristocracia financeira” – nova classe global de super-ricos – parece cada vez mais forte e insensível aos velhos valores civilizatórios, será possível encontrar uma brecha em seu sistema de dominação?

*****

Ao contrário do que tentam fazer crer as manchetes dos jornais de hoje, o está em jogo na disputa entre a Grécia e seus credores muito mais que uma querela econômica e técnica. Do ponto de vista financeiro, a crise grega poderia ser resolvida sem sobressalto algum. Desde 2010, a UE emprestou à Grécia algo como 316 bilhões de dólares. As duas linhas de crédito que precisam ser renovadas nas próximas semanas – 1,8 bilhão de dólares junto ao FMI, mais 7,5 bilhões de euros ao BCE – perfazem apenas 3% deste total. Se as negociações se arrastam há cinco meses é porque está em jogo muito mais que uma ninharia percentual.

Por trás dos números, cada parte tenta validar seus projetos de longo prazo para as sociedades e sua relação com as finanças. Quando evitaram que o Tesouro grego quebrasse, há cinco anos, seus credores, reunidos na chamada troika (BCE, Fundo Monetário Internacional-FMI e Comissão Europeia-CE), impuseram, como condição, um ataque rude aos direitos sociais dos gregos, aos serviços públicos e à soberania do país sobre si mesmo. Os acordos entre as duas partes foram estabelecidos em dois documentos, conhecidos como “Memorandos” (1 2). Produziram políticas que elevaram o desemprego a quase 30% (60% entre os jovens), privatizaram em massa – de portos a redes de infraestrutura a parques públicos e sítios arqueológicos –, ampliaram a carga de impostos (tornando-a, ao mesmo tempo, mais injusta) e reduziram, até mesmo em termos nominais, o salário mínimo e as aposentadorias.

O projeto de unidade europeia construído pacientemente a partir do Tratado de Roma (1957), nas décadas de capitalismo keynesiano, implicava difundir o modelo do Estado de Bem-estar Social. Mas após a crise de 2008, a Europa reduziu-se ao continente da regressão de direitos e aumento da desigualdade O dinheiro destinado ao governo grego jamais produziu benefício coletivo algum: retornou integralmente aos bancos privados a quem o país devia. O movimento foi chamado de “austeridade” – um termo enganoso e interesseiro. Oculta o fato de que os lucros e salários dos banqueiros e demais membros da aristocracia financeira recuperaram-se e voltaram aos patamares nababescos de antes da crise – enquanto, nas ruas, multiplicam-se os sem-teto e os que se alimentam da sopa dos pobres.

A emergência do Syriza, o partido-movimento a que pertence Alexis Tsipras, desmontou a trama, ao jogar luz sobre ela. No país europeu mais atingido pelas “novas” políticas, o grupo chegou ao governo em janeiro. Embora ligados ao pensamento anti e pós-capitalista, seus membros apresentaram um programa moderado e realista, que se apoia em quatro pilares – todos de natureza social-democrata: a) enfrentar a crise humanitária; b) reativar a economia, com Justiça Fiscal; c) um Plano Nacional de Retomada do Emprego; d) Reforma Política para aprofundar a democracia. Embora contido, o projeto é claro: os eleitores gregos votaram numa proposta que exige a revisão dos “Memorandos” firmados com a troika.

Para surpresa de muitos, a oligarquia financeira recusou-se ao diálogo efetivo, mesmo diante desta proposta conciliadora. Em fevereiro, poucas semanas depois de assumir o governo, o Syriza enfrentou a primeira bateria de negociações com a troika. O resultado foi uma espécie de empate. Para postergar, por quatro meses, o vencimento de dois empréstimos, os gregos recuaram de medidas como a reversão das privatizações. Pela primeira vez em cinco anos, no entanto, a resistência de Atenas impediu que o governo fosse obrigado a anunciar novos cortes de direitos. Este fato provocou um primeiro desconforto, num cenário político europeu marcado pelo conservadorismo. Governos como os da Espanha, Portugal e Irlanda constrangeram-se diante de um desfecho que mostrou, para seus próprios eleitores, que poderia valer a pena resistir.

Em junho, quando este acordo provisório expirou e as negociações foram retomadas, a troika voltou com sangue nos olhos. Inspirando-se em medida semelhante oferecida à Alemanha, em 1953, Atenas reivindica uma redução na dívida, para que seja possível melhoras as condições de vida da população e relançar a economia. Os credores não se limitam a repelir a proposta. Exigem que o Syriza traia seu programa e se desmoralize. Não abrem mão de duas medidas emblemáticas, pela enorme repercussão política que teriam junto aos gregos: nova redução no valor nominal das aposentadorias (a terceira, em cinco anos) e aumento dos impostos indiretos – os mais injustos e os que são sentidos mais imediatamente pela população.

