domingo, 27 de agosto de 2017

Querem liquidar o país inteiro. E vem muito mais por aí.



                                                                                 *Jose Álvaro de Lima Cardoso.
     No 21.08 o Ministério das Minas e Energia anunciou a privatização da Eletrobrás, a maior empresa de geração de energia da América Latina. No dia 23, por decreto, o governo extinguiu a Renca (Reserva Nacional de Cobre e Associados), localizada nos Estados do Pará e Amapá, e a área agora passa a ser liberada a exploração de minérios pela iniciativa privada. A área compreende quase 4 milhões de hectares e é rica principalmente em ouro, mas possui também tântalo, minério de ferro, níquel e manganês. A Renca foi criada em 1984, no final do regime militar, mantida deste então como posse da União. Na área, que é equivalente ao território da Dinamarca, apesar da existência de vários outros minerais, era explorado apenas cobre (por uma questão de preservação), e através de monopólio do Estado. Com a extinção da Reserva e a liberação da mineração aumentam muito os riscos de conflitos na região, e toda a biodiversidade da área ficará em grave risco.
    O desmonte impressiona pela velocidade e abrangência, mesmo se tratando do governo mais entreguista e corrupto da história. O pacote completo de liquidação do país, divulgado no dia 24, anunciou a privatização da Casa da Moeda, 14 aeroportos, 15 terminais em portos, a Casemg, a Docas do Espírito Santo, a Lotex, a Ceasa-Minas, 11 linhas de transmissão de energia, trechos de rodovias. O pacote prevê a venda de 57 empresas e ativos públicos, além de vários outros blocos de exploração petrolífera. A explicação para a pressa do governo em tomar decisões dessa envergadura de forma atabalhoada, não tem nada de ideológica. Com as medidas o governo golpista pretende fazer caixa para cobrir o maior rombo fiscal da história.
     As medidas aprofundam o ataque ao Estado brasileiro. Estão desarticulando toda a estrutura produtiva que o Brasil construiu ao longo de décadas, desde Getúlio, fundamental para garantir uma base nacional, mesmo que com limitações. Essa estrutura havia sobrevivido ao primeiro desastre neoliberal na década de 1990, comandada por FHC, que representou uma verdadeira nuvem de gafanhotos sobre a economia brasileira. Se a correlação de forças permitir, vão vender também a Petrobrás, como pretendiam nos anos de 1990, empresa, aliás, que já estão desmontando sem alarde, para facilitar o processo de venda.   
     O desmonte que FHC iniciou na década de 1990 no setor elétrico público, que, até então, entregava a energia mais barata do mundo, está sendo aprofundado com as medidas do governo golpista. Segundo os especialistas da área, com a privatização do sistema, o preço da energia deve disparar, com reflexos nos preços de toda a cadeia produtiva. Nesse contexto, o Brasil, que sofre um problema crônico de desindustrialização desde a década de 1990, verá sua indústria perder ainda mais espaço. Ao privatizar e internacionalizar a estrutura produtiva que entrega insumos fundamentais para a produção e o desenvolvimento a preços competitivos, os golpistas inviabilizam a retomada do crescimento. Historicamente no Brasil, quem puxa o investimento no setor privado é o investimento realizado pelas estatais. Além de representar uma queima impressionante de patrimônio público, a privatização da Eletrobrás representa uma renúncia a qualquer objetivo de soberania energética do Brasil, o que mostra a natureza antinacional e subserviente deste governo.
     O desesperador neste processo de desmonte do Estado brasileiro (que estão fazendo em todas as áreas) é que além de canalhice, há um total despreparo na condução das questões. À exemplo do que vem ocorrendo em todas as áreas, não é apenas um problema de corrupção, mas há um completo desconhecimento dos problemas nacionais. Isso fica muito evidente nas manifestações públicas do ministro da Fazenda que, em regra, não sabe do que está falando. No caso da questão energética, este problema é gravíssimo. Não há qualquer medida para resolver os grandes problemas do setor. Como os golpistas não entendem do assunto, estão sendo orientados por tubarões, consultores ligados às empresas privadas no setor, que passam a dar as tintas das políticas, que só interessam ao capital, contra os interesses de mais de 200 milhões de brasileiros.
