terça-feira, 13 de março de 2018

A resistência será longa e difícil



                                                                                     *José Álvaro de Lima Cardoso.
     A situação conjuntural brasileira é uma das mais complexas da história.  O país sofreu um golpe de que está mudando profundamente a relação do Estado com a sociedade. Em cerca de dois anos destruíram a legislação trabalhista, restringiram a democracia, aumentaram a pobreza e a fome, entregaram o pré-sal e rifaram a soberania nacional. Com o golpe e a aplicação de um ultra liberalismo completamente fora de moda, que nem o Fundo Monetário Internacional (FMI) recomenda mais, é como se o Brasil tivesse sido invadido por uma potência inimiga. O catálogo de maldades dos golpistas está sendo encaminhado de forma muito veloz, justamente para evitar reação da sociedade. E não nada que indique que, se não houver reação forte da sociedade, a destruição não irá continuar. Inclusive porque precisam institucionalizar o golpe em 2018, através das eleições, e completar o programa.
     O neoliberalismo radical que estão implantando surge numa quadra histórica em que os brasileiros um pouco mais velhos já conhecem as políticas neoliberais, em função principalmente dos dois governos Fernando Henrique Cardoso (FHC). Os efeitos de tais políticas sobre a vida das pessoas já são conhecidos por uma parcela expressiva dos brasileiros. Nas década de 1980 e 1990 havia ainda muita gente iludida com tais políticas, falava-se inclusive em “neoliberalismo social”. Hoje, ao contrário, uma parte dos trabalhadores e parte da população em geral, sabem que tais políticas significam arrocho salarial, desemprego em larga escala, e precarização do trabalho. Tem um outro aspecto também importante: o governo FHC havia sido eleito com um programa neoliberal, mais ou menos explicitado durante a campanha. Já o governo atual assumiu através de golpe de Estado e empurra goela abaixo um programa que vem perdendo eleições há décadas no Brasil.
     O golpe, que é comandado pelo imperialismo norte-americano, foi desferido visando amainar para os países dominantes, os efeitos da crise econômica mundial, como é de conhecimento de todo o mundo. A voracidade das multinacionais sobre as riquezas brasileiras (petróleo, água, minerais em geral, terras férteis, estatais estratégicas) não consegue ser disfarçada. Analisemos somente uma medida, a Medida Provisória 795, mais conhecida como MP da Shell, aprovada no final de novembro, que criou um regime especial de importação de bens a serem usados na exploração, desenvolvimento e produção de petróleo, gás natural e outros hidrocarbonetos, com benefícios fiscais para multinacionais petroleiras. Só essa medida irá representar, em 20 anos, perda de receita para o Brasil na casa de R$ 1 trilhão e, já e 2018, uma perda de R$ 16,4 bilhões. Por mais ingênuo que seja, alguém pode acreditar que uma medida desse tipo seja boa para o Brasil e que tenha sido assinada de boa-fé?
     Somente o acordo fechado recentemente pela Petrobras na justiça norte-americana irá pagar US$ 2,95 bilhões pelos supostos prejuízos causados aos especuladores dos EUA com os casos investigados pela Lava Jato. Para termos ideia do vira-latismo que representa esse acordo, o seu valor é quase 7 vezes o montante que a direção da Petrobrás disse que recuperou do dinheiro desviado (R$ 1,4 bilhão). O detalhe é que a Petrobrás, que foi a empresa vitimada pela corrupção de alguns de seus executivos, está pagando indenização bilionária e antecipada aos especuladores norte-americanos. A lista de falcatruas tomaria várias páginas: o banco Itaú, por exemplo, foi perdoado numa dívida de R$ 25 bilhões em 2017 com a receita federal, para o que não há nenhuma justificativa a não ser a colocação do Estado a serviço do capital. Este valor apropriado pelo banco, praticamente equivale ao orçamento do Bolsa Família para este ano, que retira do flagelo da fome quase 50 milhões de brasileiros.
     Um dos vetores das medidas encaminhadas é o enfraquecimento do Estado, em termos econômicos e políticos, de todas as maneiras possíveis: privatizações de setores estratégicos, destruição dos mecanismos de crédito, sucateamento da educação pública, e assim por diante. O que estamos vendo, na realidade, é especialmente o Estado que, com limitações, desempenha funções públicas na área do crédito, da assistência social, da previdência, etc. Ao mesmo tempo o Estado é colocado sem intermediações, e sem nenhum pudor, descaradamente à serviço do capital privado, especialmente o capital financeiro, que coordena o golpe.
     Se nós brasileiros não conseguirmos reagir à altura da gravidade da situação, implantarão todo o seu programa, promovendo a maior expansão da miséria, já assistida no país. O golpe, de impactos muitos perigosos, foi desferido por várias razões, mas essencialmente para atender as dramáticas necessidades do império norte-americano, que vive uma crise sem precedentes. Esse fato conduz a muitas dúvidas e uma certeza: não há saídas fáceis ou de curto prazo, qualquer leitura realista do cenário mostra que a resistência será longa e difícil.
                                                                                                                   *Economista.

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