Desde meados de junho, o eurogrupo viu-se imerso numa bateria frenética de negociações. Além das reuniões entre chefes de Estado, os ministros de Finanças foram convocados a Bruxelas cinco vezes, nos últimos dez dias. Atenas chegou a lançar propostas aparentemente conciliadoras, para tensionar o discurso dos credores. Sugeriu, por exemplo, que o “ajuste fiscal” reivindicado pela troika poderia ser feito tributando os mais ricos. Não houve o menor sinal de recuo. No sábado, quando todas as possibilidades de negociação se esgotaram, Tsipras colocou na mesa a carta do plebiscito – aprovado pelo Parlamento em sessão de emergência, um dia depois. Agora, as propostas da troika terão de ser feitas a todo o povo grego, que se pronunciará no próximo domingo. Mas quais as condições concretas para continuar resistindo?

*****

Na era da ultra-mercantilização, nada mais eficaz, para submeter um Estado ou sociedade rebelada, que o fantasma de uma crise bancária. Em 11 de fevereiro, apenas quinze dias após a posse de Alexis Tsipras em Atenas, o Banco Central Europeu agiu conscientemente para evocar uma destas crises na Grécia. Numa decisão casuística, eledecidiu excluir o país do mecanismo de assistência automática que oferece aos bancos da eurozona, quando enfrentam dificuldades momentâneas de liquidez. Desde então, o auxílio aos bancos gregos precisa ser autorizado, caso a caso, pelos dirigentes do próprio BCE. Quem reconheceu o viés político da decisão foi a revista Economist,insuspeita de qualquer simpatia pelo Syriza: “foi um tiro de advertência disparado contra o novo governo”, admitiu ela.

Inserida na zona do euro, a Grécia abriu mão do poder de emitir moeda. E, sociedade dividida em classes, passou a sofrer, também desde a chegada do Syriza ao poder, a pressão das elites, interessadas em fazer todo o possível a mudanças no status-quo. A partir de janeiro, os bancos vivem um processo de retiradas predatórias – e cada vez mais maciças – de dinheiro, feitas pelos mais ricos. Já em fevereiro, o montante total dos depósitos havia caído para 140,5 bilhões de euros, o mais baixo em dez anos, desde a criação da moeda única europeia.

O movimento intensificou-se desde então e se converteu em bola de neve à medida em que os credores endureceram as condições para um acordo. Os saques subiram a € 300 milhões diários na semana entre 13 e 20 de junho e a € bi a cada 24 horas, desde então. No último fim de semana, antes de o governo estabelecer um limite diário equânime para as retiradas, havia longas filas diante dos caixas eletrônicos. Temeu-se pelo pior: além de não haver mais dinheiro nos bancos, surgiu o risco de faltarem recursos para pagar, na virada do mês, os aposentados e pensionistas… O New York Times não deixou de captar as possíveis consequências políticas. Na Argentina, uma crise bancária que eclodiu em janeiro de 2001 derrubou três presidentes em cinco dias. Houve quem especulasse: a União Europeia estará tramando uma mudança de regime em Atenas?

É possível, porém, que estas especulações não levem em conta outro aspecto, de sentido contrário. Caso a ruptura se consume, e impeça Atenas de saldar também seus compromissos internacionais, qual será o impacto sobre os mercados financeiros internacionais? O pensamento convencional prevê repercussão limitada. O PIB anual da Grécia, de € 242 bilhões equivale a apenas 1,34% do europeu. Os grandes bancos do Velho Continente já teriam “precificado” o risco de uma retirada grega da zona do euro (a “Greek Exit”, ou “Grexit”) – ou seja, teriam feito provisões para absorver os eventuais prejuízos.

Mas talvez valha a pena ouvir duas opiniões ilustres e divergentes. No final de maio, o secretário de Tesouro dos EUA, Jacob Lew, advertiu seus colegas do G7 sobre as consequências – a seu ver desconhecidas da possível “grexit”. “Só sabemos ao certo que estamos aumentando os riscos de um acidente [financeiro] quando deixamos de agir até que chegue o próximo prazo fatal”, disse ele. Um dia depois, Paul Krugman, Prêmio Nobel de Economia, foi além. “Mesmo no curto prazo, as salvaguardas financeiras de uma saída grega nunca foram tesstadas e poderiam perfeitamente falhar. Além disso, a Grécia, goste-se ou não, é parte da União Europeia e seus problemas iriam se esparramar pelos demais países do grupo, mesmo se a barreira financeira aguentar”, escreveu ele – que enxerga nos governantes europeus atuais a mesma tendência à alienação e cegueira política que levou à I Guerra Mundial.

*****

Indiferentes até ontem à crise grega, os velhos jornais brasileiros abrem hoje suas manchetes para ela. A descoberta do assunto é bem-vinda, mas em todos os textos sobressai uma distorção. A crise é tratada apenas em seu lado dramático. Destacam-se os limites aos saques nos bancos, as filas quilométricas, os temores dos aposentados. É como se estivéssemos diante de uma fatalidade trágica: os gregos desobedeceram os deuses, os mercados – agora, assistiremos ao castigo.

