segunda-feira, 8 de maio de 2017

As tropas do Departamento de Justiça dos EUA, por André Araújo





Por André Araújo
 
Não é preciso mais Marines para invadir e ocupar países emergentes. Os EUA descobriram um método muito mais barato de imperialismo, que atende pelo nome de Acordos de Cooperação Judiciária, onde o lado MAIS FORTE comanda os outros pela lógica de quem tem o poder real manda em que tem apenas um poder formal. Um acordo entre países absolutamente desiguais jamais seria um acordo equilibrado, a balança vai sempre pender para a parte contratante mais forte.
Os EUA aplicam multas de US$ 2,6 bilhões ao Credit Suisse, US$900 milhões ao UBS Union des Banques Suisses, US$ 14 bilhões ao Deutsche Bank, US$ 230 milhões à Embraer, US$2,6 bilhões à Odebrecht, fecharam o banco suíço bicentenário Wegelin & Cie., prenderam o brasileiro José Maria Marin na Suíça, tudo com base nos Acordos de Cooperação Judiciária, MAS alguém ouviu falar de um País aplicar multas a empresas americanas nos EUA e prender americanos dentro dos EUA?
Claro que não, os Acordos são a FAVOR dos EUA e contra outros países. A Chevron vazou óleo nas águas brasileiras da bacia de Campos? O governo do Brasil pensou em processar a Chevron NOS EUA? Jamais se atreveria a pedir a cooperação do Departamento de Justiça para tal atrevimento, mas o Brasil ofereceu servilmente entregar a Petrobras e a Odebrecht ao Departamento de Justiça, para lá serem processadas e multadas e, no caminho, terem que contratar caríssimos advogados americanos, depois disso o Departamento de Justiça indica fiscais americanos (“Monitors”) para ficarem DENTRO da Petrobras e da Odebrecht por 10 anos, controlando todos os contratos, obras, investimentos para ver se as empresas atendem aos padrões americanos de COMPLIANCE.
Parece um delírio? Não, é a PURA REALIDADE que está acontecendo agora.
Nessas duas empresas, os fiscais (“Monitors”) já estão no Brasil dentro das empresas, também estão na EMBRAER acompanhando todo seu programa de venda de aviões. E quem paga esses fiscais, seus honorários e manutenção? Ora, que pergunta, somos nós, os brasileiros, NÓS pagamos tudo, as multas, os advogados, os fiscais e ainda ficamos contentes com o privilégio de sustentar esse circo de horrores. E, atenção, os honorários dos fiscais são ALTÍSSIMOS.
O pior não é o fato, o pior são funcionários do governo brasileiro acharem isso normal a até prazeroso, batem palmas em homenagem aos senhores americanos de quem também recebem “homenagens” orgulhosamente noticiadas por nossa imprensa servil e ignorante.
Ninguém, nem as autoridades brasileiras e muito menos a imprensa ignorante, vê a aberração da AFRONTA A NOSSA SOBERANIA, somos tratados abaixo do Haiti e acham isso ótimo.
A nossa mídia idiota noticia com orgulho que somos cumprimentados pelas autoridades de outros países como EXEMPLO de combate à corrupção, nos automutilamos e ficamos felizes.
Os Acordos de Cooperação Judiciária são para os EUA agirem contra e em outros Países, NÃO é para outros Países agirem dentro e contra os EUA, deu para entender?
Se existe uma cláusula histórica nos EUA é essa, eles NÃO ACEITAREM, EM HIPÓTESE ALGUMA, jurisdição estrangeira em seus assuntos e sobre seus nacionais, todos os Tratados onde os EUA são parte destacam como CLÁUSULA PÉTREA que cidadãos americanos NÃO SE SUBMETEM À JURISDIÇÃO ESTRANGEIRA, nunca e em nenhuma hipótese.
Então os Acordos são um INSTRUMENTO de intervenção do Governo dos EUA dentro de outros países, atingindo suas empresas e cidadãos, MAS não é para esses Países se imiscuirem nos EUA contra suas empresas e cidadãos, é preciso que isso fique bem claro.
Não é preciso desembarcar tropas nem tanques, os procuradores de cada País funcionam como prepostos do controle sobre empresas que estão se lançando nos mercados externos concorrendo com as americanas e em outro patamar vetam ou prendem políticos que não estão no figurino de colaboração com os EUA, portanto esses Acordos que nascem de uma boa intenção servem para o poder geopolítico dos EUA, foram desenhados para isso.
