*José Álvaro de Lima Cardoso.
O Brasil é o país que mais gasta com juros
no mundo. Tanto os juros incidentes sobre os títulos da dívida pública (a taxa
Selic, de 13,75%) como os juros pagos pela sociedade em geral nas operações de
crédito (empréstimos, cheque especial, cartão de crédito etc.) que são, de
longe, os mais altos do mundo. Nos crediários, encontramos, por
exemplo, juros médios para eletrodomésticos acima de 100%, muitas vezes
apresentados ao consumidor como sendo crediário “sem juros”. O equivalente em
redes comerciais dos países europeus e nos EUA fica em 10% disso.
No Brasil normalmente o
estabelecimento comercial está interessado não apenas em vender a mercadoria para
o cliente, mas também um produto financeiro, ou seja, quer fazer também um
empréstimo, faturando os elevados juros em cima da transação. Prova disso é que
se cliente propõe pagar à vista, obtendo em troca um desconto, é muito comum é
o comerciante rejeitar a proposta. Como os juros estão embutidos no produto o
comerciante quer faturar com a venda do bem, e com o correspondente financiamento
envolvido na transação.
Nas várias modalidades de
crédito ao consumidor, incluindo aqui o uso do cartão de crédito, o que
prevalece é o abuso contra o consumidor. Por isso não é de estranhar que a taxa
de comprometimento da renda familiar com o pagamento de dívidas, subiu de
19,3%, em março de 2005, para 46,5% em abril último (dados do Banco Central). Neste contexto, não dá para estranhar que enquanto a economia
brasileira patina, o lucro líquido dos bancos no primeiro trimestre de
2015, (lucro somado das maiores instituições financeiras em ativos totais
- Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander) alcançou R$ 14,7
bilhões, alta de 24,2% em doze meses.
O fato do
setor financeiro apresentar lucros tão elevados, num momento em que a economia
brasileira está estagnada, revela que há um descolamento do setor financeiro em
relação ao ciclo produtivo do país. Ao invés dos bancos estarem
disponibilizando crédito para financiar a indústria, serviços e comércio (o que
deveria ser uma vocação natural do setor), estão completamente absorvido em
faturar com juros aviltantes, inclusive no financiamento da dívida pública
federal (mais de 90% da fortuna gasta com a dívida pública são
endereçados ao sistema financeiro). É a situação curiosa de uma economia travada pelo lado da demanda, do
investimento empresarial e do investimento público, com o PIB praticamente
parado, mas lucros líquidos declarados dos bancos de 24% em um ano. E o pior é
que nos acostumamos a isso.
Em
função do grande poder econômico e político que os bancos detêm e da
consequente enorme influência sobre a opinião pública, praticamente não se fala
nos lucros do setor, ligado fundamentalmente aos ganhos dos rentistas, do que
propriamente à disponibilização e intermediação do crédito, que deveria ser o
papel e a vocação dos bancos. O fato é que não existe justificativa técnica, econômica, política ou moral para a
cobrança de taxas tão elevadas, que prejudicam toda a sociedade e o próprio
país. Os juros extorsivos esterilizam grande quantidade de recursos que
deveriam estar circulando na economia produtiva, pagando melhores salários e
viabilizando serviços sociais que garantiriam vida digna para as pessoas.
A justificativa que tem sido dada para
a manutenção das maiores taxas de juros do planeta é o “combate à inflação”. Os
juros altos serviriam para esfriar a demanda, o que reduziria a margem de
manobra da indústria e do comércio aumentarem seus preços. Só que no caso do
Brasil absolutamente esse diagnóstico não se aplica. O tipo de inflação que
temos no Brasil decorre da oligopolização do comércio, da indexação de boa
parte dos preços, dos aumentos cíclicos de alimentos (decorrência, por exemplo,
da maior seca vivida pelo país nos últimos 80 anos), do preço abusivo das
tarifas, etc. A tese de que se irá controlar a inflação com juros
estratosféricos não tem base técnica. É muito mais uma construção
político ideológica, que visa exclusivamente manter os privilégios de uma casta
rentista, com visíveis prejuízos aos país.
*Economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa
Catarina.
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