domingo, 12 de fevereiro de 2017

Não há um fiapo de nobreza, ou compromisso com o Brasil, na destruição da Seguridade Social.




                                                                                                  *José Álvaro de Lima Cardoso.
        Segundo os jornais, em 2016, 519.000 famílias retornaram ao Bolsa Família em decorrência da crise, depois de terem deixado o programa nos anos anteriores, por terem se encaixado no mercado de trabalho (a taxa de desemprego médio de 2014 foi a menor das séries históricas dos institutos de pesquisas). Em média, em 2015, 105 mil famílias buscavam o Bolsa Família mensalmente, e em 2016, a média mensal subiu para 141 mil. Esse número de famílias que precisou retornar ao Programa, representa algo em torno de dois milhões de brasileiros.
        Para alguns economistas, o aumento da pobreza e a queda do salário real, que vem se verificando, pelo menos desde 2014, é positivo, porque reduz a demanda e ajuda a colocar a inflação no centro da meta. No debate ocorrido nas eleições de 2014 economistas conhecidos defendiam abertamente a queda dos salários e o desmonte da Seguridade Social. Naquele período, o economista Armínio Fraga, eventual ministro da fazenda caso seu candidato ganhasse, afirmava abertamente que não apenas o salário mínimo, mas os salários em geral, tinham crescido muito ao longo dos anos. Segundo Fraga, seria necessário tomar medidas impopulares já desde o primeiro dia de governo, porque as pessoas precisavam “cair na real”.
        Bem, no momento não faltam medidas que, mais cedo ou mais tarde, irão fazer as pessoas caírem na real. Só para descrever uma das maldades, que será a nossa maior batalha, talvez, neste ano, a PEC 287, que trata da Previdência Social: no conjunto de medidas ela visa dificultar o acesso à assistência social (elevando a idade de 65 para 70 anos) e estabelece critérios para diminuir o valor. A rede de assistência social é vital para a sobrevivência de milhões de idosos e deficientes pobres. É uma conquista grandiosa da sociedade brasileira. A capilaridade da Assistência Social do governo federal, presente hoje em quase 99% dos municípios brasileiros, é uma conquista decorrente de um século de lutas. Cerca de 4,5 milhões de pessoas, em função dos Benefícios de Prestação Continuada (BPC) recebem um salário mínimo por mês, o que lhes garante a sobrevivência e a dignidade. Os BPC são estratégicos, inclusive, para o Brasil ter saído do Mapa da Fome em 2014. Como mostram estudos, sem a Seguridade (Previdência e Assistência, no caso), 70% dos idosos estariam em condições de extrema pobreza no Brasil. Se hoje não se observa idosos pedindo esmolas é graças ao sistema de assistência social.
        Para os formuladores da PEC 287 o problema fiscal brasileiro decorre do aumento acelerado da despesa pública primária, ou seja, dos gastos sociais, de saúde, educação, funcionalismo, etc. Enfim, os gastos que são realizados para atender o povo. A Emenda da Morte, 95 (PEC 55), que já está em vigor, restringe o acesso da população pobre aos serviços públicos de educação, saúde, saneamento básico e, inclusive, bens como alimentação. A PEC da previdência, por meios distintos, implicará no mesmo resultado.
        Aqueles que pretendem destruir a Seguridade Social no Brasil, e que consideram os idosos e deficientes pobres um estorvo à eficiência dos mercados, não dizem uma linha sobre pagamento de juros da dívida pública. Enquanto o "déficit" anunciado da Previdência pelo governo é de 149,7 bilhões de reais (feito através de um cálculo propositalmente equivocado), o governo entrega aos rentistas (cerca de 10 mil famílias) algo em torno de 8% do PIB. As contas públicas não estão fechando, não pela Previdência Social, mas em função do gasto com a dívida pública. Que aliás, não resistiria a uma auditoria, como determina a nossa Constituição Federal desde a sua promulgação em 1988.
         Os defensores da destruição da Seguridade Social, não mencionam a política de desoneração da folha de pagamento das empresas, opção adotada desde o governo anterior no combate aos primeiros sinais da crise econômica, e que é um dos fatores da deterioração das contas do Seguridade Social. Também não falam sobre a sonegação que, somente, em 2016, somaram perdas de R$ 60 bilhões. Segundo informações da ONU, a evasão total de divisas e a sonegação fiscal de empresas brasileiras chegam a 27% do total que o setor privado deveria pagar em impostos no Brasil, equivalente a cerca de R$ 500 bilhões. Somente a sonegação de impostos no Brasil chega a R$ 500 bilhões e a dívida total das empresas com a previdência, até 2015, era de R$ 374 bilhões. As renúncias fiscais da previdência social, somente nos últimos seis anos, totalizaram R$ 270 bilhões.
        No Brasil, segundo a ONG britânica Oxfam, os seis homens mais ricos detêm uma fortuna equivalente ao patrimônio de metade da população mais pobre do país, cerca de 100 milhões de pessoas. Esses seis empresários detêm, juntos, cerca de US$ 79,4 bilhões (aproximadamente R$ 258 bilhões). Em meio a mais grave recessão da história do país, a proposta de reforma da previdência ataca direitos dos mais pobres, idosos, crianças, trabalhadores rurais, deficientes. Mas não se iludam: não há nenhuma nobreza nisso ou interesse de preservar a Seguridade Social, como alegam. Há apenas o interesse de garantir a defesa os interesses dos ricos, destruindo direitos e liquidando o pouco que temos de Estado do bem-estar social no Brasil. Pelo contrário, um dos objetivos ocultos da PEC, que não pode ser mencionado, é o de abrir mercados para os planos privados de previdência (como estão fazendo com a Saúde).
              
                                                                                                        *Economista.

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