Nesta cobertura invertida, o que não se menciona, ou se subestima, é precisamente o fato novo, a notícia. Tsipras e o Syriza convocaram um plebiscito. A sociedade será ouvida, ao invés de convidada a submeter-se (como no Brasil do “ajuste fiscal”) a políticas apresentadas como tão inevitáveis como os terremotos ou as grandes secas ou os terremotos. Abriu-se, subitamente, uma brecha na ditadura financeira.

Saberemos aproveitá-la? Os próximos sete dias serão decisivos. O gesto de Tsipras agrega uma nova incógnita à equação, num mundo marcado por imensos riscos e oportunidades. E se as populações da Espanha, Portugal ou Irlanda – para não falar dos outros países europeus – exigirem também ser consultadas, sobre os programas impostos a seus países? E se o recém-fundado Banco dos BRICS oferecer a Atenas – amparando-se na imensa fartura das reservas monetárias chinesas – os recursos de que precisa para se livrar da crise? E se, no Brasil, alguém propuser um referendo sobre o “ajuste fiscal” também concebido para permitir elevação dos juros e enriquecimento ainda maior da aristocracia financeira?

Os dados estão lançados e o resultado final já não depende apenas do interesse dos mercados – mas das atitudes e posturas que tomaremos, coletiva e individualmente. Costumava-se dar a isso o nome de democracia.

O Brasil entre a desesperança e a inclusão social


Pela boca subserviente do Faustão falou a direita oligárquica. Pela boca altiva da Marieta, falou a esperança do povo brasileiro.
por Emir Sader em 29/06/2015 às 06:24
clip_image002
Poucas vezes um diálogo tão breve, transmito direto pela TV, revelou de forma tão significativa os dilemas e as interpretações contraditórias sobre o Brasil. Faustão no seu papel de propagandista do sentimento que a direita tenta impor ao país, tentou condicionar a resposta da Marieta Severo, com a palavra chave da oposição: desesperança.
A direita tem razão no sentido de que só se eles conseguirem convencer os brasileiros de que estamos mergulhados irremediavelmente – com este governo – na desesperança, é que eles podem ter alguma chance de voltar a dirigir o pais. O pior para eles desde 2012 não foi somente que os governos do PT demonstraram que o Brasil é um pais viável, que a desigualdade não é um destino inevitável, mas que os brasileiros voltaram a confiar no pais, a ter auto estima, a se orgulhar de ser brasileiros.

Nesse quadro, a direita não tem possibilidade de retornar ao governo. É preciso voltar ao clima do Collor e do FHC, de degradar a imagem do Brasil, aqui e lá fora, principalmente na cabeça dos próprios brasileiros. A mídia difunde versões diárias, do pessimismo, da desesperança, do circulo vicioso, do túnel sem fim. É o seu papel, como órgão oficial da direita, das políticas anti-populares.

O Lula é o seu inimigo privilegiado, não apenas porque nos seus governos o Brasil viveu o melhor momento da sua história recente, como também porque ele representa a auto-estima dos brasileiros, a confiança no povo brasileiro, a esperança de que o pais tem todas as condições de dar certo, de que o povo é solução e não problema – como o Lula gosta de reafirmar. Tentar destruir essa imagem é tentar destruir a auto-estima dos brasileiros, tentar dizer que tudo é igual, nada é melhor – como canta o tango Cambalache.

Marieta respondeu, altiva, com a outra visão do Brasil. O fenômeno fundamental do Brasil neste século é a inclusão social. É o Brasil dos direitos e não o da concorrência de todos contra todos no mercado.

Inclusão significa que todo ser humano tem direitos, que a democracia deve ser o regime que torne todo indivíduo um cidadão, isto é, um sujeito de direitos. Desesperança significa que a democracia não é capaz de propiciar isso para todos e que portanto o país deveria se entregar de novo nos braços do mercado, do FMI, da direita e seus porta-vozes.

Essa é a luta fundamental de hoje no Brasil – saber se o Faustão e a sua desesperança tem razão ou se continuaremos o caminho da inclusão social e a Marieta tem razão.

O jogo está aberto de novo, depois de termos trilhado um caminho seguro da inclusão social como o nosso norte durante 12 anos. O ajuste fiscal tem sido um tiro no pé do Brasil da inclusão social, tem nos levado para o pior dos mundos possíveis: recessão com exclusão de direitos, com aumento do desemprego e da inflação e com ofensiva desestabilizadora da direita.

Mesmo quem julgue que algum tipo de ajuste é necessário, ele não pode ser socialmente injusto – recair nos trabalhadores -, nem economicamente inviável – não tem levado à retomada do crescimento – e não deveria ser politicamente desastroso – tirar apoio do governo justamente quando ele é alvo de sistemático ataque desestabilizador da direita.

Deve unir a todos os que querem a retomada do caminho da inclusão social, para o que a fortalecimento do governo é condição indispensável, aos que creem que um ajuste é necessário e aos que creem que ajuste nunca é e nunca leva ao desenvolvimento - a unidade para o fortalecimento e a recuperação de iniciativa do governo. Para isso, o ajuste tem que deixar de ser a pauta central do governo, os direitos dos trabalhadores tem que ser efetivamente garantidos, deve haver a centralidade da luta pela retomada do desenvolvimento e do combate ao desemprego.