OS EUA são campeões mundiais na ciência e aplicação de instrumentos de poder A REBOQUE DE BOAS CAUSAS. Ninguém é a favor da corrupção, da lavagem de dinheiro e do terrorismo, MAS essas boas causas podem também ser usadas como cobertura para projeção de poder dos EUA sobre o mundo. Os americanos são PERITOS nisso, é o “faz de conta” que fez Hollywood ser a meca do cinema e a Disneyworld ser o mundo da fantasia encantada.
A montagem de cenários de “make believe”, faz de conta, é uma invenção americana.
Logo depois do fim da Primeira Guerra Mundial, a antiga Rússia Imperial transformada em União Soviética conheceu um período de FOME pavoroso, porque, com a Grande Guerra, os campos deixaram de ser cultivados e os estragos da guerra provocaram uma completa escassez de alimentos até a agricultura ser reconstituída sobre a terra arrasada.
O futuro presidente Herbert Hoover, ao fim da Grande Guerra e morando em Londres, era um rico engenheiro de minas, coordenou uma comissão para ajuda à Bélgica e norte da França, levando alimentos a essa área especialmente devastada pela ocupação alemã. A chamada Comissão Hoover para Socorro à Bélgica se transformou em grande ampliação em um ente oficial, a Comissão Americana de Socorro (American Relief Commission), já com dinheiro público, mandou alimentos aos hospitais de São Petersburgo, e em um novo programa, ofereceu ajuda à União Soviética para suprir o País de alimentos, visando atravessar o período negro da fome nas cidades. Foi uma oferta generosa, Lenin agradeceu mas ao ver as “condições” da Comissão recusou o auxílio. Porque? As “condições” significariam entregar o domínio de vasto território da Rússia europeia, incluindo São Petersburgo e Moscou, ao “controle” da Comissão Americana de Socorro, quer dizer, eles entregavam alimentos mas controlariam todo o transporte, a logística, a rede ferroviária, a forma de distribuição e armazenamento, o sistema de cadernetas de entrega para cada família, os pontos de entrega da farinha, a propaganda implícita nos anúncios de distribuição.
Lenin educadamente recusou a proposta de ajuda, porque viu que por trás da filantropia havia um mecanismo de governo paralelo do território através da doação de alimentos.
A narrativa está detalhadamente contada no livro A RÚSSIA E O OCIDENTE, de George Kennan, o diplomata mais importante dos EUA no Século XX, Embaixador em Moscou na década de 50 e chefe do planejamento estratégico do Departamento de Estado. Esse livro existe em português (Editora Forense) e sugiro a leitura, também em português, da primeira parte das memórias de Kennan, em dois volumes, 1915-1950, editora Top Books, publicado no Brasil entre outras razões por minha sugestão. Vê-se então que já naquela longínqua época os EUA usavam a capa das CAUSAS NOBRES para mascarar ações geopolíticas de primeira grandeza.
Hoje essas CAUSAS NOBRES se escondem atrás dos Acordos de Cooperação Judiciária, que permitem ao Departamento de Justiça INTERVIR dentro de Países como se os EUA fosse um poder soberano universal, sempre em nome de boas causas, combate ao tráfico de drogas, ao terrorismo, à lavagem de dinheiro, à corrupção, todas são bons disfarces para a intervenção descarada e muito bem aceita por seus parceiros locais, que se julgam honrados em tal papel.
Mas porque os Países aceitam esses Acordos? Em grande parte por IGNOR NCIA das reais intenções dos EUA, por subserviência, por vontade de agradar, por falta de percepção intelectual. O General De Gaulle, por exemplo, sempre astuto e com sexto sentido, jamais confiou nos americanos e nunca quis saber de seus programas de “cooperação” porque percebia a mão do gato por trás desses acordos aparentemente a favor de boas causas.
A ação do Departamento de Justiça é altamente seletiva e tem pontaria geopolítica.
Quando o País alvo colabora e se submete voluntariamente aos EUA o Departamento de Justiça não precisa gastar esforços, queimar energia e mão de obra, o território “já está na rede”, a cooperação “está´no papo”, já é território conquistado.
O Brasil como ESTADO NACIONAL tinha obtido extraordinária projeção de poder na América Latina e na África através de suas empreiteiras e marqueteiros políticos, operando e influenciando governos que se ligavam dessa forma ao Brasil. Era um esquema azeitado e operacional, conjugando obras e verbas para campanhas políticas, Talleyrand não faria melhor, o Brasil usando todas as armas para se posicionar no jogo do poder, o dinheiro era uma dessas armas, assim como a capacidade de infiltração nas esferas de poder de países emergentes, tudo dentro do figurino de grandes potências, que usam as mesmas armas há séculos.
