*José Álvaro de Lima Cardoso
“...em
matéria de petróleo, tudo o que nossa imaginação sugerir é pouco em face do que
pode acontecer”[1]
Nos
últimos meses o Petróleo tem apresentado uma brutal queda em suas cotações internacionais.
Em cerca de pouco mais de um mês o preço do barril de petróleo despencou de US$
100 para menos de US$ 60 dólares. Segundo especialistas, o preço do petróleo
caiu devido a uma decisão unilateral da Arábia Saudita, de aumentar a oferta do
produto. Não há uma explicação categórica e consensual para o maior produtor de
petróleo do mundo ter aumentado a oferta do produto num momento de retração do
crescimento mundial e manter a posição, mesmo com a queda do preço da
commodity. Uma das hipóteses veiculadas é que a decisão da Arábia Saudita tem o
objetivo de inviabilizar a exploração de petróleo em rochas de xisto, que
cresceu muito nos Estados Unidos nos últimos anos, e que tem custo de produção
elevado.
Há
indicações, no entanto, que a derrubada dos preços foi ditada por interesses geopolíticos estadunidenses. A começar pelo fato de
que os países mais impactados pela queda do preço do petróleo são o Irã, Rússia
e Venezuela, três dos maiores inimigos dos EUA. A Rússia, cuja economia tem
grande dependência do Petróleo (gás e óleo equivalem a 75% das exportações do
país) viu sua moeda, o rublo, perder 50% de seu valor desde junho último. A
inflação no país deve alcançar 10% neste ano, em decorrência da elevação dos
preços dos importados. O país criou inclusive, em dezembro último,
um fundo de US$ 3,6 bilhões para enfrentar a crise e aprovou uma nova doutrina
militar, ajustada aos acontecimentos geopolíticos recentes, especialmente a
crise na Ucrânia.
Com a
queda provocada do preço o governo dos EUA pressiona fortemente o governo russo
e também o governo iraniano, cuja economia igualmente atravessa grandes
dificuldades. O Irã é o único país localizado no oriente médio que não é
alinhado com a política internacional dos EUA, além de ter planos de
desenvolver energia nuclear, verdadeiro pecado mortal, do ponto de vista da
hegemonia estadunidense. O movimento do governo dos EUA, se confirmado,
significa também um tiro no pé. Especialistas estimam que, por conta da queda
do preço do petróleo, podem ser perdidos até 40 mil empregos na indústria
de petróleo e gás, mais 6 mil empregos nas empresas que fabricam equipamentos.
A Petrobrás sofre os efeitos desse
processo mundial, por ser uma das grandes petroleiras do mundo e por sua crescente
importância estratégica, em decorrência das descobertas do pré-sal. A queda no
preço do barril levará a empresa a adiar investimentos, melhorar a estrutura de
custos e elevar produtividade. Mas o impacto da queda dos preços sobre a
empresa e o Brasil não se compara com os efeitos sobre Rússia, Irã ou Venezuela.
A dependência do Brasil da produção do petróleo é muito menor do que naqueles
países. Ademais, como o Brasil importa petróleo de tipo leve (dos
quais é mais fácil extrair gasolina e outros derivados considerados nobres), com a
queda do preço, há uma tendência de melhorar o controle da inflação. Além disso
a Petrobrás se beneficia com a queda do preço, também por ser a principal revendedora
de refinados do petróleo no país.
Algumas
análises têm sustentado que a queda do preço do petróleo pode inviabilizar a
exploração do pré-sal, que já responde por quase 30% de todo o óleo
produzido pela Petrobrás (importância que irá aumentar). A questão central é
que o pré-sal possui taxa de produtividade bastante superior à média mundial, operando
com tecnologia de ponta e risco zero em cada poço, sendo economicamente viável
a partir de um barril em torno de U$45/50. Estima-se que daqui a três anos o
pré-sal deverá fornecer 52% do óleo produzido no Brasil. Portanto, independentemente
das oscilações do cenário do petróleo ao nível mundial, cada vez mais a
Petrobrás terá papel estratégico para o Brasil. A Petrobras sozinha é
responsável por mais de 10% de todo o investimento brasileiro neste ano. A
empresa é responsável pelo maior plano de investimento em curso no século XXI,
feito por uma única corporação: algo em torno de U$ 200 bilhões de dólares
serão aplicados pela estatal em exploração e produção, entre 2014 e 2018.
O pré-sal possui outra grande vantagem
que é escala das reservas, simplesmente extraordinária, considerando que possui
45 bilhões de barris em reserva de óleo recuperável (algumas estimativas
mencionam número bem maior, que pode chegar ao dobro). O pré-sal garante 88% de
óleo recuperável sobre o total existente nas reservas, número que é de 75% na
Arábia Saudita, 65% na Rússia e 55% nos EUA.
Os ataques à Petrobrás cumprem vários
objetivos ao mesmo tempo. Provocam uma crise política para desestabilizar o
governo Dilma, depreciam a empresa e, principalmente, o projeto de
desenvolvimento que ela representa. Se de
fato os ataques a empresa, fossem para localizar e punir os corruptos que se
alojam em setores estratégicos da hierarquia da Petrobrás, as críticas viriam
acompanhadas da defesa do pré-sal e do passaporte para o desenvolvimento que
ele representa para o país. O que está em jogo, na verdade, é a prosperidade
representada pelo pré-sal e o modelo de exploração adotado a partir de 2009, o
de partilha. Este modelo, mesmo com limitações, controla melhor a produção do
pré-sal, possibilitando uma apropriação melhor da produção por parte da nação.
Isso desagrada a muitos lá fora e aqui dentro.
*Economista e supervisor
técnico do Dieese em Santa Catarina.
[1]
Getúlio Vargas, quando senador, defendendo o
monopólio estatal do petróleo no Brasil, em 1947. Transcrito do livro “Formação
do Império Americano”, de Luiz Alberto Moniz Bandeira.
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