Se o governo não está conseguindo retomar a expansão econômica – e não há nenhum sintoma disso até agora – e tem sido incapaz de conter o aumento do desemprego, o caminho escolhido tem que ser corrigido. A centralidade, na hora da crise, deve ser a defesa dos direitos de todos e não o ajuste.

No embate para saber se nos tornamos o pais da desesperança ou se seguimos sendo o pais da inclusão social, está o enfrentamento maior hoje. O governo tem que reafirmar o caminho da inclusão social e combater firmemente a desesperança. Contará com o apoio indispensável dos brasileiros, fundamental quando sofre sistemático e brutal ataque desestabilizador da direita.

Pela boca subserviente do Faustão falou a direita oligárquica. Pela boca altiva da Marieta, falou a esperança do povo brasileiro.

Doações da UTC: Aécio afronta à lógica

Por Eduardo Guimarães, no Blog do Miro:
Divulgado originalmente no Blog da Cidadania. 
No último sábado (27), este Blog divulgou que o líder da oposição ao governo Dilma Rousseff, Aécio Neves, recebeu da empreiteira UTC, de Ricardo Pessoa, R$ 1,2 milhão a mais do que a adversária, a quem o tucano e a imprensa que o apoia atribuem chantagem contra esse empreiteiro para que fizesse doações eleitorais ao PT e à campanha à reeleição.

Enquanto Dilma recebeu R$ 7,5 mi da UTC, Aécio recebeu R$ 8,7 mi.

Aécio esteve em Parintins, no Amazonas, onde participou de festividade local chamada “festa do boi”. Ao embarcar de volta, o tucano deu uma declaração no mínimo espantosa ao ser inquirido pela imprensa sobre a notícia de que recebeu mais doações da UTC do que a adversária, apesar de esta estar sendo acusada de sua campanha ter coagido o dono dessa empresa a lhe fazer doações.

Segundo Aécio, pouco importam os milhões que recebeu da empreiteira porque “Tudo que tinha pra dar à UTC era alforria”, ou seja, libertação do jugo do “malvado” PT.

Antes de prosseguir pelo labirinto retórico tucano, analisemos alguns dados sobre a campanha eleitoral de 2014.

Para quem não sabe, os grupos empresariais citados na Operação Lava-Jato, juntos, fizeram doações eleitorais a partidos no valor de espantosos R$ 484,4 milhões. Isso mesmo, meio bilhão de reais.

Os partidos mais contemplados por essas doações foram PT, PSDB, PMDB e DEM (este último, de forma espantosa porque tem pouquíssima representatividade, atualmente). Entre as empresas doadoras, a UTC, que doou a esses partidos, segundo o TSE, R$ 52,7 milhões.

A tese de Aécio, é a seguinte: se a UTC não tivesse sido pressionada pelo PT, não teria feito doações ao partido. Teria doado a todos os partidos, menos ao PT. Assim, a empresa de Ricardo Pessoa diferiria de todas as outras grandes empresas que doaram ao PT e aos outros partidos citados e que não acusaram a campanha de Dilma de tê-los pressionado.

A UTC, segundo Aécio Neves, apesar de prestar serviços para vários governos tucanos, não tem interesse algum em doar a tucanos. Doa por amor – à democracia e à “social democracia” tucana.

A declaração de Aécio de que “nada tinha a dar” à UTC é espantosa. Uma afronta aos fatos, à lógica e à própria sociedade brasileira. Isso se torna mais evidente quando se analisa o fato de que empresas investigadas por cartel no Metrô de São Paulo, que vicejou durante duas décadas sob o olhar “desatento” da tucanada local, bancaram 56% da campanha de Geraldo Alckmin à reeleição.

Adivinhe, agora, leitor, quem é uma das empresas que bancaram metade dos custos da reeleição do “desinteressado” governador tucano. Se você marcou UTC, do mesmo Ricardo Pessoa, acertou na mosca.

Claro que, pela lógica safada, sem-vergonha, cara-de-pau, o PSDB nada tinha a oferecer à UTC – além, é claro, de polpudos contratos pelo país todo, nas diversas administrações estaduais e municipais que utilizam os serviços das empreiteiras. Isso sem falar que a mesma UTC tinha expectativa de que o PSDB vencesse as eleições nas Minas Gerais de Aécio.

Mas o que a “lógica” aecista contempla ainda menos, é o seguinte: se o PT tinha todo esse poder de pressão sobre a UTC, por que aceitou que a empreiteira doasse mais a Aécio do que a Dilma. E por que não exigiu, inclusive, que não doasse nada aos adversários? E mais: por que todas as outras empresas não acusam o PT de tê-las pressionado a doar?

Essa acusação de que Dilma, seu partido e sua campanha teriam extorquido o dono da UTC foi, inclusive, desmentida por ele, segundo a coluna Painel, da Folha de São Paulo. Trata-se de uma versão da imprensa sobre supostos desdobramentos da já dita Operação Vaza-Jato, da qual só se tem notícia quando surge alguma acusação ao PT.