Entra então o moralismo e DESTRÓI todo o esquema vitorioso, expulsando o Brasil desses países onde o nosso bom mocismo também desgraçou políticos locais amigos do Brasil e que nos foram benéficos em obras e projeção política. O Brasil foi varrido como potência influente em mais de 15 países para que nosso moralismo fosse glorificado no Departamento de Justiça, a custa dos interesses financeiros e políticos do Estado brasileiro. E ainda nossa mídia acha isso bonito, reparando depois que o Brasil “está em crise”. Quebram a locomotiva e depois se queixam que o trem não anda, não tem QI para ver que uma coisa tem ligação com outra ,as empreiteiras brasileiras abrem negócios para o Brasil em continuidade de sua presença.
Só um país completamente desmiolado joga fora o trabalho de décadas em nome da implantação da moralidade franciscana, mas aonde pensam que estão? Em que mundo?
Ora, o Brasil vai tornar Angola e Peru livres de corrupção, purificamos esses países ímpios porque nossos promotores denunciaram nossas empreiteiras e estas por sua vez denunciaram os políticos corruptos desses países, onde éramos bem recebidos, como somos inteligentes, ora pois, Angola estava cada vez mais “abrasileirada”, agora entregamos Angola aos americanos e chineses, brasileiro lá nem como turista, entramos na casa e sujamos a cozinha.
Os cursos de “compliance” dos mais admirados pelos jovens advogados e executivos dos países colonizados, são uma invenção americana. Fazendo os cursos as mentes desses alunos já ficam formatadas para achar pelo em ovo em negócios e contratos, só servem se estão no figurino americano e dentro dos padrões da justiça e da advocacia pregada pelos americanos, mas que são mais um “faz de conta” que uma realidade, uma espécie de Disneyworld onde se recria um mundo de fantasia , lá tudo é bonito e limpinho, um mundo só do bem com alguns pecadilhos, como a Halliburton pagar US$150 milhões de propina na Nigéria, isso coisa bem recente, de 2011, na cara do “compliance” e do Departamento de Justiça, depois pegaram a corrupção, impuseram multa de US$ 456 milhões, a Halliburton pagou mas a empresa não foi nem tocada, nem chegou a arranhar seu valor de bolsa, a Halliburton seguiu poderosíssima, amparada por um de seus lordes, o ex-Vice Presidente Dick Cheney, é atuante no Brasil, um dos maiores fornecedores da Petrobras, bonitinha mas ordinária.
Se um país cheio de malvados for bonzinho com os EUA não precisa de “compliance”, as “boas causas” somem. O ruim vira bom, o corrupto vira santo, o lixão vira perfumaria.
A EXXON MOBIL, empresa símbolo dos EUA, anteriormente conhecida como Standard Oil Co.of New Jersey, assinou em 2016 um contrato de exploração do pré-sal angolano com a SONANGOL, cuja fama de empresa corrupta é lendária, sua presidente do Conselho, Isabel dos Santos, filha do Presidente vitalício, José Eduardo dos Santos, é a mulher mais rica da África, segundo a revista americana FORBES.
Como a simpática, charmosa e bonita Isabel dos Santos nunca foi empresária por seus próprios esforços e sim herdeira do pai, portanto a corrupção no caso é auto explicável, não precisa de “compliance”. Ora, se nos padrões americanos a corrupção é repulsiva, como o Departamento de Justiça aprovou o contrato da EXXON MOBIL com a SONANGOL, cadê o COMPLIANCE? Os famosos ex-Ministros de Angola são quase todos bilionários, alguns bem conhecidos no Brasil, com apartamentos na Vieira Souto, o dinheiro deles veio da SONANGOL, de onde sumiram em um exercício contábil US$32 bilhões, segundo a imprensa econômica americana. Mas evidentemente a SONANGOL, ao contrário da Petrobras, jamais teve problemas com o Departamento de Justiça.
A ODEBRECHT é corrupta mas e a SONANGOL? Há uma diferença substancial, a Odebrecht concorre com empresas americanas mas a Sonangol COLABORA com uma empresa americana, o que explica tudo não é mesmo? Aos amigos tudo, aos inimigos COMPLIANCE.