     Conforme as análises dos especialistas, o setor elétrico no mundo atravessa uma transição importante, que vai exigir muita ação estratégica, em função da disseminação das energias renováveis. Os desafios, que são grandiosos, estão muito além da compreensão dos golpistas do governo, que se limitam a fazer a apologia do setor privado. As empresas privadas dos países dominantes, por sua vez, agradecem a generosa oportunidade de negócios com os ativos públicos brasileiros.
     No mundo todo a energia hidrelétrica é controlada pelo Estado. É o caso da China, Canadá, Brasil e Estados Unidos que, juntos, respondem por 53% da energia hidrelétrica produzida no mundo. Nos Estados Unidos, por exemplo, mesmo a energia hidrelétrica tendo um peso menor do que os de outras fontes, o setor é tratado como estratégico. O maior operador de energia hidrelétrica é o Corpo de Engenheiros do Exército, e o segundo maior produtor é o United States Bureau of Reclamation, uma agência federal subordinada ao Departamento do Interior. O presidente dos EUA, um enlouquecido neoliberal, lançou no mês de maio um plano de privatização da infraestrutura nacional, mas as empresas hidrelétricas ficaram de fora do plano. Uma de suas ideias, inclusive, de privatizar a Administração Energética de Bonneville, agência federal criada em 1937 para vender a energia da usina de Bonneville, operada pelo Exército, sofreu inúmeras críticas. Uma das principais críticas é a de que, se a administração for privatizada, os consumidores ficarão na mão do sistema financeiro e podem esquecer energia barata.
     O governo anunciou que pretende arrecadar com a venda do Sistema Eletrobrás entre R$ 20 e R$ 30 bilhões. Segundo cálculo feito pelo engenheiro e consultor do setor, Carlos Mariz, os 48,6 mil megawatts (MW) de capacidade instalada de geração do Sistema Eletrobrás equivalem a um investimento de cerca de R$ 370 bilhões a preços atuais. Ou seja, estão torrando um patrimônio nacional estratégico, o que irá tornar o Brasil dependente de decisões de multinacionais da área de energia, por menos de 10% de valor dos ativos. O consultor mencionado lembra que com a privatização do sistema elétrico, os rios que alimentam o sistema, irão deixar de atender as populações e serem, na prática, privatizados. O abastecimento humano, portanto, será diretamente afetado, com certeza. A queima desse patrimônio estratégico, possivelmente está na fatura do golpe: nos EUA e Europa existem grandes problemas relativos de falta de água, já que boa parte dos rios são poluídos.
     Um dos objetivos do golpe é alterar toda a natureza do Estado brasileiro, até o ponto de se estabelecerem novas relações sociais de produção que atendam aos interesses do capital internacional em um nível inédito na história do país. As medidas anunciadas recentemente estão dentro dessa lógica que, no limite, transformarão o Brasil numa espécie de colônia do imperialismo. Um dos principais motivadores do golpe, além da cobiça dos países imperialistas por fontes de energia como um todo, foi interromper a viabilização, a partir de várias frentes, da construção da soberania energética brasileira. Para isso são importantes todas as fontes de energia, e que é pré-requisito para o desenvolvimento econômico-social. Por isso a Lava Jato, Cavalo de Tróia do golpe, tratou de rapidamente de prender o Vice-almirante e Engenheiro Othon Luiz Pinheiro da Silva, ainda em 2015, comandante do programa nuclear brasileiro. Com o golpe e o consequente fim da Lei de Partilha, se apropriaram do pré-sal, mataram o programa nuclear brasileiro e, agora, liquidam a soberania da energia hidrelétrica do Brasil. E tem alguns que fazem de conta que tudo está normal.
                                                                                 *Economista.

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