O que está acontecendo neste país é um escândalo. Há um golpe de Estado “branco” ocorrendo em capítulos. Uma investigação sigilosa sofre vazamentos de informações seletivas o tempo todo e as autoridades que investigam não tomam providência. Mentiras são “vazadas’ e não são desmentidas.

Enquanto a esquerda caviar se masturba contra o “ajuste fiscal” – cuja necessidade nenhum economista sério ignora -, a democracia brasileira vai sendo feita em picadinho. Mais uma vez, a exemplo do que ocorreu tantas vezes na história, a esquerda fica assistindo de camarote a democracia ser estuprada enquanto se droga com dogmas e palavras de ordem.

segunda-feira, 29 de junho de 2015

Carta aberta às autoridades brasileiras

Boaventura de Sousa Santos, no Carta Maior


Senhora Presidente Dilma Rousseff,

Senhores Ministros,

Ao longo dos anos tenho acompanhado o modo como o Brasil tem vindo a visibilizar e potenciar outras formas de produzir e viver que constituem espaços de experimentação de sociabilidades alternativas e que estabelecem outra relação com a economia.

A economia solidária é uma das expressões destas outras economias e, no Brasil, vem se desenvolvendo e ganhando notoriedade graças à força política e social das iniciativas econômicas/solidárias e de seus movimentos sociais, mas também pelo avanço da política pública de economia solidária no Governo Federal.

A política pública de economia solidária no Brasil é uma das pioneiras no mundo e tem servido de referência não só para outros países do Sul - que prosperam com a experimentação de sociabilidades econômicas alternativas, mas também para países do Norte que se aproximam destas outras economias não só potencializando novas experiências, mas também visibilizando iniciativas históricas.

No entanto, sabe-se que esta política não reflete apenas uma concessão do Estado, mas sobretudo uma conquista do movimento. O nome de Paul Singer – a quem tenho muito apreço e admiração pessoais e respeito político e intelectual –, foi referendado pelo movimento para orientar a política de economia solidária a fim de conduzir uma política em constante diálogo com a sociedade e em atendimento as demandas dos movimentos sociais com quem se relaciona. Desta forma, uma possível adequação na direção política da Secretaria Nacional de Economia Solidária – com a saída de Paul Singer e equipe – comprometeria a estratégia política e relação Estado e sociedade que vem se construindo ao longo das últimas quatro gestões governamentais do Brasil.

Paul Singer é um político, um intelectual e um militante respeitado tanto no campo político como no campo acadêmico nacional e internacional. Trata-se de um homem que lutou pelas conquistas democráticas do Brasil e, espero profundamente, que ele possa continuar contribuindo, desde o Estado, para a legitimidade de outras economias possíveis.

Sendo assim, me junto ao apelo dos movimentos sociais e venho, por meio desta carta, requerer a manutenção e a ampliação desta política pública executada pela Secretaria Nacional de Economia Solidária, em parceira com o movimento popular de economia solidária e liderada por Paul Singer – nome que tem a confiança dos movimentos sociais.

Por fim, reafirmo meu compromisso político e acadêmico de visibilizar estas experiências alternativas de produzir e viver que historicamente são produzidas como invisíveis. O Projeto ALICE (www.alice.ces.uc.pt), sob minha coordenação, vem desenvolvendo diversas pesquisas sobre o tema das outras economias e o Brasil é um dos países que desperta nossa atenção tanto no que diz respeito as experiências práticas desenvolvidas pelos sujeitos coletivos (trabalhadores do campo e da cidade, indígenas, quilombolas, catadores de materiais recicláveis...), como no que diz respeito as políticas publicas realizadas pelo Estado brasileiro para este fim.

Os meus melhores cumprimentos,

Boaventura de Sousa Santos

Mestre Santayama: A OPERAÇÃO LAVA-JATO, A DEFESA NACIONAL, A CONTRA-INFORMAÇÃO E A ESPIONAGEM

Mauro Santayama, no Jornal do Brasil

Em suas críticas ao tamanho do Estado e na defesa da privatização a qualquer preço, os neoliberais tupiniquins se esforçam por defender a tese de que o poder de algumas das maiores nações do mundo “ocidental”, os EUA à frente, teria como únicos, principais esteios, o capitalismo, a livre iniciativa e o livre mercado, e defendem, sempre que podem, alegando a existência de “cabides de emprego”, e o grande número de ministérios, a diminuição do setor público no Brasil.

A informação, divulgada na semana passada, de que, com três milhões e duzentos mil funcionários, o Departamento de Defesa dos EUA é o maior empregador do mundo, tendo em sua folha de pagamento, sozinho, mais colaboradores que o governo brasileiro, com todos seus 39 ministérios, mostra como essa gente tem sido pateticamente enganada, e corrobora o fato de que a tese do enxugamento do estado, tão cantada em prosa e verso por certos meios de comunicação nacionais, não é mais, do ponto de vista da estratégia das nações, do que uma fantasia que beira a embromação.