O pior da história é que tem gente no Brasil que acha ótima essa interferência do Departamento de Justiça no País. Quando Marin foi preso na Suíça por agentes do FBI, um ato de arrogância único, o governo do Brasil não defendeu Marin, portador de passaporte brasileiro e aqui no Brasil comentaristas esportivos como Juca Kfouri e Flávio Prado elogiaram a ação dos EUA, “agora a coisa é séria” dizia Prado no seu programa Mesa Redonda, Kfouri também ficou exultante, SEM PERCEBER o absurdo e a ilegitimidade de um governo estrangeiro prender um cidadão brasileiro em um terceiro País por delitos que não foram cometidos nos EUA, o fato de Marin ter ficha ruim é problema do Brasil e não dos EUA.
Quer dizer, a jurisdição americana se fazendo valer na Suíça para prender um brasileiro por delitos que não foram cometidos nem nos EUA e nem na Suíça, o FBI agindo como uma “ polícia do Mundo” e brasileiros achando isso normal e até elogiando SEM PERCEBER a aberração do ataque à soberania brasileira sem nenhuma cerimônia, o que demonstra uma completa alienação e desconhecimento do conceito de Estado nacional por parte de muitos brasileiros que não dão valor à nacionalidade e ao valor e prestígio de seu Estado protetor.
Na ÚNICA vez em que o Brasil poderia invocar o Acordo de Cooperação Judiciária de 2001 a seu favor, no caso dos pilotos americanos do Legacy que derrubaram no Brasil um jato da GOL causando 183 mortes, nesse caso o Acordo de Cooperação Judiciária NÃO FUNCIONOU, os EUA não entregaram os pilotos americanos condenados no Brasil e jamais entregarão, aliás o Brasil nem pediu porque já sabe que esse Acordo só funciona A FAVOR DOS INTERESSES AMERICANOS. Para completar o erro em cima do equívoco do Acordo, a autoridade brasileira que devia operar o Acordo, segundo estipulado no próprio Acordo, seria o Ministro da Justiça, titulado como AUTORIDADE CENTRAL no texto do Acordo. Pois no limite do absurdo o Ministério da Justiça ABDICOU desse poder e terceirizou a operação do Acordo na Procuradoria Geral da República, algo NÃO previsto no Acordo. A PGR não tem formalmente a representação diplomática no Acordo porque no Brasil a PGR não é um ente do Poder Executivo, único poder que representa no exterior o Estado brasileiro. Já a PGR é um organismo autônomo e jamais poderia se projetar fora do País, capacidade que é exclusiva e indelegável do Ministério da Justiça. Porque este abdicou desse poder?
Na minha visão por ignorância sobre a importância do Acordo e em segundo lugar por preguiça, vamos deixar esse trabalho para a PGR, que inclusive montou um setor para cuidar desses acordos. Portanto um acordo dessa importância não conta com a supervisão nem do Ministério da Justiça e nem do Ministério das Relações Exteriores. E o Brasil ainda pretende ter uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU, um País que não cuida nem de seu quintal quer patrulhar o mundo, é uma piada de mau gosto.
Mas porque a PGR não deve ser o operador do Acordo no Brasil? Porque o Acordo NÃO é apenas um mecanismo judicial, o Acordo TEM IMPLICAÇÕES POLÍTICAS , é assunto de Estado, não é assunto de uma burocracia jurídica apenas, questões econômicas de grande envergadura transitam SOB esse acordo, não é só uma questão de processos e inquéritos, há interesses que afetam todos os aspectos do Estado, muito além de réus individuais.
Para fins de registro, o Acordo do Cooperação Judiciária Brasil-EUA de 2001 foi assinado pelo do Governo FHC e tem tudo a ver com a ideologia subserviente desse governo, mas o governo do PT nada fez para operar com visão nacional esse acordo, ao contrário, entregou sua gestão à burocracia judiciária, quando o eixo desse acordo no Brasil é o MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Desde sua assinatura, em 2001, NUNCA se viu na imprensa uma única manifestação do MINISTRO DA JUSTIÇA sobre esse acordo que coloca em xeque a SOBERANIA do Estado brasileiro sobre seus cidadãos e suas empresas, NEM UMA PALAVRA, COMENTÁRIO, OBSERVAÇÃO, o Acordo corre solto, as multas ainda sem a Petrobras já atingem BILHÕES DE DÓLARES a serem pagas ao Tesouro dos EUA, como se tudo isso fosse normal e aceitável.

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