*José Álvaro de Lima Cardoso
Cálculos do economista Amir Khair,
especialista em contas públicas, dão conta que apenas no primeiro trimestre,
enquanto o governo poupava R$ 18 bilhões retirando direitos trabalhistas e
previdenciários para aumentar o superávit primário (conhecido também como bolsa
banqueiro), os gastos com juros bateram nos R$ 85 bilhões. Mesmo assim, a
dívida pública bruta aumentou em R$ 227,8 bilhões, apenas nos primeiros três
meses do ano. Sabe-se que mais de 90% da dinheirama entregue por conta da
dívida pública são destinados ao sistema financeiro: bancos nacionais e
estrangeiros, investidores estrangeiros, seguradoras, fundos de investimento e
fundos de pensão.
O déficit nominal do setor público (resultado do balanço entre as
receitas totais e as despesas totais), neste ano alcançará 6,4% do PIB.
Com ajuste fiscal e tudo. Mas não são os salários do funcionalismo público federal
(estacionados em pouco mais de 4% do PIB) ou os gastos com os programas sociais
que levarão a este resultado, e sim os gastos com a dívida pública, turbinados
pelos seguidos aumentos da taxa básica de juros, a Selic. É fato conhecido que, a cada
ponto percentual de aumento da taxa Selic, o gasto com a rolagem da dívida
aumenta em cerca de R$ 20 bilhões.
Há
um evidente conflito entre o gerenciamento do chamado Sistema da Dívida, que
transfere recursos fundamentais da sociedade para um grupo restrito de
privilegiados, e os direitos da sociedade. Ao invés de financiar serviços
públicos essenciais ou investir no combate à pobreza, bilhões de reais são
destinados e pagar os serviços da dívida, servindo uma minoria parasitária, que
não produz nada, a rigor. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), por
exemplo, tem importância estratégica para o país, pois viabiliza a construção
de rodovias, ferrovias, aeroportos, portos, hidrovias, habitação, equipamentos
e obras para a defesa nacional, etc. Obras que servirão ao povo do País, por um
século, talvez mais. O orçamento do PAC para 2015, é de R$ 64,9 bilhões, o que
representa uma fração do gasto com a dívida pública nos últimos 12 meses, cerca de R$ 377 bilhões, (6,7% do PIB).
O serviço da dívida pública, endereçada a cerca de 20.000 famílias de
rentistas, custou, apenas nos últimos 12 meses, o equivalente a quase seis
vezes o orçamento do PAC, encarregado de obras estratégicas para o país.
A ponte Anita Garibaldi, inaugurada recentemente
na BR-101, em Santa Catarina, é outro exemplo. A estrutura, que deverá servir à
população de toda a Região Sul por quase um século, ou mais, custou R$
777 milhões, equivalente a 0,2% dos juros gastos em 12 meses com a dívida
pública. Outro Programa, o gigantesco Minha Casa Vida
Minha vem resolvendo, com razoável sucesso, o crônico e estrutural problema do
déficit habitacional no país. Em março deste ano, chegou à marca de 3,8 milhões
de unidades. Desse total, as famílias beneficiadas já receberam 2,1 milhões de
moradias. Mais 1,6 milhão de casas e apartamentos foram contratados para
entrega nos próximos meses e anos. Pois, para um dos maiores programas
habitacionais do mundo, desde o início, em 2009, foram liberados R$ 139,6
bilhões em financiamentos dos bancos (principalmente da Caixa Econômica Federal).
O governo ainda investiu no Programa, R$ 114,9 bilhões, subsidiando famílias de
menor renda. Se somarmos os dois tipos de financiamentos, eles não totalizam 1%
do PIB por ano, desde 2009, enquanto com a dívida pública se transfere entre 6
e 7,5% do PIB para os rentistas, a cada ano. Por isso um ajuste fiscal que apenas
corte gastos primários, sem considerar os gastos com a dívida pública, não tem
como dar certo do ponto de vista do País.
*Economista e supervisor técnico do
DIEESE em Santa Catarina.
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