Dificilmente vai se encontrar uma nação forte, hoje – como, aliás, quase sempre ocorreu na história – que não possua também um estado poderoso, decidida e vigorosamente presente em setores estratégicos, na economia, e na prestação de serviços à população.

Enquanto em nosso país, o número total de empregados da União, estados e municípios, somados, é de 1,5% da população, na Itália ele passa de 5%, na Alemanha, proporcionalmente, ele é de 80% a mais do que no Brasil, nos EUA, de 47% a mais e na França, também um dos países mais desenvolvidos do mundo, de 24% da população ativa, o que equivale a dizer que praticamente um a cada quatro franceses trabalha para o Setor Público.

Esses dados derrubam também a tese, tão difundida na internet, de que no Brasil se recebe pouco em serviços, comparativamente aos impostos que se  pagam. Por aqui muitos gostariam de viver como na Europa e nos Estados Unidos, mas ninguém se pergunta quantos funcionários públicos como médicos, professores, advogados, técnicos, cientistas, possuem a mais do que o estado brasileiro, os governos dos países mais desenvolvidos do mundo, para prestar esse tipo de serviços à população.

E isso, sem ter que ouvir uma saraivada de críticas a cada vez que lança um concurso, e sem ter que enfrentar campanhas quase que permanentes de defesa da precarização do trabalho e da terceirização.

Aos três milhões e duzentos mil funcionários, cerca de 1% da população norte-americana, fichados apenas no Departamento de Defesa, é preciso agregar, no esforço de fortalecimento nacional dos Estados Unidos, centenas de universidades públicas e privadas, e grandes empresas, estas, sim, privadas, ou com pequena participação estatal, que executam os principais projetos estratégicos de um país que tem o dobro da relação dívida pública-PIB do Brasil e não parece estar, historicamente, preocupado com isso.

Companhias que, quando estão correndo risco de quebra, como ocorreu na crise de 2008, recebem dezenas de bilhões de dólares e novos contratos do governo, e que possuem legalmente, em sua folha de pagamento, “lobistas”, que defendem seus interesses junto à Casa Branca e ao Congresso, que, se estivessem no Brasil, já teriam sido, neste momento, provavelmente presos como “operadores”, por mera suspeição, mesmo sem a apresentação de provas concretas.

Da estratégia de fortalecimento nacional dos principais países do mundo, principalmente os ocidentais, faz parte a tática de enfraquecimento e desestruturação do Estado em países, que, como o Brasil, eles estão determinados a continuar mantendo total ou parcialmente sob seu controle.

Como mostra o tamanho do setor público na Alemanha, na França, nos Estados Unidos – ampla e propositadamente subestimado no Brasil – por lá se sabe que, quanto mais poderoso for o Estado em um potencial concorrente, mais forte e preparado estará esse país para disputar um lugar ao sol com as nações mais importantes, em um mundo cada vez mais complexo e competitivo.

Daí porque a profusão de organizações, fundações, “conferencistas”, “analistas” “comentaristas”, direta e indiretamente pagos pelos EUA, muitos deles ligados a braços do próprio Departamento de Defesa, como a CIA, e a aliança entre esses “conferencistas”, “analistas”, “filósofos”, “especialistas”, principescos sociólogos – vide o livro “Quem pagou a conta? A CIA na Guerra Fria da Cultura”, da jornalista inglesa Frances Stonor Saunders – etc, com a imprensa conservadora de muitos países do mundo, e mais especialmente da América Latina, na monolítica e apaixonada defesa do “estado mínimo”, praticada como recurso para o discurso político, mas também por pilantras a serviço de interesses externos, e por ignorantes e inocentes úteis.

Em matéria de capa para a Revista Rolling Stone, no final da década de 1970, Carl Bernstein, o famoso repórter do Washington Post, responsável pela divulgação e cobertura do Caso Watergate, que derrubou o Presidente Richard Nixon, mostrou, apresentando os principais nomes, como centenas de jornalistas norte-americanos foram recrutados pela CIA, durante anos, a fim de agir no exterior como espiões, na coleta de informações, ou para produzir e publicar matérias de interesse do governo dos Estados Unidos.

Muitos deles estavam ligados a grandes companhias, jornais e agências internacionais, como a Time Life, a CBS, a NBC, a UPI, a Reuters, a Associated Press, a Hearst Newspapers, e a publicações como o New York Times, a Newsweek e o Miami Herald, marcas que em muitos casos estão presentes diretamente no Brasil, por meio de tv a cabo, ou têm seu conteúdo amplamente reproduzido, quando não incensado e reverenciado, por alguns dos maiores grupos de comunicação nacionais.

Assim como a CIA influenciou e continua influenciando a imprensa norte-americana dentro e fora do território dos Estados Unidos, ela, como outras organizações oficiais e paraoficiais norte-americanas, também treina, orienta e subsidia centenas de veículos, universidades, estudantes, repórteres, em todo o mundo, em um programa que vem desde antes da Guerra Fria, e que nunca foi oficialmente interrompido.

O próprio Departamento de Defesa, o Departamento de Estado, a Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional, USAID, o Fundo Nacional para a Democracia, NED, o Conselho Superior de Radiodifusão, BBG, e o Instituto dos EUA para a Paz, USIP, bancam atividades de “desenvolvimento de meios” em mais de 70 países, em programas que mantêm centenas de fundações, ONGs estrangeiras, jornalistas, meios de informação, institutos de “melhoramento” profissional, e escolas de jornalismo, com um investimento anual que pode chegar a bilhões de dólares.

Além deles, são usados, pelo Departamento de Estado, o Bureau de Assuntos Educacionais e Culturais, (Bureau of Educational and Cultural Affairs, BECA), o Bureau de Inteligência e Investigação, (Bureau of Intelligence and Research, INR) e o Bureau de Democracia, Direitos Humanos e Trabalho (Bureau of Democracy, Human Rights, and Labor, DRL), que apenas no ano de 2006 organizou, na Bolívia, por exemplo, 15 diferentes “oficinas” sobre “liberdade de imprensa e expressão”, além do Escritório de Diplomacia e Assuntos Públicos (Office of Public Diplomacy and Public Affaires, OPDPA).

“O que nós estamos ensinando – explica Paul Koscak, porta-voz da USAID – é a mecânica do jornalismo, na imprensa escrita, no rádio ou na televisão. Como fazer uma história, como escrever de forma equilibrada … tudo o que se espera de um verdadeiro profissional de imprensa.”

Isabel MacDonald, diretora de comunicação da Fairness And Accuracy in Reporting (FAIR) – Imparcialidade e Transparência na Informação – um observatório de meios de comunicação de Nova Iorque sem fins lucrativos, não tem, no entanto, a mesma opinião.

Para ela, “esse tipo de operação do governo norte-americano, a despeito de sua alegada defesa das normas da objetividade, trabalha, na verdade, contra a democracia, apoiando a dissensão sufocante, e divulgando informações deliberadamente falsas que são úteis para os objetivos da política exterior dos Estados Unidos.’

Um exemplo clásssico desse tipo de resultado, quanto aos objetivos norte-americanos, foi o envolvimento de Washington, denunciado pela comissão legislativa Church-Pike, no Congresso dos EUA, com o financiamento a jornais de oposição na América Latina, como o grupo “El Mercúrio” do Chile, por exemplo, na conspiração que levou ao golpe militar contra o presidente eleito de orientação nacionalista Salvador Allende, em 1973.

Em abril de 2015, a Associação dos Jornalistas Chilenos decidiu expulsar de seus quadros o dono do Grupo El Mercúrio, Agustín Edwards Eastman, de 87 anos, por violação do código de ética, depois que documentos oficiais revelados nos Estados Unidos mostraram, em 2014, que ele havia recebido dinheiro da CIA para publicar informações falsas contra o governo chileno.

A diferença entre os Estados Unidos, que se dizem “liberais” e “privatistas”, e na verdade não o são, e o Brasil, que cede a todo tipo de pressão, na tentativa de provar, todos os dias, que não é comunista nem estatizante, é que, mesmo quando envolvidas com corrupção – considerada uma espécie de “dano colateral” que deve ser “contornado” e “absorvido”, no contexto do objetivo maior, de permanente fortalecimento do complexo-industrial militar dos EUA – a existência das principais empresas de defesa norte-americanas nunca é colocada em risco.

Apenas como exemplo, a Lockheed Martin, uma das principais companhias de aviação e de defesa dos EUA, pagou, como lembrou André Motta Araújo no Jornal GGN outro dia, entre as décadas de 1950 e 1970, mais de 300 milhões de dólares, ou 3.7 bilhões de dólares em dinheiro de hoje, de propina para autoridades estrangeiras, entre elas – para quem acha que isso só acontece em paises “sub-desenvolvidos” – o então Ministro da Defesa da Alemanha Ocidental, Franz Joseph Strauss, os ministros Luigi Gul, e Maria Tanassi, o Primeiro-Ministro Mariano Rumor e o Presidente da República Italiana, Giovanni Leone, o general Minoru Genda e o Primeiro-Ministro japonês Kakuei Tanaka, e até o príncipe Bernhard, marido da Rainha Juliana, da Holanda.

E alguém acha que a Lockheed foi destruída por isso ? Como também informa Motta Araújo, seus principais dirigentes renunciaram alguns anos depois, e o governo norte-americano, no lugar de multar a empresa, lhe fez generoso empréstimo para que ela fizesse frente, em melhores condições, aos eventuais efeitos do escândalo sobre os seus negócios.

A Lockheed, conclui André Motta Araújo em seu texto, vale hoje 68 bilhões de dólares, e continua trabalhando normalmente, atendendo a enormes contratos, com o poderoso setor de defesa norte-americano.

Enquanto isso, no Brasil, os dirigentes de nossas principais empresas nacionais de defesa, constituídas, nesses termos, segundo a Estratégia Nacional de Defesa, em 2006, para, com sede no Brasil e capital votante majoritariamente nacional, fazer frente à crescente, quase total desnacionalização da indústria bélica, e gerir alguns dos mais importantes programas militares da história nacional, que incluem novos mísseis ar-ar, satélites e submarinos, entre eles nosso primeiro submersível atômico, encontram-se, quase todos, na cadeia.

O Grupo Odebrecht, o Grupo Andrade Gutierrez, o OAS e o Queiroz Galvão têm, todos, relevante participação na indústria bélica e são os mais importantes agentes empresariais brasileiros da Estratégia Nacional de Defesa. Essas empresas entraram para o setor há alguns anos, não por ter algum privilégio no governo, mas simplesmente porque se encontravam, assim como a Mendes Júnior, entre os maiores grupos de engenharia do Brasil, ao qual têm prestado relevantes serviços, desde a época do regime militar e até mesmo antes, não apenas para a União, mas também para estados e municípios, muitos deles governados pela oposição, a quem também doaram e doam recursos para campanhas políticas de partidos e candidatos.

Responsáveis por dezenas de milhares de empregos no Brasil e no exterior, muitos desses grupos já estão enfrentando, depois do início da Operação Lava-Jato, gravíssimos problemas de mercado, tendo tido, para gaúdio de seus concorrentes externos, suas notas rebaixadas por agências internacionais de crédito.

Projetos gigantescos, tocados por essas empresas no exterior, sem financiamento do BNDES, mas com financiamento de bancos internacionais que sempre confiaram nelas, como o gasoduto do Perú, por exemplo, de quase 5 bilhões de dólares, ou a linha 2 do metrô do Panamá, que poderiam gerar centenas de milhões de dólares em exportação de produtos e serviços pelo Brasil, correm risco de ser suspensos, sem falar nas numerosas obras que estão sendo tocadas dentro do país.

Prisões provocadas, em alguns casos, por declarações de bandidos, que podem ser tão mentirosas quanto interesseiras ou manipuladas, que por sua vez, são usadas para justificar o uso do Domínio do Fato – cuja utilização como é feita no Brasil já foi criticada jurídica e moralmente pelo seu criador, o jurista alemão Claus Roxin – às quais se somam a mera multiplicação aritmética de supostos desvios, pelo número de contratos, sem nenhuma investigação, caso a caso, que os comprove, inequivocamente, e por suposições subjetivas, pseudo-premonitórias, a propósito da possível participação dessas empresas em um pacote de concessão de projetos de infra-estrutura que ainda está sendo planejado e não começou, de fato, sequer a ser oficialmente oficialmente estruturado.

O caso Lockheed, o caso Siemens, e mais recentemente, o do HSBC, em que o governo suiço multou esse banco com uma quantia mínima frente à proporção do escândalo que o envolve, nos mostram que a aplicação da justiça, lá fora, não se faz a ferro e fogo, e que ela exige bom senso para não errar na dose, matando o paciente junto com a doença.

Mais uma vez, é necessário lembrar, é preciso combater a corrupção, mas sem arrebentar com a Nação, e com alguns dos principais pilares que sustentam nossa estratégia de desenvolvimento nacional e de projeção nos mercados internacionais.
No futuro, quando se observar a história do Brasil deste período, ao tremendo prejuízo econômico gerado por determinados aspectos da Operação Lava-Jato,  mutíssimo maior que o dinheiro efetivamente, comprovadamente, desviado da Petrobras até agora, terá de ser somado incalculável prejuízo estratégico para a defesa do país e para a nossa indústria bélica, que, assim como a indústria naval, se encontrava a duras penas em processo de soerguimento, depois de décadas de estagnação e descalabro.

No Exército, na Marinha, na Força Aérea, muitos oficiais – principalmente aqueles ligados a projetos que estão em andamento, na área de blindados, fuzis de assalto, aviação, radares, navios, satélites, caças, mísseis, submarinos, com bilhões de reais investidos – já se perguntam o que irá acontecer com a Estratégia Nacional de Defesa, caso as empresas que representam o Brasil nas joint-ventures empresariais e tecnológicas existentes vierem a quebrar ou a deixar de existir.

Vamos fazer uma estatal para a fabricação de armamento, que herde suas participações, hipótese que certamente seria destroçada por violenta campanha antinacional, levada a cabo pelos privatistas e entreguistas de sempre, com o apoio da imprensa estrangeira e de seus simpatizantes locais, com a desculpa de que não se pode “inchar”” ainda mais um estado que na verdade está sub-dimensionado para as necessidades e os desafios brasileiros?

Ou vamos simplesmente entregar essas empresas, de mão beijada, aos sócios estrangeiros, com a justificativa de que os projetos não podem ser interrompidos, perdendo o controle e o direito de decidir sobre nossos programas de defesa, em mais um capítulo de vergonhoso recuo e criminosa capitulação ?

Com a palavra, o STF, o Ministério da Defesa, e a consciência da Nação, incluindo a dos patriotas que militam, discreta e judiciosamente, de forma serena, honrosa e equilibrada, no Judiciário e no Ministério Público.